Quando Dostoiévski ficou em segundo plano
Olho para a estante cheia de livros e sinto angústia, sim, angústia, como não sentir? Tantas e tantas obras e eu não li nem metade ainda.
Fico a olhar... Passo os olhos por cada fileira de livros, está uma bagunça, tipo a minha vida, tudo fora do lugar, mas não deixa de ser algo belo aos olhos uma fileira de livros fora do lugar, tudo certinho soa como algo falso, é como uma ilusão de controle e segurança sobre a própria vida, coisas de gente bem resolvida, prefiro assim bagunçado, pra eu lembrar sempre que a vida é um caos.
Enquanto fico a olhar me encanto com a beleza da existência, naquelas imensas prateleiras não há morte, só há eternidade, cada escritor ali permanece vivo em cada página, porém sinto que meu olhar não é neutro, sei que procuro algo ali, mas sorrateiramente me descuido, tá foi um descuido proposital, preciso fingir que não sei, mas enfim, meus olhos encontram Dostoiévski, mas com todo o devido respeito, não é Dostoiévski que procuro, eu procuro ela, sim, ela também leu o livro, então delicadamente manuseio aquele livro e fico a imaginar aqueles lindos olhos que passaram ali, a cada página, tento sentir a leveza do seu toque, sei que seus dedos tocaram àquelas páginas também, e quando encontro suas marcações, é um momento de pausa, de ouvir o silêncio da sua interioridade que certamente ficou ali, é como se eu ouvisse a sua voz... Sinto um leve pulsar de alegria.
Fecho o livro. E fico somente com você.
Desculpa Dostoiévski! Ela tem o poder de direcionar a minha atenção. Juro que voltarei para uma leitura mais respeitosa.