Cardápio humano.

Sim, não, não. Sim, alguém também gostou do seu perfil. Você está a 5 km de alguém que muito provavelmente não tem nada a ver com você. Rola uma conversa, nada muito profundo, dentro de você uma pequena expectativa de encontrar alguém que te interesse e te desperte algumas vontades, assim como era antigamente quando você conhecia alguém na escola, faculdade ou nos lugares que costumava frequentar. As coisas mudaram, querido. O mundo evoluiu e quem ficou para trás foi você com todo esse sentimentalismo barato e démodé. Fica difícil ganhar a preferência quando a exposição de tipos atraentes e cada vez mais disponíveis para uma relação ultra rápida de apenas um encontro de duas horas são o que mais existem hoje em dia. Quem quer comer sushi no almoço e no jantar se a próxima opção é uma massa deliciosa no restaurante italiano que você acaba de desejar agora? O mundo imediato te traz essa opção. Nada de se apegar, nada de se apaixonar. Agora virou coisa de gente doente demonstrar interesse por alguém que você acabou de conhecer. Isso é proibido na etiqueta das relações atuais. Coisa de gente doida. Intensidade virou maluquice. Interesse provoca desinteresse. Demonstrar que tá afim anula o jogo da conquista. Porque nesse mundo virtual e imediato o que pode ser imediato é o sexo e não o interesse em encontrar amanhã. Falar de amanhã também é coisa de gente doida. Também assusta. Você só pode estar carente em demonstrar esse interesse pra alguém que você nem conhece. Mas sexo pode. Não precisa conhecer para dividir esse momento com outra pessoa. Os tempos modernos são, na verdade, das satisfações imediatas de um corpo que respeita os seus desejos fisiológicos mais primitivos, mas que, estranhamente, traz consigo a constatação de que seres humanos evoluem com uma tendência a não suportar estabelecer relações. Dá mais prazer escolher o cardápio com um dedo passando no touch screen do que descobrir o que existe por trás de uma foto de perfil ou o que existe por trás da pessoa interessante sentada na outra mesa no bar que você deixou de ir porque também já está se tornando uma dessas pessoas com dificuldade de se relacionar ao vivo. Crueldade da modernidade, criar tantos mecanismos de encontros, onde produzimos mais desencontros do que qualquer outra coisa. Onde o sabor do ao vivo não corresponde ao seu imaginário criativo. Se por um lado a falta de tempo te faz se relacionar por um aplicativo rápido que depende apenas de uma conexão boa com a internet e que te mantém ligado ao que há de mais moderno, por outro todo esse novo aparato tecnológico te torna cada vez mais refém de um novo modo de se relacionar: você será apenas o cara/a mina da quarta-feira que foi comer um temaki, que provavelmente não rolou e que a próxima escolha parece ser um pouco mais interessante na foto do que você foi ao vivo. É que estamos esquecendo que o sabor das coisas está ligado ao modo como elas são preparadas. E as nossas relações hoje não têm passado por preparo nenhum: elas passam a ser, do nada, sem antes sequer ter existido. É o preço que temos pago por sermos tão imediatos. O ditado tão antigo quanto nossas relações que um dia já deram mais certo já dizia: apressado come cru. Sem sentimento, sem interesse no amanhã, sem paixão, sem amor, sem nada. Sem vida.

Greg

Ady Bing
Enviado por Ady Bing em 06/04/2015
Código do texto: T5196993
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