VAMPIROS MODERNOS

Desde o alto da Benjamin Constant com a Pinheiro Machado, imagino uma cena como a do romance de Bram Stoker. As criaturas da noite deixam seus tugúrios, refúgios da luz, para assumir suas identidades malignas, camuflados pelas sombras da noite. Como se pressentisse a sua proximidade, viro e reviro-me sobre a cama. Não há paz no meu sono. Mas aquela incômoda sensação que nos toma, quando estamos naquele estado entre a vigília e o adormecimento.

A reunião dos notívagos começa, como era comum nas ruas antigas de Londres, ao bater da zero hora. Modernamente, porém, eles não caminham silenciosos pelos becos, agitando seus longos casacos ao sabor do vento noturno, mas usam seus carros para sinalizar triunfalmente a chegada. Roncam freios e motores, ensurdece a sua música. Logo, o tilintar das garrafas, o odor dos cigarros, as gargalhadas. Depois da sede saciada, os cacos pelas ruas, as sinaleiras quebradas, o choro e os gritos das fêmeas morcegas, já embebidas no sangue de seus parceiros brigões.

Em sobressalto acordo. Vejo pela janela uma fresta de luz. Amanheceu. Uma transformada criatura, remanescente da noite, ainda rasteja pela rua, escondendo seus olhos bêbados de luz. Ele ainda grita, quem sabe, a procura dos seus. Eles já sumiram, Foram com a noite guardar repouso em incertos paradeiros. Em seus ninhos, em suas tocas escuras. E eu, que mais uma vez não pude dormir, constato a certeza do novo dia que tenho pela frente e a completa ausência de charme e romantismo desses vampiros modernos.