EU PENSO COMIGO...

Tem coisas que nunca vamos conhecer, lugares que nunca iremos andar, pessoas que ficarão longe para sempre, pássaros esquisitos e animais marítimos que viverão como se não existissem para nós, e nós para eles. Será que não há muito mais do que imaginamos no universo? Será que hoje é somente uma data no calendário e não um milagre que deveríamos estar comemorando? Tudo que fizemos ontem além de virar memória, também deixa suas marcas para virar história.

Tem frases que nunca vou escrever, ventos que nunca irei sentir, mares e oceanos que existirão para sempre sem que eu tenha molhado meus pés neles. Uma vida inteira não é suficiente para que a gente sinta o paladar de todas as frutas, ouça todas as músicas. Quantas pessoas poderiam ser nossas amigas e não sabemos nem onde vivem! Quantos livros interessantes repousam em uma estante e nunca serão recomendados!

Quantas cenas não serão gravadas? Parecida com aquela do casal sentado em um banco, em frente ao mar. Ela o está deixando, ele quer impressioná-la com um poema de Walt Whitman que tirou do bolso. Começa a chover, ele não quer ler o poema rápido, quer que cada palavra seja lida com doçura; a chuva borra as palavras que somem e ele improvisa, fingindo que está lendo, enquanto ela observa, carinhosamente, seus dedos manchados pela tinta que escorre do papel. Ela pergunta, ironicamente, quem é o autor do poema e ele, atrapalhado, diz que encontraram o poema junto ao corpo de um jovem que havia morrido de amor.

Tem coisas que aconteceram quando ainda não tínhamos consciência de quem éramos, mas mesmo assim chegam sem cerimônia, como uma brisa pela janela, a fumaça de um cigarro, e permanecem durante todo o tempo. Como seria viver sem nunca ter ouvido What a Wonderful World, na interpretação de Louis Armstrong?

Ricardo Mezavila.