VOU VIRAR UM EXPROFESSOR

 


Vou deixar a profissão de professor. Resolvi virar humorista. Qualquer um, desses de stand-up, dos que vendem cds nos sinaleiros, ou um daqueles sem graça da Praça é nossa ou Zorra total. Minha primeira piada já tenho, será meu último salário de professor. As outras piadas serão todas falando mal dos professores e das greves que eles fazem, principalmente comparando o magistério com a prostituição. Vou rir muito daquele umbigo feio estufado por uma hérnia, e dizer: "fique aí você não é mais meu".

Talvez eu vire cantor de música sertaneja. Não será de música raiz ou de sertanejo universitário. Serei o primeiro cantor de música sertaneja pós-graduada. Meu primeiro hit já compus, será Eu com meu orientador na balada bebendo cerveja. Falta agora convencê-lo a fazer a segunda voz, usar chapéu de John Wayne e tentar vestir uma calça skinny. Depois é só gravar um DVD no Atlanta Music Hall, e vender nos bares, fazer um vídeo polêmico que vire viral (viram a cacofonia, já estou escrevendo mal, o que faz parte de meu treinamento para letrista de música sertaneja) no Youtube. Depois é só esperar o convite do Gugu ou daquele cara do sbt que não sei o nome. Se não der certo, tenho um plano B, crio o country-metal, é só reforçar meu sertanejo com umas três guitarras distorcidas e usar roupas extravagantes, que serão as mesmas de minha época de sertanejo pós-graduado.

Também pode ser que eu vire pastor evangélico. Já tenho o nome de minha igreja, Presepada nas Alturas, já confeccionei uma teologia baseada nuns três versículos do Antigo Testamento (daqueles em que Deus despeja sua ira sobre os seus próprios eleitos), nuns 10 dos evangelhos (pra incutir algum otimismo mitigado), e tudo aquilo que nas cartas de São Paulo servir pra dar bronca nos fiéis e enchê-los de medo. Ah!, aproveitarei todo o Apocalipse de João. Não cobrarei dízimo!!! Esse será o grande diferencial de minha igreja. Penso em 20%, que se chamará, obviamente, quinto, como faziam os portugueses no período colonial. Faltam somente um pouco de retórica, um sócio sem escrúpulos que entre com o investimento inicial e uma loja comercial com duas portas de metal.


Mas o que mais me atrai é ser Rei da Palestina a 2000 anos atrás. Talvez nessa opção eu continue na educação. Como Herodes serei um rei que sabe tratar de crianças e que nem liga para o que pensam os pais que não sabem educar seus filhos. Como rei, basearei-me, pouco me importando com meus sócios romanos, exclusivamente em minha vontade, e criarei o Instituto Hedodes de Educação. Já tenho dois slogans, ou máximas: "IHE, o melhor em educação desse lado oriental do Império Romano, formamos de carpinteiros a imperadores" ou "Resolmos seus problemas com seus filhos pelas cabeças! E de graça: aulas de latim clássico e vulgar". Já tenho a orientação pegagógica, desenvolvido pela minha colega e ótima educadora, chamada Rainha de Copas, com seu peculiar, mas eficiente, método chamado "encefálico-libertador". Assim por toda a Palestina não se ouvirá mais nenhum choro... e nenhum riso de criança. Depois é só dormir o sono dos justos, ou mandar dar porrada nos professores do meu instituto acaso resolverem fazer greve.

Pode ser também que eu resolva virar governador do Paranã! (...)

Como vêm a triste condição dos professores tem saídas bastante práticas, e abertas para qualquer um. O que lhes falta é espírito de empreendedorismo, diminuir seu rigorismo moral e um pouco de cara de pau. Acabar com essa mania de ser herói. Mas, eu, da minha parte, falo isso tudo, no entanto serei professor até chegar debaixo da terra. Pra isso fui formado com dinheiro público (só estudei em escola pública), e além do mais, é isso que faço com imenso prazer e algum senso de realização. Gosto da sala de aula, onde atualmente dou aulas, não vendo. Pouco me importando com aqueles olhares que pensam "é um derrotado", ou aquelas bocas que me perguntam: "além de ser professor você faz alguma coisa?".