Olhos vorazes
O medo aguça os sentidos, a audição fica mais apurada, a visão mais sensível, até mesmo os pelos do corpo se eriçam para aumentar a percepção do ambiente; o corpo todo se adapta para prever um possível predador ou perigo iminente.
Noutro dia um fato fez-me arrazoar sobre estas cousas da natureza. Estava em um elevador, sou claustrofóbico e, embora seja uma fobia já há anos sob controle, sempre rola um certo desconforto. Quando as portas se abriram havia na entrada uma mulher, morena, cabelos longos, não era dotada de grande beleza, mas ainda assim causou-me forte impressão seu olhar; escrevendo estas linhas posso ver aqueles grandes olhos, um olhar peculiar, eram olhos vorazes...
Tive a impressão que por trás daqueles olhos havia um grande desejo de liberdade, uma ânsia por satisfação, mas mantinha-se um pendor sufocado... Quase pude ouvir seu sussurro, um misto de gemido acuado e grunhidos bestiais; pude sentir através daqueles olhos uma grande energia contida... Uma fome incontida.
Fiquei pensando sobre a impressão que me causara aquele encontro, aquela situação, o que afinal teria me despertado tamanha sensibilidade num encontro tão corriqueiro? Cheguei a conclusão que possa ter sido resultado da apreensão da claustrofobia, somada a surpresa de um espírito selvagem.
Olhos vorazes... De todas as fomes, todos os desejos e todas as frustrações vividas nos últimos dias, fico com aquele olhar... Um desejo contido, uma grande energia potencial, ainda que nunca realizada, é a melhor memória...
um abraço!