Depois do Almoço dá Pra Tocar Neste Assunto
Até hoje recordo-me com saudade imensa de um frango com quiabo que comi em um barraco miserável, em um lugarejo miserável, próximo à então nova cidade chamada Brasília, mas ainda em Minas Gerais. Passados quarenta e dois anos, ainda me recordo de vez em quando do cheirinho maravilhoso e do gosto absurdamente bom daquele almoço inesquecível de meus dezoito anos de idade.
Três anos depois, mais ou menos, passando as férias em um sítio de meu tio, vi, um tanto quanto horrorizado, o meu velho parente tirar de dentro de uma lata alguma coisa que se parecia com um bicho preto quando se aprontava para preparar nosso almoço. Fugi discretamente da cozinha para não ver o que sairia dali, o que seria aquela coisa feia e esquisita depois de pronta.
Quando voltei e servi-me do almoço, tive uma das melhores surpresas de minha vida, gastronomicamente falando: a tal coisa preta era um maravilhoso pedaço de lombo de porco conservado na gordura, em uma velha lata de vinte litros. Pela primeira vez em minha vida comi três pratos cheios de arroz, feijão, farofa, salada e daquela carne divina, da qual até hoje tenho o cheiro e o gosto na memória.
Um dia entrei em um restaurante na pequena cidade de Tiradentes, próxima a São João Del Rey, em Minas Gerais, perguntei pela especialidade da casa, e informaram-me que era o frango ao molho pardo. Perguntei então como era o tal molho pardo, a moça descreveu-me a feitura dele, e isso deixou-me em dúvida. Será que um molho feito com o sangue do próprio bicho poderia ser bom? Resolvi arriscar.
Graças a Deus que arrisquei! Depois disso almocei naquele restaurante, sempre frango ao molho pardo, nas dezenas de vezes que voltei a Tiradentes a trabalho.
Em uma dessas minhas muitas idas à cidade turística e histórica, uma família de gordos, de gente obesa mesmo, parou-me na rua e pediu uma indicação sobre um lugar onde se almoçasse divinamente bem. Indiquei então o restaurante e enfatizei as delícias do frango ao molho pardo. O obeso maior, o chefe da família, de quase dois metros de altura, brincou de ameaçar-me: “Olha só o meu tamanho, amigo. Se esse negócio não prestar...”.
Meia hora ou uma hora depois, enquanto eu “frangoaomolhopardava”, a pesada família chegou ao restaurante e pediu o prato que eu indicara.
Depois da segunda ou terceira garfada, o chefe da família, levantou-se da mesa, ajoelhou-se ao lado dela e gritou pra todo mundo ouvir:
- Puuuuta que o pariiiiiuuuuuuu! É de comer ajoelhadoooo!!!
Todas as muitas dezenas de pessoas presentes riram muito do jeito do sujeito. Que depois vim a saber que era um radialista muito conhecido em São Paulo.
Gosto de cozinhar, e de vez em quando dou minhas cacetadas certas. E até certíssimas. Um dia, sem uma idéia definida do que fazer com um belo e grande frango, resolvi mergulhá-lo em vinho tinto, baratinho, e deixá-lo ali por algumas horas. Depois que ele se tornou vermelhão, totalmente embebido de vinho, tirei-o dali, temperei com bastante cebola, algum alho, orégano, salsinha, um banho ligeiro de azeite do bom, uma farofa caprichada enfiada nele barriga adentro, um pouco de óleo na travessa, um papel alumínio por cima, e tome forno. Um de meus filhos disse que aquele foi o melhor peru que comera em toda sua vida e não quis acreditar que fosse um modesto frango em outra “roupagem”.
Quanto às minhas empadas de camarão, talvez eu fale em outra hora. Talvez um dia desses, depois que tiver feito e consumido umas dez delas pelo menos. Só uma dica: não use banha na massa da empadinha. É a banha que dá aquela gastura no estômago. Troque a gordura por igual quantidade de margarina. Fica uma “massa podre” de primeira. Pode crer.