O TEMIDO BANDIDO AGNELO

Encanta-me ouvir as histórias que meu pai conta. Fico olhando, auscultando e anotando tudo. Fico principalmente muito atento ao brilho do seu olhar e as expressões faciais no decorrer da narrativa. Ele dá vida ao que ele narra. É um autêntico e brilhante contador de histórias. Uma das histórias que tenho aqui nas minhas muitas anotações é de um tal Agnelo, bandido muito temido na região da Lapa pelo final do século retrasado.

Reli com cuidado as anotações, e vou descrever com velada parcimônia.

Ele contou, e eu anotei, que esse tal Agnelo era um homem cruel e temido por todos. Poucas vezes visto, mas muito falado, e costumas foco nas conversas de bêbados, e grupos ociosos nos bancos de praças, e esquinas de ruas de parca iluminação.

Diziam que quando era visto as mulheres se benziam, os homens se escondiam e os cachorros vadios, de rabos entre as pernas, rosnavam. Comentavam também que se Jesus estivesse entre nós, ao avistar o Agnelo correria medroso para os braços de sua mãe.

Não se tem foto e nem caricatura desse temível bandido, talvez por tão poucas vezes ele ter se mostrado ou porque ninguém encarraria a própria morte de frente.

Diz a lenda, mas meu pai afirma que é pura realidade, que Agnelo era um justiceiro. Não era arruaceiro nem briguento, mas não levava desaforo para casa. Se o cara esnobasse valentia para ele, imediatamente via suas vísceras dependuradas fora da barriga.

Agnelo tinha muitas mortes em sua fúnebre coleção. Normalmente suas vítimas não eram bons viventes. Eram cidadãos perdidos na vida – vagabundos de carteirinha.

Sempre, nas rodas das bodegas de beira de estrada, tinha um pseudovalente que gostava de contar vantagens a respeito do Agnelo, do tipo:

- Passei pelo Agnelo, e não abaixei a cabeça encarando-o frente a frente. E completava: E o covarde me respeitou!

Com certeza esse cara pode até ter passado por perto de onde estava o bandido, mas o certo mesmo é que abaixou a cabeça, saindo correndo com a cueca emporcalhada.

E foi num desses encontros, em papos inúteis, muito mais falando sobre o bandido que sobre mulheres que, entre uma pinga e outra, um farfante gabola grita no meio da bodega:

- Eu sou o Agnelo!

A noite já tinha se anunciado.

Eu sou Agnelo, Agnelo, Agnelo, e a frase ressoou mortuária pelo ambiente fazendo correr o mais valente dos homens se estivesse de plantão.

Ao ouvir isso os marmanjos que estavam por ali, mijando-se de medo se entocaram por debaixo das mesas.

O silêncio foi sepulcral.

O lusco fusco, no tremular das lamparinas, fez apenas uma figura alheia lá no fundo da bodega permanecer com a bunda colada na cadeira. Se era de medo ou aleijado não se sabe. O fanfarrão, ao lado do balcão, ignorando a figura desconhecida lá no fundo da bodega e notando o medo dos inúteis bêbados por debaixo das mesas, bate com força na mesa e grita.

- Seus filhos de uma puta, medrosos do caralho, podem beber e comer de graça por que eu sou Agnelo. E completou: - Eu mando e não peço.

Um e outro aos poucos foram se chegando ao balcão.

O dono da bodega, se urinando todo, viu suas parcas economias ser devastada por ordem daquele canalha irresponsável.

Todos se fartaram e se embebedaram além do limite.

Quando o valentão deu sinais que iria escorregar o esqueleto para fora indo embora, a misteriosa figura levanta-se lentamente, e a passos firmes, com uma reluzente arma na mão se dirige ao fanfarrão.

Com a mão forte no colarinho e a arma apontada na testa do metido gabola diz:

- Seu farsante de uma figa! Agnelo pode ser bandido, coisa ruim, o capeta vestido de gente, mas respeita o trabalhador e as pessoas honestas!

Não pegou o gabola pelo cu das calças porque já estava toda urinada e emporcalhada, mas pela goela gritando:

- Vá lá e pague a sua dívida, seu porqueira!

A dívida foi paga.

Agnelo, sem pressa, pega o cavalo e desaparece na escuridão da estrada.

Mario dos Santos Lima
Enviado por Mario dos Santos Lima em 05/04/2015
Código do texto: T5195557
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