TROCANDO FRALDA DE BANDIDO

A impressão que tenho é de que estamos, pouco a pouco, desistindo dos jovens e eles de seus sonhos. Na década de 1970 cantávamos: “liberdade é uma calça velha, azul e desbotada”. Com a massificação consumista e a nova ordem de comportamento ditada pela tecnologia, sonhar passou a ser meramente uma conseqüência de quem está dormindo, é uma manifestação instintiva que nos faz reviver lembranças de fatos ocorridos no dia a dia.

Essa nova ordem tecnológica da exposição pela exposição, fez o governador Pezão passar por uma saia justa quando participava, ao vivo, de um programa jornalístico. Ele falava sobre o aumento do efetivo da polícia militar na reocupação do Complexo do Alemão. A apresentadora colocou na tela um vídeo de um policial militar, gravado pelo próprio, acariciando uma metralhadora e dizendo que “neném vai cantar para bandido mimi”. Agora temos que conviver com as balas perdidas e com servidor público querendo trocar as fraldas e amamentar bandido. É essa a polícia que vai ocupar o Alemão?

Reduzir a maioridade penal, escolas em tempo integral, garantir acesso à habitação, aumentar o efetivo de policiais nas ruas, fortalecer as ações de reintegração de adolescente autor de ato infracional, são algumas das estratégias que o poder público e a sociedade têm como alternativas para reduzir a violência cometida por jovens menores de dezoito anos. Na prática o que assistimos é o sempre do mesmo, muita vontade e pouca ação.

Ao mesmo tempo em que parte da sociedade apoia a redução da maioridade penal como meio de punição, o poder público, desastrosamente, através da ausência de políticas sociais efetivas e do despreparo de policiais em simples abordagens, vai ceifando adolescentes do convívio de suas famílias. O pai do menino Eduardo de Jesus, assassinado barbaramente enquanto jogava em um celular na porta de sua casa, no Complexo do Alemão, disse que não enterraria seu filho no Rio, o enterro aconteceu em sua cidade, no Piauí. O Rio está deixando de ser digno até para os mortos.

Como sabemos o regime de exceção não era favorável ao sonho de liberdade, mas em reação ao autoritarismo, os jovens eram motivados a construir um mundo possível, sem utopias inatingíveis, mas dentro de uma realidade vertical e consequente, que os conduzisse de um lado ao outro do rio dentro de um barco mais ou menos seguro.

Caetano Veloso quando interrompeu, sob vaias, a música “É proibido proibir”, no festival no Teatro da Universidade Católica de São Paulo, em 1968, perguntou em seu famoso discurso: “Mas é isso que é a juventude que diz que quer tomar o poder?”. Então, na ausência de uma “tarde gris” poética e romântica no Rio de Janeiro, os exterminadores passeiam a tarde inteira “entre os girassóis”.

Ricardo Mezavila.

Ricardo Mezavila
Enviado por Ricardo Mezavila em 07/04/2015
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