A PRIMEIRA VEZ QUE VI O MAR

Quando eu era pequeno, meu maior desejo era ver o mar. Na minha mente infantil, o mar era um lugar mágico, no qual as canoas ganhavam asas e pássaros dos bicos enormes desfilavam em busca de alimentos, os enormes peixes que já nascem salgados. E pensei em canoas e não em navios porque sou daqui, de perto do Pantanal, e já tinha visto um velho pescador singrar numa canoa pelas águas do Rio Paraguai, o suor escorrendo pela testa, escapando pelo chapéu e fazendo brilhar os braços fortes presos ao remo, numa daquelas cenas que a gente vê uma única vez e não se esquece jamais. Aquela imagem só fez aumentar o meu desejo de ver o mar. Na ingenuidade de criança, julguei que seria impossível o mar ser tão maior que o Rio Paraguai. Certa vez, na escola, a professora questionou a todos se havia mais terra ou água no planeta. Apressei na resposta, que dei num sorriso de certeza: respondi terra. Quando ela explicou que havia no planeta muito mais água, fiquei impressionadíssimo. Era uma época sem internet e de pouco acesso às informações e eu nem desconfiei que no desenho do mapa, grudado no quadro negro, a terra era azul. O tempo foi passando e o mar prosseguiu sendo objeto de meus desejos. Certo dia, um amigo me falou sobre uma excursão ao Rio de Janeiro e que ele daria um jeito de me colocar na lista dos viajantes. Economizei durante dois meses, juntei o dinheiro suficiente para as passagens e a sobra de algum trocado para a alimentação de uma semana. A viagem foi bastante cansativa. Naqueles tempos, de avião só viajavam os endinheirados, o que, definitivamente, não era o nosso caso. Mas eu era jovem, tinha disposição de sobra e o desejo por aventura jorrando pelos poros, levado pela alegria indescritível da realização de um sonho: finalmente ver o mar. No final daquele dia, apertei os olhos para enxergar melhor, hipnotizado enquanto o coletivo atravessava a ponte que liga o Rio de Janeiro a Niterói, e no mesmo instante que o azul do mar preenchia meus olhos perplexos, me deixei cair no espaldar da poltrona do ônibus, indiferente à algazarra dos amigos, num transe completo, como se agora eu fosse aquele velho pescador numa pequena canoa. O azul do mar pairando nas minhas retinas, invadindo meu rosto, e o cheiro de maresia que fez meu nariz estranhar aquele gosto novo, eu, pobre de mim, que jamais suspeitei que existisse algo tão belo. Ao colocar meus pés nas areias quentes da praia, percebi que era realidade, o momento em que tudo se consumava, o sonho de menino ganhando forma, enquanto eu avançava rumo ao desconhecido oceano, aos poucos molhando meu corpo, o mergulho sem jeito, as conchas que ficaram grudadas entre os dedos das minhas mãos, tudo tão novo e perfeito que se torna difícil descrever como consegui apagar todos os outros sons do mundo, pra ouvir apenas o barulho da onda quebrando na praia e observar o vôo misterioso das gaivotas acima da minha cabeça.