Jogos que nada custam.

A minha mãe nunca teve brinquedos, a sua infância aconteceu exatamente durante a Guerra Civíl espanhola nos anos 30, que dizimou um milhão de pessoas, deixando posteriormente um rastro de destruição e muita fome, e depois a II Guerra Mundial ( a Europa estava aos cacos). Mas era uma criança, pois nasceu no ano 31, e desde muito cedo ficara sozinha (seus pais trabalhavam), aprendendo a cozinhar, lavar, passar e a cuidar de uma casa, mas era criança ( repito), por isso aprendeu também a criar o seu próprio mundo, infantil, e a fazer as suas bonecas de pano, que agasalhava na caixa de cartão. A noite os bombardeios os faziam correr aos abrigos , e pela manhã comentavam o que ocorrera na cidade. essa era a vida , difícil, mas para as crianças sempre haviam sonhos e esperanças, pois Deus os provê com o dom da fantasia.

Pois bem, foi ela quem nos ensinou todos aqueles jogos que nada custam, e que todos gostam, como o jogo das cinco pedrinhas, na Espanha chamado de "las chinas", aqui de " As cinco Marias", um jogo que se conhece há mais de vinte séculos, há relatos romanos e gregos da antiguidade. Alguns quiseram fazer com saquinhos de arroz, ou areia, que também ficam legal ,mas eu prefiro as pedrinhas, que quando são jogadas ainda andam um pouco.

O jogo do barbante nas mãos, que seguramos com dois dedos, e passamos de um para o outro, formando figuras; O pátio, o varal, o pátio menor, o espelho, o berço, a aranha, o peixe...e que se conhece em todas as partes.

Nos ensinou também jogos de criatividade, como " Os garabatos" ( Garatujas), onde uma pessoa faz uma garatuja num papel, e o outro precisa desenhar alguma coisa, sem interferir no esboço original, e é muito divertido.

Outro jogo que eu gosto muito, é o de desenhar de olhos fechados, a pessoa te diz o que quer, por exemplo ; " Um elefante ", e com os olhos fechados , sem tirar a ponta do lápis do papel, tentamos desenhar, enquanto os demais vão comentando, o que nos faz rir, e desconcentrar, fazendo com que o rabo vá parar na orelha , e coisas assim, é muita risada garantida. Ensinei meus filhos e sobrinhos, e era diversão garantida, pois eu sou muito brincalhão, e faço a pessoa gargalhar enquanto desenha, produzindo verdadeiras obras de Picasso.

Jogos com bola , ela sabia vários, enquanto cantava coisas engraçadas que aprendeu na infância, e que nos faziam rir bastante, também nos ensinou a recortar , colar e montar, fazer algumas dobraduras, e a desenhar.

Uma vez pegou um pedaço de pano, e começou a enrolar, amarrar, com muita agilidade, enfiar uma parte na outra , e de repente formou uma espécie de boneco,com dois braços e duas pernas, que ela chamou de "conejito" (coelhinho), e começou a acariciá-lo falando baixinho para que não o acordássemos, e quando íamos lhe passar a mão, ele pulava sobre nós, e a minha mãe fazia isso com muita rapidez, parecia que o coelhinho tomava vida, e ríamos muito.

Queria há muito escrever um tema lúdico, que dedico a alguém que me ensinou coisas simples e bonitas, motivou a criatividade, alguém que nasceu em uma época torta, e que do nada ainda teve forças para colorir um pouco o seu mundo pessoal, me lembrando as vezes daquelas cenas do filme do "Spielberg" ( A lista de Schindler), filme em preto e branco , onde apenas a menina estava com um vestido vermelho, é bem isso mesmo, não preciso dizer mais nada, a menininha passou a ser Carmencita.

Aragón Guerrero
Enviado por Aragón Guerrero em 02/05/2015
Reeditado em 04/05/2015
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