O Pinto Pequeno 
Por Carlos Sena 

 
 
Luquinha foi à feira com sua mãe e se apaixonou por um pinto. Um pinto vermelho no meio de um bando de pintinhos amarelos. São aves recém-nascidas que são pintados na base de anilina (ou sei lá que tipo de tinta). Parece que essa modalidade de vender um monte de pintinhos coloridos num balaio afeta em cheio a vista das criança. E as enlouquecem! Com Luquinha não foi diferente. Chorou, choramingou até que a mãe, finalmente, comprou o pinto vermelho. O vendedor até sugeriu que levasse dois: um amarelo e o outro vermelho. Não. Ele só queria levar o vermelho e assim aconteceu. Em casa, logo arrumou uma caixa de sapatos para o pinto dormir. Colocou junto dela um pires com água e uns farelos de xerém. Mas, o pinto vermelho só piava, só piava. Nada de querer saber de beber água e beliscar o xerém salpicado no chão. Nessa noite quase não se dormiu com o piado do pinto. No dia seguinte, o pobre pinto perambulava pelo quintal da casa querendo um lugar para se aninhar. Mas, onde(?), deveria ter pensado o pobre e solitário pinto. Não se fez de rogado. Viu que naquela casa não tinha nenhum parente seu. Resolveu a questão da seguinte forma: de mansinho foi chegando perto de um gato velho de "marca" angorá. O gato dormia o tempo todo debaixo de um pé de manga num cantinho do quintal. O pinto, já piando menos, cabisbaixo, foi se socando pertinho do gato. Este, sonolento, abriu um olho e fez olhar de soslaio para o coitado do pinto que, aliviado, se esgueirou no gato e começou a cochilar. Quando Luquinha viu a cena logo chamou seus pais para presenciar. Tiraram fotos dos dois e a felicidade parecia não sair do rosto de Luquinha. No dia seguinte o pobre pinto estava ainda meio perdido. Literalmente se escondia debaixo dos pelos volumosos do gato. Eventualmente saia para beliscar um xerezinho e tomar uma água. Mas, logo retornava para o conforto que o calorzinho do gato lhe proporcionava. Toda noite, Luquinha levava o pinto para a caixinha que ficava no seu  quarto junto da sua cama. Mas, tão logo o dia ensaiava clarear, logo o pinto vermelho saia em busca da insólita companhia. 
Uma semana havia se passado. O pinto ainda piava muito, mas em menor intensidade vocal. Certa manhã Luquinha chegou da escola e foi direto ver o pinto lá no quintal. Surpresa! Cadê o meu pinto? Mamãe!  Uma desgraça, meu pinto sumiu e deixou um outro em seu lugar. Veio a mãe, o pai, o irmão e até a empregada veio. Enquanto todos riam, Luquinha chorava. Fato é que o pinto era o mesmo de sempre. O detalhe estava no fato de que a chuva forte molhou o pinto vermelho e sua "tinta" escorreu junto com a água da chuva. O pinto ficara, então, com cara de pinto de verdade, amarelinho!  Mas, Luquinha se desesperou e ninguém lhe convenceu que o vermelho do pinto era apenas uma tinta que a chuva levou consigo. 
Semanas se passaram. Luquinha parecia ter esquecido sua decepção com o pinto vermelho. Na escola, porém, a professora  pediu para os alunos escreverem um conto. O melhor conto envolvendo bichinhos de estimação ganharia um prêmio e ainda sua publicação numa antologia que a escola estava patrocinando. Luquinha não se fez de rogado. Contou a história do pinto vermelho e ganhou o primeiro lugar. 
 
Carlos Sena (meu terceiro conto infantil)