O PRESENTE DO IBAD

Gosto de recordar fatos do passado. Hoje vou contar um causo do tempo que estavam arquitetando em todo o país o golpe que ecloderia em 64. Começou a aparecer nas cidades do interior, acho que a partir de 1962, ano em que Arraes se candidatou a governador, núcleos do IBAD - Instituto de Ação Democrática (nome pomposo para designar uma base do golpismo), financiado, claro, pelo imperialismo americano. Esse órgão tinha dinheiro a rôdo. Financiava candidaturas de políticos que rezavam por sua cartilha. Era um organismo que visava à desestabiização da democracia e que queria impedir a implementação das reformas de base e a ascensão do nacionalismo.

Em Arcoverde, porta do sert~~ao pernambucano, estabeleceram uma cabeça de ponte, distribuindo farto material contra Jango, Arraes e o esquerdismo. Distribuiam jornais, panfletos, revistas e com certeza dinheiro com os olíticos venais. A publicação de maior circulação desse órgão fascista era uma revisa que parecia, em mentira e descaramento, com as de hoje, exceto a Carta Capital. Era de papel especial, liso, caro, com fotografias bonitas para enganar os bestas. Alugaram além de uma sede, um pequeno armazém para estocar o material de propaganda a ser distribuído.

Faço um parêntese para lembrar que naquela época papel higiênico era quase luxo, as pessoas usavam para o óbvio ululante (se limpar depois de defecar) o popular papel de jornal, pegava-se jornais velhos se recortava pequenos quadrados e colocava-se num preguinho junto ao sanitário. Lembram-se? Quem disser que não se lembra e viveu aquela epoca e não era endinheirado, é mentiroso. Fecho parêntese.

Pois bem, o vigia do pequeno armazém do IBAD, onde estocavam o material de propaganda, era um malandro meu chapa que jogava sinuca comigo. Foi ganhar o seu dinheirinho, esse cara torcia pela esquerda mas a família era ligada a UDN reacionária, daí que arrumaram esse servicinho para o malandro. Um belo dia, à noitinha, ele apareceu na casa de meu pai e me mostrou uma edição especial da revista do IBAD, pensei que era gozação, porque eu era esquerdista rôxo. Não era gozação, ele mandou que eu pegasse a revista e sentisse a textura das folhas. Apalpei as folhas e me surpreendi, o material usado era muito parecido com papel higiênico de luxo. O malandro riu e disparou: "Chegou milhares dessas revistas, já levei pra casa duas carroças cheias, pensei em lhe oferecer umas carradas, você quer?". Ora, aceitei na hora qe nem caldo de cana. Ele trouxe v´´arias carroças que colocamos num quartinho que havia no quintal daminnha casa. Passamos quase um ano sem usar os papeizinhos recrtados de velhos jornais e nem papel higiênico, só usávamos a edição extra da evista do IBAD, ela continha apenas pichaação contra Arraes.

Não podia deixar de dar o meu testemunho e dizer que estão errados os esquerdistas que picham totalmente o IBAD, a mim e à minha família ele serviu para alguma coisa: a sua edição especial serviu de papel higiênico. Foi um presente que o IBAD nos deu. Juro.

Dartagnan Ferraz
Enviado por Dartagnan Ferraz em 22/05/2015
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