Crônica de uma greve
Reunidos, um grupo de professores acompanhava com empolgação a manifestação:
- Olha José, acho que a greve vai bombar. Falou o sarado professor Herculano.
- Espero que sim. Os professores precisam continuar lutando para pressionar esse governo.
Carlos Max aproveitou e discursou:
- Ninguém aguenta tanta desvalorização! A greve é a solução! O professor, que hoje vive oprimido, tem que estar nas ruas lutando contra a opressão imposta pelos governos elitistas!
- As ruas lotadas são a resposta de nossa indignação para o esfacelamento da educação. E certamente, é uma mostra da consciência coletiva do professorado que se apoia no alicerce da união estabelecida pelos vínculos forjados, primeiramente, na crença do bem estar para nosso alunado, e depois, em nossa satisfação em valorizar a sociedade como um todo. Filosofou Tales.
Julieta, sempre sonhadora e romântica, comentou:
- É sempre lindo ver tanta gente com faixas nas ruas e cantando slogans de protestos. Acredito que as pessoas saberão interpretar esse momento.
- Todos juntos, deveríamos cantar de mãos dadas para mostrarmos nossa união. Seria marcante, atrai muitos corações e emoções para uma greve. Acrescentou Roberto.
- Não há governo que aguente a pressão do povo! As passeatas precisam ter um movimento retilíneo uniforme pelas ruas, assim terão que nos atender. Pediu Alberto, sem abandonar sua mania por conceitos físicos.
- É isso aí companheiros!!! A hora é agora!!! Gritou Carlos Max, visivelmente empolgado.
- Temos que nos mobilizar cada vez mais. Fazer o movimento grevista progredir e mostrar que sem nós não há educação. Reforçou Herculano.
O ímpeto dos professores não diminuía. E acalorados, demonstravam suas vontades e ideias para o engrandecimento do movimento grevista. De repente, Vânia Mércia apontou para os policiais e questionou:
- Será que eles não vão desgrudar dos professores? O protesto é pacífico. Por que não vão correr atrás de bandidos?
Revoltada, Julieta começou a gritar e repetir o coro que ouvia:
- O povo! Unido! Jamais será vencido! O povo! Unido! Jamais será vencido!
- Com os professores de braços cruzados, as escolas ficarão paradas enquanto não formos atendidos. Previu Carlos Max.
- O negócio é permanecer parado, não importa o tempo que leve. O tempo estará em nosso favor. Tentou convencer Tales.
Márcia Tomás, sempre compenetrada, legalista, e sem abandonar seu olhar social, perguntou:
- Quantos direitos ainda irão nos tirar? E ela mesma respondeu: - A greve é legal, e é nosso dever conclamar a todos para não perdermos os direitos que ainda nos restam.
- Os alunos e pais precisam perceber que a luta é por uma educação melhor para todos; principalmente para os alunos. Precisamos convocá-los para demonstrarmos isso para eles, para que possam perceber que todos sofrem na carne e na vida por causa do caos em que a educação se encontra. Propôs Charles, conhecido como o professor que gosta de usar camisetas com figuras de tartarugas.
- Com eles do nosso lado essa greve será uma pintura. Afirmou Leonardo, até então o mais calado.
Inspirada, Leocádia também se manifestou já se imaginando como futura personagem da história:
- Com esse movimento mudaremos a história da educação e inspiraremos as gerações vindouras.
Carlos Max, sempre insistente e contundente, disse:
- Camaradas! Se estivermos coesos, seremos mais fortes que tudo: governos, partidos, sindicatos, etc.
- Ninguém nos dividirá. Nossa energia indivisível provocará uma reação em cadeia que contagiará cada átomo desse país. Concluiu Alfredo Vobel.
Julieta, não se conteve:
- Ah, que vontade de cantar “Caminhando”, de Vandré!
Todos estavam empolgados com a conversa de exaltação pela greve. Continuaram reunidos no mesmo lugar e atentos ao que diziam um para o outro. Deixaram por um momento de acompanhar o que acontecia na manifestação.
Não demorou muito e alguém aumentou o som da televisão para ouvir o finalzinho do telejornal: “A assembleia dos professores no centro da cidade acabou de decidir pelo adiamento da greve, já que o número de professores reunidos para a assembleia era insuficiente para iniciar uma votação pelo início de uma greve. Portanto, as escolas continuarão a func....” A TV foi desligada abruptamente quando o diretor entrou na sala e anunciou:
- Pessoal, o sinal já tocou e os alunos já estão esperando nas salas. Vamos lá. Mantenham a costumeira motivação, pois nossos alunos dependem da gente. Boa aula, professores!
Todos os professores, que há pouco estavam eufóricos pela greve, começaram a levantar de seus assentos ao redor da grande mesa. Alguns deixaram seus cafezinhos de lado e recolheram seus cadernos, diários, livros e apagadores. Devagarzinho, foram saindo da sala dos professores, mas no caminho para as salas de aulas ainda foi possível escutar as falas de alguns professores:
- Eh raça!!! Não conseguem fazer uma mísera greve direito!
- É mesmo! Que povo mais desunido!!!
- Por isso que não conseguem nada!!! Bem feito!!!!
- E eu que queria tanto cantar, não vou poder!!!
- Culpa do sindicato!!!
- A Culpa é dos professores que não se mexem!!!
- Só sabem reclamar nos corredores das escolas!!!
- Ainda bem que somos diferentes!!! Tenho fé que um dia a greve sairá!
- Bem, já que a categoria é fraca e desunida, e a greve mais uma vez não irá acontecer, vamos lá, juntos, enfrentar o dinossauro.
Os corredores esvaziaram-se. Cada um entrou em sua sala, e assim, mais um dia letivo iniciou-se; como tantos outros.