A mulher - texto de Maria Montillarez

Ela queria uma blusa branca. Tinha de ser um branco tão branco que refletisse... Ah, branco só reflete o próprio branco ou nada. É uma cor egoísta. Mas naquele momento, nada importava o sentimento da cor. Importava o sentimento de mulher. Uma mulher quando quer, quer. E ela queria uma blusa alva. Sentia que seu dia não seria perfeito sema a blusa branca.

Abriu o armário. Havia multicores. Camisetas brancas quase amareladas. Nisso havia dois problemas: queria uma blusa, não uma camiseta. Branca, não encardida. Fechou o armário, desapontada. Honestamente, o que uma mulher sente nessas horas vai além de simples desapontamento.

Ela fechou o armário desesperada. Levou as duas mãos à cabeça e andou pelo quarto. Aquilo era parecido com a sensação de quando se distraiu e bateu o carro em um poste. Seu coração se acelerou. Precisava da blusa branca. A boca estava seca. Tomou um gole d’água. Como sairia para trabalhar sem a blusa branca? Tinha aquela calça jeans que ganhara no dia das mães, de um desbotado discreto... Deus! Ficaria perfeita com a blusa branca!

Olhou para o relógio. Já estava atrasada para sair para o trabalho e pensou: “Vestirei qualquer blusa, e à noite passarei no shopping e comprarei uma blusa branca”.

Teve um instante de bom senso e se perguntou se estaria desenvolvendo alguma desses TOC’s da modernidade. Ora, mas se tudo que uma mulher faz compulsivamente for considerado TOC, haja remédio! Sabia que resolveria seu problema apenas com uma blusa branca, e aquilo não acontecia todo dia, era evento esporádico, portando, significava somente a mulher nela atuando.

Pegou uma blusa azul-clara, quase branca, vestiu, se olhou no espelho:

— Horrível! — arrancou a blusa.

Vestiu a camiseta que chamara de encardida.

— Nossa! Tá bege! Que horror! Essa tem de ir pro lixo. O que será que está fazendo no meu armário? — arrancou a camiseta e deslocou o olhar aflito para o armário do seu marido. Abriu-o e gritou, animada:

— Uma camisa branca, várias, meu Deus! — E vestiu a camisa enorme do marido altíssimo, de quase 2 metros, quando ela era manequim 38.

— Isto é uma lástima! Quer saber, não posso trabalhar assim!

Ainda vestida na camisa do marido, telefonou ao chefe, contou uma mentira que explicava que era impossível ir trabalhar pela manhã. Ele não entenderia a verdade.

Foi ao comércio local e andou várias lojas até encontrar a blusa “perfeita”.

Como toda aquela andança a fizera transpirar à beça, precisava tomar uma chuveirada antes de vestir a blusa branca. Após o banho, olhou para a blusa aberta sobre a cama e disse a si mesma:

— Tão braaaca! Maravilhosa! — sorriu e vestiu a blusa. Olhou-se no espelho. Então achou que faltava alguma coisa na indumentária. Abriu a gaveta, pegou um echarpe multicolorido, jogou por sobre a blusa.

— Agora sim, está ótimo!

Maria Montillarez

http://www.mariamontillarez.com.br/