Ruas Sem Giz

Não sei o porquê vejo certas coisas deste mundo estranho a mim.

É como se eu não fosse desse século.

Na verdade, não vejo.

“Elas passam vultuosamente na minha face”.

O movimento dos bondes me deixa pensativo e fora de mim.

Com a vida individual e singular,

os sujeitos se olham indiferentemente.

Há os que ouvem, mas não falam.

Há os que falam, mas não houve.

Deus!

Livre de mim eu ouvir e não ver.

E, pior será se eu ver e não ouvir.

Todos os dias eu escuto:

Gritos engaiolados,

Ruídos baixos,

Gemidos inexprimíveis,

De uma sociedade que corre contra os ponteiros capitalistas.

Sujeitos irracionais,

Reles mortais,

– constrói o amanhã e destrói o hoje.

Trabalhar, comprar,

Comprar, trabalhar!

E assim vai o ciclo que Thomas Malthus pensava que já vivia.

Não sou andarilho.

Muito menos a reencarnação de Flâneur de Baudelaire.

Até mesmo se eu fosse Flâneur, não daria tempo para fazer este poema.

Mas, se já fui criança é porque trago na memória as ruas riscadas de giz

E uma bola de meia, em que todas as tarde de sol brincávamos,

E os nossos pais tinham tempo para ser árbitro.

Ainda existe em mim aquela euforia da fala de Juscelino Kubitschek

(construção de Brasília em cinquenta anos em cinco).

Foram os melhores cinco anos meus da minha infância.

Não porque queria permanecer no atraso.

Mas, porque a praça perto de casa seria destruída,

Minha tia voltaria para São Paulo e meu tio coronel-político moraria na minha rua.

(Joabe Rocha)

Joabe Rocha
Enviado por Joabe Rocha em 01/06/2015
Código do texto: T5262676
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