Amor em desatino
Ela corre desesperadamente no meio daquela imensidão de mato. O verde é tanto que se confunde com a cor dos seus olhos. Olhos que mais parecem dois limões querendo partir-se ao meio. O vento insiste em assanhar o seu longo cabelo encaracolado. A roupa, até então branca, está um tanto quanto escurecida. As sandálias ficaram no meio do caminho. Os pés, agora livres, podem sentir o friozinho do roçar do mato. Ela corre tão desesperadamente que cai e cola o seu rosto no chão sujo. Uma lágrima escorre do seu olho. Uma lágrima é pouco pra que ela pare. Levanta-se num ímpeto e volta a correr. Passa a mão na boca para retirar a areia. Os olhos estão marejados. As pernas estão cansadas, mas motivadas a correr ainda mais rápido, sabe-se lá por que. A cada passo sua respiração fica mais ofegante. O chão parece puxá-la para baixo com uma força estrondosa e o coração insiste em deixá-la de pé e firme. O cansaço é tanto que ela pensa em desistir por várias vezes. Na última seus olhos avistaram algo. Olhos marejados agora vívidos estão. Ela parece não acreditar que avista enfim aquela casa. Ainda está longe, mas reconhece a sua cor amarelada. O sorriso aparece entre lágrimas. Corre. Corre ainda mais rápido. A porta está entreaberta. Empurra-a. Entra de supetão. Olha para todos os lados e vê que tudo está desarrumado. Um vendaval parece ter passado por ali. Ela nem consegue pensar. Olha a escada e desata a correr. Sobe os dez degraus como se fossem cinco e logo avista a sala de pintura. Entra. Ele está? Deitado entre tintas e pincéis. De longe parecia tão tranqüilo e de perto parecia tão frio. Suas mãos estão geladas. Aquelas mãos que tantas vezes a aqueceram. O seu corpo parece pesado. Ela quase não consegue virá-lo. Beijou a sua boca suja de tinta. Tinta e areia tornam-se um neste momento. Lembrou-se de tantos quadros que ele havia pintado dela naquele mesmo lugar. Naquele quarto ele deu vida há tantos quadros. Naquele quarto ele perdeu a vida. E ela também.