OCASO

perpetuarão pela eternidade afora. A propósito, estamos em tempo de Quaresma, quem sabe não seria um bom momento, para refletirmos um pouco na efemeridade das coisas materiais, na nossa própria efemeridade ...OCASO

A aragem deste final de estação estival acaricia-me o rosto, e enche o ar de suaves eflúvios que emanam da terra ainda transpirando viço, inebriando-me, e de maneira quase lasciva invade-me as narinas e penetra em todos os poros da minha derme.

As avezinhas, passada a euforia e a azáfama da primavera e do verão do cuidar de seus filhotes, agora já grandes e livres para voar, reconfortadas pipilam sobre as ramadas do arvoredo ao fim do dia, como a cochicharem segredos.

As cigarras despedem-se do verão num canto prolongado, magoado, quase solene, quase oração.

Logo a natureza se revestirá do brônzeo-dourado, e as folhas das árvores entregar-se-ão aos braços do vento para o grande bailado de despedida, para depois, já cansadas e sem vida, repousarem no chão que as há de transformar no húmus que, na próxima primavera nutrirá as novas plantas, cumprindo-se assim o ciclo vital.

O outono logo chegará e a estação outonal é o tempo de colher os frutos do trabalho, de encher o celeiro, para o ano inteiro. É o tempo que nos acalma o coração, e nos induz à meditação.

O céu azul ao sul do Cruzeiro do sul, agora apaziguado, será novamente riscado pelas aves migrantes com suas exímias coreografias e, doces bailados, como num bem haja a estas terras, a estes pagos, e aos dias por cá passados. É um gesto gracioso, de gratidão, um até logo mais...

E, o pôr-do-sol, o doce arrebol, logo tingirá o horizonte de cor mais rubra, até que a noite com seu manto o céu cubra, para que, a lua fique mais bonita e sorridente, quando descer à minha rua.

Como parte intrínseca da mãe natureza, vou-me impregnando de luz e sombras e, a cada estação, morrendo um pouquinho, à semelhança da cigarra que canta, canta, contudo, sem saber por que canta. Eu, ser pensante, sinto, e medito, na efemeridade dos dias, dos anos, e o quanto é breve a beleza que se esvai a cada tique taque do relógio do tempo, que não para na sua corrida ingente, indiferente aos anseios do nosso coração.

E, sobre o altar de mim, do meu nada, serei talvez, a voz que transe no vento, não sei de que quadrante, de onde, ou de que tempo.

Rodapé – Assim como as estações do ano, todas as outras coisas que nos cercam são efêmeras: as pessoas, os ditadores, os mal feitos, o orgulho, a maldade. Só as boas ações se prolongarão pela eternidade afora.

Eduardo de Almeida Farias
Enviado por Eduardo de Almeida Farias em 21/03/2015
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