Um presente de pai.

O meu pai era um homem de pequena estatura, meio calvo, uma tez morena de andaluz, diferente de mim, que sou muito branco,como a minha mãe, ele era um homem culto ,economista de profissão. Era daqueles que ainda amarravam o cinto acima do umbigo, nunca usou chinelos, nem camisetas, sempre , até aos domingos usava seus sapatos "Vulcabrás", e no máximo se permitia não usar gravata. Do tipo meio antigo, que não toma cerveja, só vinho ( em jarra) , mas mantinha algumas na geladeira para a visita dos filhos, não comprava frios fatiados, ele mesmo os ía cortando na mesa, enquanto partia o pão.

Certa vez quis me presentear, pelo meu aniversário, um dia depois do Natal, mesmo que eu não quisesse , mas era impossível discutir qualquer coisa com ele, estava decidido e ponto, e ele tinha condições, então fomos a uma loja de departamentos, e olhe que eu já tinha mais de trinta anos, mas para ele eu era apenas o seu garoto .

Ele sabia dos meus gostos, e parou perto dos instrumentos musicais, e eu fui pegando um violão, e outro, e tocando as cordas, aproximando-os do ouvido, sentindo os trastes, a madeira, e ele só observando, e como ele era homem de poucas palavras, foi medindo o meu jeito , sempre paciente, e quando me demorei um pouco mais num acústico, ele se aproximou e disse; Pode ficar com este que você gostou. Está feliz ? - Sim pai, muito ! Meus olhos falavam por mim !

Se passaram muitos anos, ele adoeceu muito cedo, e partiu antes do tempo, mas mantenho esse violão sempre afinado, pois tem um som muito gostoso, com ele aprendi muita coisa, e tenho um baita carinho por esse instrumento, representa muito para mim, foi presente do meu pai, que o comprou com tanto amor, para me fazer feliz.

Tenho outros violões, mas esse é o mais querido de todos, foi nele que toquei "Naquela mesa" , música que meu pai gostava muito, e dizia que gostava mais de me ouvir cantar, e sentia as palavras e os versos, mas ele mesmo nunca cantava coisa alguma, dizia que não tinha ouvido, preferia ouvir.

Esta é um pequena homenagem apenas, de tantas que ainda pretendo lhe fazer, pois pessoas que amamos não morrem, apenas dão um "até breve " , prefiro pensar que os milagres acontecem, a viver ser razão .

Aragón Guerrero
Enviado por Aragón Guerrero em 08/03/2015
Reeditado em 09/03/2015
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