MEUS CINCO SEGUNDOS DE FAMA
MEUS CINCO SEGUNDOS DE FAMA
Tudo começou com um convite enviado por uma amiga virtual, pelo facebook, que dizia assim:
Um café. Ou vários. Livros. Amigos. Esta é a proposta do nosso Café&Poesia. Esperamos vocês.
Data: 11/04/2015
Hora: A partir das 10h
Local Delícia Café
Rua Idalino de Oliveira, 157
No sábado pela manhã, dia do referido convite para o encontro mensal dos poetas e escritores da nossa cidade, fiz contato com dois amigos escritores, Mário Gerson, o Tom Cruiser no sertão nordestino, escritor premiado, roqueiro de plantão e meu padrinho literário e Zilma- colega de trabalho e poetisa de mão cheia. Marquei com Zilma de apanhá-la em sua residência às 09h50min para irmos juntas. Mário Gerson ficou de dar uma passadinha rápida por lá, pois estava um pouco adoentado e sentia-se indisposto. Pensei em seguir o conselho do meu marido, que tem mania de dizer que quando vamos à primeira vez a um lugar, o melhor é colocar uma pedrinha de sal lá naquele canto... Isso, nele mesmo, para dar sorte e nada sair errado. Como não tenho nenhuma gotinha de superstição, achei tolice e não levei a sério a mandinga.
Saí meia hora antes do horário marcado. Busquei minha filha no colégio, para acompanhar-me no evento. Fomos primeiro ao centro da cidade, comprar um presente para minha amiga virtual Ângela Rodrigues Gurgel, a lady das poetisas, como é carinhosamente chamada pelos colegas das letras. Achei de bom tom, ao apresentar-me pessoalmente, presentear-lhe com uma caixa de bombons finos. Afinal, quem não gosta de um mimo, não é mesmo?
Em seguida, dirigi-me a casa de Zilma para buscá-la. Com Zilma, como a terceira passageira do veículo, seguimos rumo ao tão esperado encontro. Ao chegarmos lá, no Delícia Café, Ângela veio ao nosso encontro receber-nos, como fazem os verdadeiros anfitriões. Cumprimentamo-nos e nos apresentamos. Entre abraços e frases delicadas, entreguei-lhe meu mimo como simbologia da minha satisfação em conhecê-la pessoalmente. O ambiente já estava recheado de gente bacana, cheio de escritores de alto nível, só a nata – e eu lá de metida. Logo vi Clauder Arcanjo, Padre Guimarães, Dulce Cavalcante, Francisco Rodrigues e mais um bocado de gente que até então eu não conhecia. Cumprimentamos os presentes e nos acomodamos próximos ao demais.
Logo começaram a declamações. Cada um levantava-se entre prosas e graças, para ler e recitar poesias, crônicas, pensamentos... Tudo nos estimulava e nos deleitava ao passo que mudavam as vozes e apreciávamos cada palavra proferida, cada eloqüente recitador. Aos poucos foi chegando mais gente bacana, como o Jornalista, historiador, poeta e descobridor de escritores, Raimundo Antônio (o maior culpado por eu acreditar que dou pro gasto nas letras). Mário Gerson, meu padrinho roqueiro, chegou logo em seguida, presenteou-me com um livro - olhem aí a lei do retorno, faça um mimo que receberás um mimo, o detalhe foi que conseguimos segurá-lo, mesmo adoentado, até o final do encontro. Mais um pouco e eu tive a honra de conhecer Fátima Feitosa, como ela mesma se intitula a desvairava de nascença. O time estava completo. Entre apresentações e declamações, eis que surge o inusitado, um carro de som, com o som às alturas, diga-se de passagem, parou na porta do Delícia Café – é mole ou que mais? Divulgando a festa dos alunos concluintes de um colégio da cidade. Juro como tentamos vencer o importuno Rei da cacimbinha, fazendo de conta que tínhamos mais decibéis na voz que os super tweeter e cornetas, instalados no som ambulante, que insistia no zumbindo e ensurdecedor refrão:
E a muriçoca çoca çoca çoca çoca çoca çoca
E a muriçoca pica pica pica pica pica pica
E a muriçoca çoca çoca çoca çoca çoca çoca
E a muriçoca pica pica pica pica pica pica
Só o Rei da cacimbinha para conseguir fazer uma música tão caçamba. A música picava o juízo, coçava os nervos. Os nobres colegas, com muita elegância, em alguns instantes pausavam o recitar dos belos poemas, na esperança de que o som diminuísse e pudessem dar continuidade a nossa manhã literária. Só mesmo a graça e beleza de um pombo camarada, que pousou faceiro na janela, próximo às nossas mesas, fazendo pose para as fotos, para nos aliviar daquela tormenta. Por instantes, o pombo foi a estrela da manhã, fazendo caras e bocas a cada flash. Parecia que os acontecimentos estavam programados para acontecerem alternados, hora bons, hora inconvenientes. Pois bem, prossigamos. Ao pedirmos a conta veio o último inconveniente da manhã... Por ruídos na comunicação entre o estabelecimento comercial e a turma do barulho, a conta veio meio atrapalhada... Calma, nada que o nosso Tom Cruiser nordestino não pudesse resolver. E como tudo estava alternado, o crédito que sobrou, ao liquidarmos as despesas dos cafés e águas consumidos por nós, ficou num fundo de reserva para o próximo encontro. Isso quer dizer que todos que ali se fizeram presentes, supostamente estarão no próximo encontro. Como diz o ditado: não há um mal que não traga um bem!
Depois dos registros, do inusitado encontro literário, entre selfies e fotos, chegou a hora de nos despedirmos, com promessas de um novo encontro, nem tanto inusitado, espero eu. Seguirmos rumo as nossas vidas. Deixei meus passageiros em seus destinos e segui para casa, com a minha filha, onde minha sogra me esperava para irmos ao Supermercado Atacadão.
Estava eu lá no Atacadão, entre uma seção e outra, nos corredores, quando vejo uma jovem mulher me olhando, com um leve sorriso no rosto. Não a reconheci. O que é normal para mim, que não decoro nem rosto nem nome de pessoas. Como trabalho com atendimento ao público, em uma repartição pública, pensei que talvez fosse alguma professora que eu tivesse atendido, para saber sobre aposentadoria, licença prêmio ou salário família. Abri um sorriso, pois não queria parecer mal educada. Teria que disfarçar caso eu realmente a conhecesse. Ao aproximar-me, ela cuidou em puxar assunto, disse que acabara de me ver no facebook, numa postagem em que dizia: Encontro agradável com colegas poetas, na página da minha amiga de trabalho, e acompanhante no encontro dos feras da literatura, Zilma. Fiquei toda dormente. Nem havia se passado duas horas do acontecimento e eu já estava sendo reconhecida no meio da rua! Eu agora era famosa. Pensei com meus botões, vou vender absurdo de livros. Precisaria aumentar a tiragem do livro (que ainda nem saiu da revisão), pois não iria dar para quem quisesse. Pensei nas noites de autógrafos, nas entrevistas e nos convites para palestras. Pensei em trocar o carro e reservar passagens para a Europa. Eu agora era uma celebridade. Pensei em tirar a caneta da bolsa, caso ela me pedisse um autógrafo... Foi quando ela completou a frase, interrompendo minhas divagações, dizendo que tinha me reconhecido pela roupa que eu usava. Apontou para minha blusa e assessórios. Acreditem, vi brilho em seus olhos ao ver minha roupa pessoalmente. Acho que meu sorriso amarelo revelou minha decepção, pois logo ela saiu de cena, entrando numa das seções próximas do corredor em que eu fiquei feito um dois de paus.
Bom, se eu contar que quando cheguei a minha residência faltou energia, fui dormir com calor e com as muriçocas, lembrando da muriçoca çoca çoca çoca çoca çoca çoca... E a muriçoca pica pica pica pica pica pica e sentindo na pele, literalmente, os efeitos da música que insistiu em bagunçar o coreto, o dia todo, vocês vão achar que isso é papo de escritor metido querendo vender livro.
Nada disso. Sou uma pessoa naturalmente positiva... Entre picadas e coçadas, decidi: Se meu livro não vingar, quem sabe eu possa enveredar pela profissão de personal style?! Meninas e meninos agendem horário. Assinem contratos. Chegou a mais chique e descolada Personal Style do pedaço... Eu minha mania de devanear.
Pensando bem, da próxima vez, vou seguir o conselho do meu marido e fazer uso do sal. Vai que dá certo, não é?
Flávia Arruda 12.04.15