O chapéu de papai
Sei bem que não era um Fedora. Seria um Ramenzoni? Ando com ele na cabeça, sem jamais tê-lo usado. O chapéu de couro de papai. Um juntado ao outro, mais aquela capa cinza, duma casemira grossa, dava algo de cinematográfico. Meio gangster até, mas Hollywood não era assim tão amiúde.
Na verdade, era rara aquela conjunção, de papai, chapéu e capa. Na maior parte do tempo, ficavam o chapéu e a capa confinados ao austero guarda-roupa escuro, que tinha uma seção de papai e outra de mamãe. Um novo e mais alegre guarda-roupa fabricado na oficina do Gil, e que veio a substituir o antigo, só alterou a ordem das coisas ao acrescentar uma seção intermediária que, entre outras coisas comportava até umas gavetas e, naturalmente, conferia um lugar de destaque e dignidade ao chapéu de couro.
Marrom, quase grená, com a pespontos de costura circulares na aba e uma fitinha, do mesmo couro e com fivelinha até, a lhe rodear a copa, era mesmo um chapéu distinto - e que merecia o seu próprio recinto. Na companhia da modesta escova de roupa e alguns artigos de toucador, que por ali davam sopa.
Quando víamos o papai de chapéu - e capa - era em flashes rápidos: ou estava saindo, ou entrando na casa. O Chefão se sentia mais à vontade - e mais poderoso - quando desfeito de seus petrechos hollywoodianos.
Sem muita intempérie para enfrentar no ameno clima brumadense - algum sereno, ou chuvisco - e muito bem guardado, o chapéu - até sumir misteriosamente - ao contrário da capa grossa, parecia sempre novo, e mais novo ainda se comparado às galochas, essas sim, é que tinham que aguentar o batente nas épocas de chuva, naquele lamaçal que se tornavam as ruas, a qualquer diluviozinho que se precipitasse da abóbada celeste.
O Brumado, pra nós, e pro chapéu, era muito mais perto do céu.