O homem da terra amarela.
Ele vinha com a garrafa térmica suja de terra. Terra amarela da construção em que trabalhava. Suas botas sujas irritavam a servente da secretaria. O bebedouro situado dentro do Complexo Cultural era alvo fácil para que ele enchesse de água fresca a sua garrafa. Ao colocar a garafa em cima do bebedouro, sujava todo o prato dele de terra. Ao colocar no chão, sujava os arredores do bebedouro de terra. Suas botas enlameadas sujavam todo o recinto por onde passava.
Enquanto enchia a garrafa, filava uns bocados do lanche dos funcionários da secretaria. O café sempre quentinho e bolo fresco comprado por eles. Nunca ajudava em nada só filava. A servente ralhava com ele todos os dias. Chamava-o de sugismundo e filão, e implicava com ele. Tudo era culpa dele. Os rapazes não precisavam convida-lo para ficar e lanchar. Foi assim até que num certo dia ele simplesmente não veio.
Visitei a obra e verifiquei pessoalmente que ele abandonou o trabalho. Não apareceu nem mandou avisar nada. Trabalhava a dia e por isso não se importaram. Contrataram outro pedreiro. Não perguntei nada a penas constatei devido a ausência dele.
Dois meses depois, alguém justificou a sua ausência sem saber de nada:
Ele dormira e não acordara. Havia partido sem se dar conta. Pela descrição era ele mesmo. A secretaria agora não tem mais a sua visita vespertina. O homem moreno partiu e não volta mais. E nós nem sequer ficamos sabendo seu nome. Sem visitas, sem sujeiras, sem filar nada. A terra de suas botas, de sua garrafa, agora jaz sobre ele num campo santo.