FEIJÃO DO CÉU

Dia desses, ouvindo as mentiras de um novo-rico chato, divaguei e lembrei de um tio torto (tio em segundo grau) que eu gostava demais. Seeu apelido era Coronha, porque usava as calças meia-coronha, deixando às mostra parte do tornonozê-lo. Era um excelente torneiro-mecânico, pacífico, fraterno e muito engraçado. Só tinha dois pecadilhos: gostar de uma cachacinha e contar mentiras cabeludas. Mentia por diversão, soltava a cabeluda e ia mangar de quem acreditou.

Vou contar apenas uma cabeluda do meu tio. Uma noite chuvosa, os habituês do bar, cujo proprietário era o famoso Seiu Noé, um velho gozador, estavam contando, alguns mentindo mais do que cachorro de fateira, sobre as grandes chuvas que presenciaram. Um falou numa chuva de gelo que tinha acabado com quase todos os telhados das casas deuma certa cidade; outro, mais modesto, contou que presenciara uma chuva que durara 30 dias e 30 noites; um terceiro mais avançado contou que vira uma chuva que parecia mais uma tromba d'água do mesmo volume de água do São Francisco. Foi aí que Seu Noé, querendo liquidar o assunto, pediu que Coronha contasse qual tinha sido a maior chuva que presenciara. Ele calmo e sério atendeu ao pedido: ""A maior chuva que vi foi uma de feijão que deu em Floresta dos Navios. A gente passou anos sem comprar feijão". Mudaram de assunto. O meu tio era imatível. Um campeão.

Dartagnan Ferraz
Enviado por Dartagnan Ferraz em 19/04/2015
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