Pulseira Verde
Não é difícil ser portador de uma pulseira verde. Basta sentir-se mal e buscar atendimento em um Hospital que tenha "tecnologia movida a calor humano" e que ofereça segurança e qualidade assistencial. Com esse adorno, o "tempo de entrada até o médico é menor e não haverá concorrência com pacientes mais graves", além da garantia de "atendimento por médicos dedicados a ele".
Outra leitura possível é a de que, quem a usa, por apresentar um caso de menor gravidade, pode esperar duas horas, três ou mais, porque um competente profissional da triagem considerou que sua demanda não é urgente. Por isso, ele pode assistir ao vai-vem de funcionários que vêm e que vão, ouvir suas falas, ver médicos que entram e saem de seus consultórios, interagir com os companheiros de espera, admirar o proprietário que passa apressado sem olhar para o lado, divertir-se com parte da novela que passa na televisão e, até, preencher o formulário de avaliação.
Apesar de tudo isso, depois da longa espera, ele se transformou em um impaciente. Aproveitou a entrada franca de uma pessoa no consultório em que deveria ser atendido e tentou falar com o médico, queixando-se da demora, mas a resposta foi rápida e inesperada: deveria apenas esperar lá fora...
Passaram-se mais quinze minutos e, finalmente, o (im)paciente foi chamado. Parecia um alívio, porém recebeu fria acolhida e, depois de rápido diálogo, a advertência de que deveria reclamar na triagem porque não estava diante do médico adequado. Deveria voltar à recepção e começar tudo de novo. Vale dizer que o paciente octogenário estava no consultório de um especialista em geriatria.
Recomeçar foi mais fácil depois que o acompanhante recorreu à gerência e relatou os fatos. Chegou a hora da diplomacia, mas a toxina já se instalara na corrente sanguínea do cidadão que procurou "atendimento diferenciado, humanizado e personalizado". De tudo isso, ficou apenas o registro de tentativa de resgate da dignidade do paciente.