Apaixonada por Tiradentes


Por volta dos 9 anos ganhei minha primeira medalha na escola: 1ª colocada no concurso de redação que tinha por tema nada mais, nada menos “Tiradentes, o Herói da Inconfidência”. Posso dizer, sem sombra de dúvida, que nenhuma História nesse nosso País me impressionou mais que a do Mártir da Inconfidência. Desde cedo, me interessei pelos fatos que cercavam de mistério (e muito debate) a Conjuração Mineira, movimento emancipacionista que marcou época no Brasil.

Não sei se foi pelo jeito que me ensinaram na escola—havia toda uma magia, uma beleza em torno de Joaquim José da Silva Xavier—mas, o certo é que ele se tornou para mim a figura morta mais viva de herói que alguém possa idealizar. Li, leio tudo que posso sobre a Conjuração Mineira, no puro desejo de tentar entender o que se passava nas cabeças dos conjurados que, às escondidas, se reuniam para conspirar a favor da liberdade e contra a Coroa opressora.

Nas aulas da escola sempre havia um pouco de cada um dos “conspiradores” e eu mergulhava naqueles detalhes. Foi nesta época que aprendi a amar "À Dona Bárbara Heliodora", belíssimo poema de saudade e dor, escrito por Alvarenga Peixoto — cumprindo pena de degredo perpétuo por participar do movimento — em que o poeta lamenta a distância da mulher amada.

Nas minhas buscas sobre Tiradentes descobri o livro “Joaquina, Filha do Tiradentes”, de Maria José de Queiroz. Naquelas páginas pude saber muitas coisas sobre a vida paralela do alferes nascido na Fazenda do Pombal, de quem a História pouco diria sobre o lado humano: seus amores, suas ligações, seus pensamentos, sua vida comum e pessoal, dados que mexeram ainda mais com minha imaginação.

Meu grande desejo era ir a Ouro Preto, antiga Vila Rica, sentir de pertinho o clima deste pedaço da nossa História. Estive no Museu da Inconfidência, e aquela foi uma das maiores emoções que já senti: ver a letra dele, as imagens, as lembranças, as curiosidades, os objetos, a carta de sentença de sua condenação, uma parte do madeiro que compôs sua forca. Caminhei pela praça que traz seu nome, entrei na Casa dos Contos onde, segundo a História, morreu o poeta Cláudio Manoel da Costa, tido como suicida, mas supostamente assassinado sob ordens do Governador. Senti e respirei os ares do lugar onde tudo aconteceu. Absorvi a cada passo, a cada olhar, um tantinho de Tiradentes e das memórias daquela época, vivi uma das experiências mais inesquecíveis.

Tiradentes foi preso, condenado, e enforcado em 1792. Ficou a Bandeira oficial de Minas Gerais, inspirada nos ideais de liberdade, trazendo como lema, o dístico “Libertas Que Será Tamen”,  simbolizando em vermelho o pensamento revolucionário abortado pela coroa. A História mostra versões variadas destes acontecimentos e muitas já desmancharam a visão heróica de Tiradentes.  Mas, aí, já é outra História...

As brumas cobrem o tempo, novos rumos são dados a esse período conturbado da História do Brasil, mas minha imaginação, não tem jeito, mantém incólume essa figura que fez parte da minha infância, de um jeito incomum. E sinto decepcionar a História que queira mostrar o contrário: plantaram Tiradentes em mim, como um herói. E não  vai ter jeito de desmanchar essa imagem que guardo dele.

Enquanto isso, metade do Brasil aproveita o feriadão sem sequer suspeitar do que houve nos idos de 1700.