O Raio de Luz

O Raio de Luz.

Hoje algo inusitado aconteceu-me. O dia tinha começado com aquela sensação de que tudo seria cinzento e frio. Parei próximo à porta e quando levei a mão à maçaneta para abri-la, algo me ocorreu. Se ao invés de sair eu voltasse alguns passos e me sentasse na cadeira de balanço, eu poderia ficar embaixo do cobertor por mais algumas horas. Poderia até terminar a leitura do livro que eu fazia há mais de dois meses. Poderia ligar a televisão e assistir algumas reportagens, contudo tenho certeza que não me acrescentariam nada. Eu poderia também acender a lareira e me aconchegar nas almofadas ou até poderia dedilhar algumas músicas no teclado do piano. Como também eu poderia voltar para a cama e dormir mais um pouco. Mas, o que eu estaria perdendo se eu desse ouvidos a minha fértil imaginação!

Ao colocar o pé para fora do degrau pude sentir uma estranha sensação invadindo meu ser. Por entre as nuvens carregadas visualizei uma fresta em que se podia ver um pequenino raio do sol. Foi como o canto de um pintassilgo chegando até meus ouvidos, depois do ribombar dos canhões. Com a sensação de alegria invadindo meu peito, eu pude visualizar através de minha alma, algo divino. A luz na escuridão! Ainda que apenas um raio dela pronunciava-se, era o toque sagrado da vida. Era a essência da existência humana fazendo-se presente por entre as diversidades do mundo do homo-sapien. Talvez, as pessoas apressadas com seus afazeres, não notassem tão profunda magnitude da Divindade Suprema, da construção do universo. Mas naquele momento, eu uma simples mortal pude sentir o toque especial de algo inexplicável. O dom de sentir Deus falando comigo através do universo. Foi um diálogo mútuo, compreendido, tocado, como o veludo em nossa pele. Foi o levantar de cada pelo latente do corpo, causando-me vibração e impotência de me controlar. Foi o toque especial tirando de mim a solidão, o medo. Deixando-me a certeza que apesar de minha pequenez, sou valiosa perante os olhos dessa Trindade que domina o universo.

Nós seres humanos, somos criados e capacitados para elevarmos nossos olhos para a imensidão e tirarmos dela inspiração para nossa vida diária. Isto se nós soubermos contemplar com a alma e ouvir com os ouvidos do espírito. Talvez o calar fale mais profundo do que mil palavras, quando ditas afoitamente. E o silêncio fale mais alto do que uma trombeta na madrugada, na boca de um solitário. Até o sussurrar da brisa nos trás ensinamentos passíveis de transformar lacunas e encontrar a cura para a dor humana. É através da meditação que somos capazes de fechar ferida, abrir as portas da alma, desarraigar as raízes do medo e encontrar a paz necessária para o espírito. Através da meditação podemos chegar ao âmago do discernimento onde encontramos a sabedoria para solucionar as questões que nos afligem. È através da meditação que chegamos a um encontro de nós mesmos, onde descobrimos nosso relacionamento com Deus. É através da meditação que crescemos e nos agigantamos cada dia mais.

Minha alma nesse exato momento criou asas e voou além da terra e perscrutou na imensidão do universo o pulsar latente dos astros e estrelas. Tudo se fez presente nesse momento e eu pude enxergar através da janela de minha alma a magnitude do firmamento criado para nosso deleite. Milhões de pontos luminosos inundavam o firmamento. Davam-me certeza de que eu fazia parte desse conglomerado de gigantes da natureza. Estavam lá, pelos séculos dos séculos, mas, eu em minha medíocre existência não tinha a capacidade de vê-los. Estava preocupada demais com as pequeninas coisas que preenchiam minha vida. Olhava demais para baixo sem ter a capacidade de levantar a cabeça para enxergar acima da dimensão que me cercava. Preocupava-me muito onde poderia colocar meus pés ou onde deveria evitar tal contato. Ao invés de me aprumar eu andava encurvada, pela necessidade de ver o chão que pisava. Por isso nunca me atrevi a me aventurar além do meu campo de visão. Tudo era mais seguro, mais tranqüilo, mais cômodo, mais conhecido. Eu senti que nesse momento eu poderia abrir mão de tudo que eu tinha, do que eu era para ser apenas mais um raio de luz no espaço. Para iluminar as noites escuras de algum coração partido ou ainda, aquecer quem sabe a alma de alguém implorando por perdão. Talvez servir de guia para um marinheiro perdido em alto e imenso mar, ou somente para brincar nas ondas colocando o brilho sagrado da vida, a luz.

Pensei nos milhares de seres humanos que andam cabisbaixos perdendo a essência da vida. Muitos não a buscam com medo do fracasso. Outros, porque nunca tiveram a oportunidade, se quer, de sonhar que ela exista. Os demais se deixam levar pelo individualismo, esquecendo-se que o ser humano nasceu para viver em comunidade. Quando levados pelo individualismo, passam a pensar estritamente em si próprio, tornando-se recalcados, frustrados e hipócritas. Ao invés de expandir-se, voltam-se para dentro de si mesmos construindo seu caráter no egocentrismo. Tornam-se meras ostras envoltas em suas conchas, vivendo no silêncio de seu próprio mundo. Longe da dor alheia, do repartir, do dar, do compartilhar. Tudo o que importa é o seu bem estar, sua ascensão, não contando se para isso têm que pisar na cabeça de seu próximo para galgar mais um degrau. Avolumam-se, achando que só eles são visíveis e tomam todo o espaço sufocando os que deles se acercam.

Mas se o ser humano tivesse a capacidade de olhar de dentro de si para fora, perceberia que poderia ampliar seus horizontes. Teria um campo maior de atuação que o levaria a novas descobertas. Seu horizonte se expandiria de tal forma que ele teria que erguer a cabaça e com isso alcançaria nova dimensão. E ao levantar a cabeça ele notaria quão pequeno é perante a grandiosidade do universo. Perceberia que não passa de um micro ponto perdido no imenso emaranhado de astros e estrelas. Mas mesmo assim, tudo está ao seu dispor, desde que entenda a diferença entre criatura e Criador. Quando perceber esta divergência ele passa a ser, não mais criatura, mas obra prima do Criador. Porque Ele se preocupa conosco aponto de abrir mão de Seus desejos para o nosso bem estar. Porque tudo que temos ao nosso redor nada mais é do que a obra das mãos de um único ser, a Trindade Divina. Deus, nosso Pai.

mendo
Enviado por mendo em 26/02/2005
Código do texto: T5212