PRETO E BRANQUELO
São amigos desde crianças. Nunca tiveram uma divergência maior. Sempre que se encontram se cumprimentam assim: "Fala Preto Safado!". "Diz, Branquelo de Merda!". Detalhe o apelido de um é Preto, do outro Branquelo. Nunca se chamaram pelos seus verdadeiros nomes.
São quase setentões, no papo deles não pinta nadinha do politicamente correto, política, papao cabeça, mas só piadas, futebol e reminiscência da Miraí deles, no sertão pernambucano. Sempre se encontram no Mercado da Encruzilhada, no Recife, onde matam as saudades tomando umas lapadas de Pitu e lavando a prensa com cerveja, sem esquecer de bicar o famoso sarapatel.
Mas estamos numa época que está na moda a obsessão retórica do politicamente correto, há patrulhas tratando do assunto, virou paranóia. Pois bem, dia desses os dois amigos se encontraram, sem programação, numa fila de uma loteria, foi aquela alegria: "Fala, Preto Safado!". "Diz, Branquelo de Merda!". Na fila havia uma senhora dessas chatérrimas e sem dúvida malamada, toda emperdigada, feíssima. Ela interpelou o Branquelo aos berros: "Você está infringindo a lei que proibe a discriminação racial e o deboche contra os negros. Devia ser preso imediatamente!". O Branquelo ficou espantado, e perguntou o porquê. Ela esclareceu citando até os itens e versículos da lei. Então o Preto riu e esclareceu: "Minha senhora, não se pereocupe não, eu tenho esse apelido desde criança, e esse cara aqui - apontando o Branquelo - é mesmo que meu irmão, se ele me chamssse pelo meu nome eu era capaz de não atender, todo mundo só me cama de Preto, ele acrescenta safado de brincadeira, e eu adoro". A megera baixou a pancada, mas ainda falou que isso era um absurdo e coisa e tal. Quando sairam o Branquelo tripudiou: "Vamos tomar umas lapadas, Afrodescendente Safado?!". E o Preto respondeu rindo demais: "Vamos Viking de Merda!".
Está ficando chato esse patrulhamento. Chato demais.