O PROFESSOR "PI" - De Delegado de Polícia a Senador da República.
CAPÍTULO III (final)
O Capítulo I foi publicado em 31/5/07;
O Capítulo II foi publicado em 2/06/07.
OBSERVAÇÃO: Leia o MURAL.
Em toda campanha eleitoral os recursos os recursos se constituem
no busílis da questão,os diferentes candidatos recorrem uns aos outros
visando conseguir meios para suportar as despesas, em troca entrela-
çam os apoios políticos.Na verdade o Professor Assunção,apesar de ser
detentor de forte contingência econômica,embasada na origem de seu patrimônio e ter amealhado prósperas condições,obtidas como se viu do comportamento pouco recomendável,nem sempre ortodoxo,não dis-
punha de larga situação financeira, isso dificultava o assédio dos aspi-
rantes às Câmaras Municipais, Assembléias Estaduais e mesmo ao Con-
gresso Nacional.Essa posição favorecia outro candidato ao Senado,que
além de ser presidente de um conglomerado de jornais, de expressão nacional,detinha invejável fortuna particular,o Dr.Augusto.Aqueles con-
correntes, apesar de apoiar o Dr.Assunção, batiam nas portas do outro
candidato, onde geralmente conseguiam as benesses que fortificavam
as caixas de despesas. A estranha posição impedia de vaticinar quem
seria o eleito pelo partido a uma das duas vagas de senador, já que à
oposião estava reservada a primeira.
Tais fatos, contudo, não impediam que os eleitores acreditassem na eleição do Professor Assunção e mesmo os jornais de menor circulação apontavam como certa sua vitória edleitoral.
O dia da eleição foi concorrido,os chamados "cabos eleitorais" mo-
vimentavam-se em atropeladas carreiras de uma sessão para outra,as-
sediando os eleitores para que sufragassem o nome do Professor PI. Ao
final de demorada apuração,com inúmeros recursos e impugnações,ele-
geram Nicomedes Campos de Assunção Senador da Repúiblica. Nico es-
tava radiante, não ia pela sua cabeça o primordial fator de alçar tão elevada posição, nem a defesa da sociedade e os interesses do Estado
que representava, e sim as oportunidades que iriam aparecer e grandes
negócios.
Assumindo no Palácio Monroe, na Cinelândia, viu-se diante de um cenário estranho, onde as figuras mais representativas dos Estados se
congregavam e demonstravam alto saber sobre os problemas nacionais,
marcavam suas presenças com elevadas poses, sem levar muito em consideração os forasteiros políticos.O Senador Assunção foi se impon-
do diante dos demais colegas pela imortal desfaçatez.Mantinha a velha
tradição do fumegante charuto, insuportável à grande maioria, e o sin-
gular chapéu de abas largas, envolvendo-se sempre nos mais significa-
tivos interesses do governo.
O antigo proceder se encaixava facilmente, a permuta de posi-
ções, objetivando obter em troca vantagem para sí ou correligionário.
Seu gabinete vivia repleto de homens de negócios ou conterrâneos,que
se viam diante de um dilema, aturar e enfrentar a fumaça do charuto do Senador e que quando não queria atender a reividicação desviava o
olhar e soltava a baforada.
Voltou a ser procurado pelo ditoso agrônomo, idealizador da cam-
panha da soja, agora querendo apoio à pesquisa de petróleo na bacia
de Campos.
O Dr. Domingos Abbês observara numa praia daquele município do
Estado do Rio,Atafona, que suas areias exteriorizavam manchas do co-
biçado mineral; para alguns provinham de embarcações que abriam suas comportas em alto mar, facilitando o escoamento dos tanques. A-
conteceu, porém, que modestamente, por sua conta e risco, mandou fazer uma prospecção de cerca de 300 metros de profundidade e de lá
retirou amostras significativas do precioso combustível. A PETROBRÁS
criara naquela época, por pressão popular,os trabalhos de pesquisa na
Bahia. O Senador não manifestou nenhum interesse pelo assunto, ao contrário ridicularizou o sonhador, comentando os americanos já disse-
ram que no Brasil não há petróleo e sugeriram ao governo o fechamen-
to de todos os poços cavados, obstruindo-os, agora volta o senhor com essa excentricida, com projeto de nenhum alcance público. Grace-
jou com os jornalistas e pessoas presentes,este é um visionário, "abes-
tallhado" pelas grandezas. Mal sabia ele, Senador, que o ouro negro do país seria extraido das profundezas dos mares, exatamente,naquela lo-
calidade. Tivesse, como Senador, empunhado a bandeira da idéia que a sí foi levada, hoje estaria com o nome na história, baluarte da grande
conquista petrolífera. Os jornais da época, "A NOITE, CORREIO DA MA-
NHA, DIÁRIO DE NOTÍCIAS, O ESTADO, O FLUMINENSE", os dois últimos
do Estado do Rio, deram notariedade à notícia.
Nunca é demais externar que durante muito tempo, americanos,
franceses e ingleses levaram das praias fluminenses infinidades de em-
barcações com as chamadas "areias monaziticas".
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O Senador Assunção convocara para compor seu gabinete a eterna
cativante Adelaide, e a toda admirada Iracema, que naquela altura mostrava-se sóbria, relegando suas origens do cassino. Ambas tiveram
importantes atividades no gabinete e sempre estavam a justificar a au-
sência de S. Exª ou protelar o recebimento de indesejáveis oportunis-
tas. Assenhorearam-se das posições e atendiam com polidez e indisfar-
çável interesse as pessoas detentoras de possíveis vantagens para o Senador. Eis que num belo dia surgiu o atormentador Francisquinho, de
triste memória para Nicomedes, a proferir impropérios e malsinar Nico,
comentando aos berros o comportamento do ora Senador. As duas ser-
vidoras tiveram imenso trabalho para afastá-lo do gabinete e depen-
dências do Palácio Monroe. Iracema saiu com ele para mostrar o dan-
cing Avenida, próximo dali, frequentado pela boemia do Rio de Janeiro.
Mais ainda assim, ele não deixou de proclamar que voltaria, perseguiria o Professor PI, agora Senador, onde ele estivesse.
Nas imediações do Senado ficavam as grandiosas fontes de diver-
sões da cidade maravilhosa e após as sessões comunmente muito dos
senadores assiduamente lá estavam, no Ambassador, na Mesbla, no "Night and Day", instalado do Hotel Serrador. Viviam abarrotados de políticos, que já sorviam "whisky",e harmonizavam os conchavos nacio-
nais.O Senador Assunção não fugia à regra,em um ou em outro, depen-
dendo da presença de quem estivesse, poderia encontrá-lo. Mudara os
trajes,por inspiração das auxiliares,andava elegantemente vestido com
os ternos feitos pelo mais afamado alfaiate do Rio, o italiano Fazzano,
já não parecia o capiau ou delegado de polícia do interior,não deixava,
contudo, a excentricidade das conquistas amorosas.
O Senador não abdicava seus procedimentos antigos,aproveitou-se
do craque do café,causador de tremendo abalo financeiro ao País,por-
que além da queda de preço do café, os mercados importadores se re-
trairam, havendo elevado estoque da produção, que ficavam mal arma-
zenados e sem perspectivas de desafogo dos depósitos.
Adotou-se a política de queima do produto,visando sua valorização
pelo estoque chamado regularizador. motivando o esvaziamento dos almoxarifados. A queima prevista seria de trinta mil sacas por mês, até
normalizar a venda no exterior. O Senador Assunção resolveu procurar
o Direto do Departamento Nacional do Café,dispondo-se apresentar um
plano, originado pelos grandes atacadistas exportadores. Queimariam
apenas a metade prevista , cerca de 15 mil sacas e o restante 15 mil,
esses negociantes adquiriam por fora. Do negócio haveria a repartição em três partes iguais.O Diretor homem sério, patriota, seguidor correto
da política implantada pelo governo, só não colocou Assunção fora de
seu gabinete porque ele era Senador, mas quase chegou a esse extre-
mo. Malograra assim a primeira investida de Assunção em negociatas
como Senador.
Certa vez acontecera um fato singular, desusado, com o Senador
Assunção, próprio,porém, do seu natural comportamento. Marcara
um encontro à noite com uma das mais famosas vedetes da Companhia
de Carlos Machado, coreógrafo do "Night and day". Antes, acertara uma falsa sessão extraordinária, a ser convocada pelo Presidente do
Senado. Sua colaboração na trama tornar-se-ia imprescindível para dar
maior creditibilidade. Cedo retornou a casa,já estam morando em Bota-
fogo, então bairro nobre do Rio, e falou à Aurora, sua dedicada mulher, hoje não estou para ninguém, nem para o Presidente do Sena-
do,quero descansar,estar com vocês e ler os jornais e revistas.Tomou
um demorado banho, perfumou-se da cabeça aos pés, vestiu o pijama
de seda e por sobre esse o "robe de chambre" mais chique que dispu-
nha, calçou os chinelos e foi sentar-se na sala, começo a ler os jornais
vespertinos, mas de olhos no relógio da sala. O encontro seria às 21,30
horas. Uma hora antes o telefone tilintou, Aurora dirigiu-se a atendê-lo,era o Presidente do Senado,que a ela mesmo informara,muito cortês,
diga ao Assunção,que a sessão extraordinária foi retirada de pauta,não
haverá mais e ele pode permanecer em casa descansando.
No dia seguinte, seu primeiro ato foi dirigir-se ao gabinete do Pre-
sidente e a ele falou asperamente,eu não havia combinado,como V.Exª
faz uma coisa dessas comigo, deixei de comparecer ao fortuito encon-
tro,conseguido após muita astúcia e não sei se terei outra oportunida-
de, no que respondeu o Presidente: - você achava que eu participa-
ria de uma imoralidade dessa, sou um homem de bem, íntegro, incapaz
de imiscuir-me numa burla e coloborar para desintegração conjugal.
As notícias corriam céleres, o desassossego tornara-se geral, até
mesmo entre os funcionários, dos mais graduados aos mais modestos.
O Senado seria transferido para Brasília,dentro de três meses,o pe-
dido fora feito pelo Presidente da República. Alguns Senadores estive-
ram presentes na ianuguração, acompanhados das esposas e funcio-
narios mais expressivos. Viram com seus próprios olhos que apenas os
edifícios do Congresso Nacional estavam prontos, mas os móveis e ins-
talações não existiam; os gabinetes ainda com materiais de obras.E as
residências estavam em construções, como abrigaria um contingente humano tão numeroso? Escolas, faculdades, hospitais, enfim todo com-
plexo estrutural desfalcado, impossibilitava transferir estudantes, filhos dos servidores para o Distrito Federal. Falavam em renuncias coletivas
e, conseqüentes, convocações dos suplentes, que não estavam inte-
grados à política governamental. Funcionários mais açodados, animo-
sos, deram entrada nas suas aposentadorias, outros recorreram ao ju-
diciário. A convulsão se generalizara parando o funcionamento do Poder
Legislativo ou funcionava de forma irregular, ninguém se entendia ou dava uma solução atenuante. O Senador Nicomedes informou oficial-
mente à Mesa que se tivesse mesmo de ir, prescindia de instalações para a família, que permanecessia no Rio de Janeiro, ele aprsentar-se-ia só.Nico raciocinou, conjeturou, tudo não passa de mais uma aventura,entre tantas que teve. Passados cinco meses,ele. o Senador Assunção, e mais outros 29 senadores,encaminhram-se à Brasília,num avião fretado, DC-3, da Aerovia Brasil.
Não causou admiração ou surpresa a viagem, o Senador Assunção
ficou deslumbrado, encantado mesmo com uma das aero-moças.A elei-
ta, tipo esguio, loura , olhos azuis, denotava logo descendência gernâ-
nica. Elogiara sua beleza em todos os momentos, chamando-lhe insis-
tentemente, sem razão aparente para forçar conversação. Descontro-
lou-se e a convidou para um encontro, embora sem saber o lugar que poderia ocorrer. De forma delicada a jovem alegou que a preten-
são dificilmente sobreviveria, por três razões, estava proibida pela em-
presa aérea, era noiva e regressaria ao Rio naquele mesmo dia. Assun-
ção não se deu por vencido, retirou da carteira um cartão social, no qual constava o seu nome, o título de Senador da República, o endere-
ço no Monroe e seus telefones. inclusive da residência.
Inicialmente, todos senadores foram hospedados no Brasília Palace
Hotel, próximo ao Palácio da Alvorada, o unico que tinha condições de
acomodá-los, independente dos existentes na chamada Cidade Livre,
mais tarde denominada Núcleo Bandeirante.
O vôo do Rio de Janeiro a Brasília fora intrânqüilo, o avião pequeno
de dois motores,obrigado a fazer escala em Belo Horizonte para reabas
tecimento, por falta de autonomia; da capital mineira a nova Capital veio em baixa altitude, cerca de 500 metros, comprometendo a estabi-
lidade, o que causou certa apreensão e náusea a Nico e demais passa-
geiros, a maioria poucas vezes usara aquele tipo de transporte. Apesar
dos cuidados com a programação, não houve entrosamento capaz de
facilitar o deslocamento do aeroporto improvisado, de madeira, até ao
hotel em que ficariam acomodados. Poucos ou nenhum transporte a-
guardava tão significativo número de senadores, a má impressão reina-
ra entre todos.
O Senador Assunção não troxera, logo de início, suas duas maiores,
auxliares, Adelaide e Iracema, que permaneceram no Rio de Janeiro. Não tinham o que fazer, nem dispunham com facilidade de veículos pa-
ra se deslocarem e o Senado ficava distante do hotel, impossível irem
caminhando a pé. Restringiam-se visitar o Palácio da Alvorada, entra-
da franca, sem obrigatoriedade de identificação, além disso o Presiden-
te da República lá não estava. Os dias foram se tornando monótonos, em nada se assemelhava à agitação do Rio,o que fazia relembrar os lo-
cais que diariamente frequentavam. As refeições eram feitas no próprio
hotel,tornando-as cotidianas.Os restaurantes existentes estavam,qua-
se todos,localizados na chamada Avenida W-3,o comércio também,mas
para irem até lá dependiam da boa vontade das pessoas, os taxis difi-
cilmente apareciam. A correspondência e o telefone não eram certos,
falar com o Rio de Janeiro só atrvés do rádio do Palácio. Nico, como os
demais se mostravam impacientes, ajustaram retornar; providência contornada pelo Grupo de Transferência de Brasília (GTB), que esque-
matizou solução para aqueles dificuldades.
Enfim, tiveram acesso às dependências do Senado,a princípio tudo
improvisado, faltava mobiliário e acomodações condignas.
A falta de auxiliares e os meios de comunicações, impediam o de-
sempenho das obrigações corriqueiras. O Senador Assunção tomou a
iniciativa de estabelecer contato com os altos escalões da Câmara dos
Deputados, mais organizada, embora também de forma precária, dispunham de veículos, possibilitando o deslocamento dos parla-
mentares.
A solidão inquietava Nico, pensou em chamar sua mulher, Aurora,
preocupou-se porque não sabia como ela reagiria permanecer em Brasí-
lia por muito tempo, depois lembrou que mais interessante seria a vinda
de Adelaide, sua favorita secretária, que poderia auxiliá-lo na organiza-
ção do gabinete. Afastou, desde logo,a hipótese de convocar Iracema,
já lapidada das influências de bailarina do cassino, e os atrativos pessoais concorreriam a um assédio dos colegas.
Dispondo de transporte pode conhecer outros lugares,principalmen-
te a chamada Cidade Livre, que se assemelhava ao faroeste americano
e a poeira não impedia a movimentação constante das pessoas, achou
muito pior que Encarnação. Independente da movimentação a qualquer
hora do dia ou da noite, o fato que lhe chamou mais atenção foi um
hospital de madeira de um instituto de previdência, localizado no alto
de uma elevação, com uma extraordinária equipe médica, competente e dedicada, leitos e instrumentos cirúrgicos novos para atender emer-
gências. Competia a esse hospital receber, inicialmente, nordestinos
que vinham em caminhões para trabalharem nas obras, medicava-os e
selecionava-os. Surpreendeu o Senador, que não cansava de enaltecer
os serviços prestados pelo referido hospital.
Não teve coragem de ir a um restaurante da Cidade Livre, as refei-
ções servidas derivavam das regiões do norte do país, preferiu retornar
a W-3, onde a variedade existente lhe permitia a escolha de um almo-
ço mais atraente. Perguntou ao motorista, que servia de cicerone, qual
o melhor restaurante, citou cinco: GTB, Macumba, Che-Vilee, Bennis e
Adele. O Bennis considerado o detertor do mais expressivo cardápio.
Ficou admirado, como era possível encontar em local tão distante co-
mida sofisticada, requintada e de ótima qualidade. Venceu essa etapa
e as espectativas melhoraram. Estava no final de construção o Hotel
Nacional e quase todos parlamentares, que aguardavam o recebimento
dos apartamentos para residirem, se manifestaram trocar de hospeda-
gem. Afinal determinou a vinda de Adelaide, que demorou 15 dias para
chegar à nova Capital. Imediatamente, ela colocou em prática sua efi-
ciente destreza administrativa, embora informando a Nico que teria de
regressar dentro de no máximo em 20 dias, pois deixara no Rio vários
assuntos pessoais a serem resolvidos.O Senador tinha vontade também
de retornar, porém, só em pensar ter de viajar naquele avião desistia.
Passados a vintena voltou a ficar só, e pior, com reduzido número de
colegas senadores, quase todos se dirigiram aos seus estados de origem.
Animado ficou quando soube que mais três companhias aéreas ha-
viam colocado em tráfego outras aeronaves, inclusive mais novos.
A VASP dispôs de um avião a turbo-helice, o VISCOND; a PANAIR, o
CONSTELLATION, e a VARIG,o ELETRA,que aterrissava no aeroporto
Santos Dumont.
Passados alguns dias, o Senador não tinha nenhum funcionário, já
que os lotados no Rio de Janeiro se recusavam vir para Brasília, o que
fez o Presidente adotar a providência de contratar pessoal capacitado
aqui mesmo e em Goiânia, designando o Senador Assunção presidente
da comissão de seleção. Como o Senador procederia, uma vez que não
havia uma banca habilitada a examinar os candidatos, resolveu convi-
dar professores das escolas públicas existentes. No entanto, ele Sena-
dor, não deixava de ser o Nico ou o Professor PI, de Encarnação. Que-
ria tirar proveito desse trabalho, assim aproveitava as oportunidades para interferir na escolha dos candidatos, o que causou,inevitavelmen-
te conflitos com os professores recrutados. Espalhou-se entre os candidatos que bastava se apresentar no senado com uma donzela a-
traente, cabrocha encantadora, para conseguir a vaga. Nico não per-
dia tempo deitava galanteio às acompanhantes, vez por outra conse-
guia uma conquista amorosa. Voltou a ser reconhecido como o homem
do charuto. E, aquele vício, estava difícil de mantê-lo, seu estoque praticamente acabara. Informaram-lhe que conseguiria num bar na Avenida W-3, o Mocambo, não teve resultado, embora alí inteiraram
que na Cidade Livre forçosamente encontraria. Correu de ponta a pon-
ta as tabacarias e nada, o que tinha mesmo era fumo de rolo, muito usado pelos operários mais humildes. Teve mesmo que falar pelo rádio do Palácio, solicitando a Iracema a compra dos charutos, que além de demorarem a chegar, entregaram na portaria da Câmara.
Na verdade, o Senador Assunção, como sempre ocorrera nas dife-
rentes oportunidades que trilhara na vida, conseguiu expressivo núme-
ro de servidores para o Senado, na totalidade de sua absoluta indica-
ção,o que lhe valeu mais prestígio e reconhecimento.Aos poucos foram
chegando outros senadores e valiam-se de Assunção para enfrentar as
vicisitudes decorrentes da nudança.Tornara-se o todo poderoso da
instituição.
Ele, como os demais senadores receberam convites da Presidência
da República para recepcionar o General Eisenhower, o grande coman-
dante das tropas aliadas que invadiu a Europa combatendo os nazistas,
agora Presidente dos Estados Unidos da América. O formal convite re-
comendava o uso de casaca, traje que o Senador não dispunha. Quan-
do da inauguração de Brasília ele usara por exigência do protocolo da
festividade um alugado e, como o tempo era escasso para mandar con-
feccionar, voltaria a socorrer-se do mesmo expediente, aliás forma que
muitos fizeram, através da Casa Rollas, do Rio de Janeiro, especialista
no negócio. Chegara, porém, tardiamente, todos os manequins haviam
sido alugados. Voltou a acionar Iracema, pedindo-a que fosse ao Fazzano, alfaiate que tinha suas medidas, para talhar uma peça, seria útil,por acreditar que inúmeras outras festas o obrigariam o uso daque-
le traje. O famoso alfaiate alegou que o escasso tempo não permitiria
executar a obra, sugerindo que ela fosse na Exposição ou nas lojas A
Capital, únicas capazes de ter a roupa. Em vão, não conseguiu, princi-
palmente pelo avantajado manequim. A atraente auxiliar se lembrou do
antigo cassino da Urca, que talvez pudesse encontrar, teve sorte, e sua pessoa gozava de muita estima facilitou, conseguiu uma usada por
famoso cantor internacional. Precisava ainda três coisas, mandar lavar
a casaca, comprar uma camisa própria e a gravata. O sapato, disse Iracema: Ele que se vire e compre por lá um de verniz, como mandava
o figurino.
Iracema despachou tudo pela Panair, cujas agências ficavam mais
próxima onde se encontrava, com endereçamento especial para a por-
taria do Senado em Brasília. A companhia não dispunha na capital de veículo de entrega e comunicou-se com aquela casa do Congresso, so-
licitando que viessem apanhar a encomenda no balcão de cargas no
aeroporto, o que se constituiu naquela dificuldade costumeira.
O Senador resolveu provar a roupa quando chegou ao hotel e para
surpresa o tamanho que mandaram era enorme, sobrava muito nas calças e na cinta do paletó. Mesmo à noite, pois a solenidade seria dois dias depois, tentou encontrar um profissional que adaptasse a peça ao seu corpo. Na W-3, os dois alfaiates alegaram que não tinham
condições, mas que na Cidade Livre ele encontraria um habilidoso mes-
tre nesses consertos. Mesmo tarde rumou para a Cidade Livre, encon-
trou, mas o costureiro jamais vira uma roupa daquela, não fugiu ao pedido e resolveu enfrentar a diversidade. Trabalharia a noite toda pa-
ra desmanchar as duas peças, a calça e a casaca propriamente dita.
Marcou amanhã às 14 horas o senhor venha provar e a noite eu entre-
go a vestimenta, disse o costureiro.
O Senador Assunção estava inquestionavelmente bem vestido, rou-
pa certa no corpo, bem passada, corte anatômico, tudo motivava ad-
miração dos participantes presentes na recepção, informando sempre
que mandara fazer especialmente para ele. Conseguiu manter contato
com os americanos que acompanhavam o Presidente, através do inter-
prete, falou primeiro da experiência que tivera com o agrônomo, Dr.Wil-
liam e depois o assunto dominante foi sobre a existência ou não do pe-
tróleo no Brasil, recebendo incontinente negativa, de que aqui não havia o precioso líquido. Uma comissão dos Estados Unidos relatara mi-nuciosamente essa particularidade. Questionou sem se aprofundar na
matéria, sobre o estudo feito por um engenheiro agrônomo, que afirma-
va a existência nas águas do mar, que contornavam o litoral brasileiro,
chegou a ser ridicularizado pelos membros da comitiva presidencial dos
E.U.A.
No dia seguinte resolveu ir ao Rio de Janeiro, em razão do convite
que lhes fizeram Oficiais da Aeronáutuica. Usaria o AVRO, aeronave no-
va que aquele Ministério acabara de adquir, destinado ao transporte de tropa, de bancos estranhos, de um lado e outro, na extensão do
avião, com redes de proteção. Já no aparelho, modestamente sentou-se ao lado dos companheiros de viagem, subalternos da Força Aérea,
sem se identificar, conversou o mínimo possível. Cansado da noite an-
terior, cochilou, quando ouviu um burburinho, acordou assustado e indagou ao passageiro ao lado, o que estava acontecendo, surpreen-
deu-se com a infomação de que estava havendo um incêndio dentro do
avião, apavorou-se, seu olfato acusava cheiro de fumaça. O taifeiro
resolveu chamar o comandante, que veio ao local em que o odor era
mais acentuado, procurando tranquilizar os passageiros, explicou que
nada de anormal estava ocorrendo, pois os instrumentos na cabine de
comando não acusavam, complementou, pode ser pequena estopa que o mecânico da manutenção deixara sobre o motor, quando proce-
deu a revisão. Aumentava o cheiro de fumaça e, consequentemente a
intranquilidade. De repente, o auxiliar de bordo pulou sobre o Senador e
lhe disse o indício de fogo vem do senhor. Ai foi grande a agitação,Nico
constatou, resolveu tirar o paletó, que estava com o bolso de fora to-
do chamuscado, encontrou a razão, era um isqueiro de "tripa", aquele usado no interior que comprara na Cidade Levre, porque há muito não
via. Usou para acender o charuto e deixara de recolher todo o pavio, de 30 a 40 cm.,um cordel embebido em combustível na cor amarela e
marrom.
Já no Rio aproveitou para ir aos costumeiros lugares,antes frequen-tados; primeiro foi ao bar do Hotel Ambassador, encontrou velhos ami-
gos, inclusive Senadores, remanescentes, que deixaram de ir para Bra-
sília, comentou as dificuldades que todos estavam enfrentando, supe-
radas apenas com a tranquilidade e melancolia, causadoras da paz de
espirito. Depois,foi ter no Night and Day,avistando as bailarinas costu-
meiras. Censurando de forma idêntica, acrescendo que não saberia co-
mo proceder, chegando ao extremo de alegar a possibilidade de renun-
ciar o mandato.
Ao chegar em casa tomara conhecimento que sua mulher Aurora
fora para Encarnação com Joana, descansar. A movimentação no Rio
de Janeiro lhe traumatizava, a agitação trazia desconforto,ocasionan-
do prejuizo à saúde. Pensou ir a Encarnação, mas ficaria submetido a
inúmeros pedidos, que nem sempre poderia atender, resolveu permane-
cer no Rio para solucionar problemas no Senado, já que a maioria dos
funcionários permanecia no primitivo prédio, no Monroe.
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O comeentário geral entre os servidores é que quem fosse para
Brasília passaria a perceber os vencimentos dobrados, isto seria para
incentivar a transferência.
O Senador Assunção fez, primeiro verbalmente, um relatório ao Se-
cretário do Senado sobre as contrtações que fizera em Brasília,de con-
formidade com as atribuições que o Presidente lhe conferira,teve a sur-
presa de saber que todos tomaram conhecimento do favorecimento de-
le no recrutamento dos servidores, só foram admitidos quem ele quis. O
Secretário ponderou da necessidade de fazer uma comunicação oficial.
Inegavelmente, todas aquelas providências, relembravam o velho
Professor PI, ou Nico de Encarnação, sem ideal, as conveniências, os
mesquinhos interesses nas conquitas amorosas, sobrepunham a valori-
zação dos cargos ou funções exercidas.
Resolveu rascunhar o relatório recomendado,ofuscando,naturalmen-te os fatos desabonadores. Procurou enaltecer a colaboração dos pro-
fessores convidados das diferentes escolas que funcionavam em Brasília, o que possibilitou-lhe desincumbir da missão, essas citações valorizavam a seleção, Aproveitava para ponderar que, apesar da ótima
seleção, os recém contrtados dveriam ser submetidos a um treinamen-
toespecial afim de capacitá-los ao exercício da função pública perante
o Senado Federal. Historiou o número de servidores assalariados, bem como as aptidões que cada um tinha nos trabalhos a serem exercidos.
No contexto geral, o relatório parecia transmitir a realidade da sele-
ção,enaltecia a lisura de procedimento;uma vez mais o Senador Assun-
ção levava a melhor.
Ao Senado da Cinelândia não deixava de ir todos os dias enquanto
estava no Rio de Janeiro e Iracema submetia-lhe sempre os assuntos
que provinham de Brasília por via aérea, pouco ou nada dava encami-
nhamento por depender de outros colegas que permaneciam na nova
Capital e dos recalcitrantes,que teimavam em não ir,deixavam de com-
parecer à antiga sede. Ficou perplexo e apreensivo quando soube da providência adotada por Adelaide, sua estimada secretária, que conse-
guira outra posição fora do Senado, evitando a transferência para o
Distrito Federal.Iracema informara-lhe da irredutibilidade dela e malicio-
samente deu a entender da influência exercida por outro admirador,Mi-
nistro do Superior Tribunal Militar. O desespero tomou conta da mente de Nico, nada mais raciocinava, praguejava horrores, maldizendo e lamentando a ausência de Adelaide. Não sabia o que fazer, nem tinha a quem comentar e consultar qual deveria ser sua atitude. Procurá-la seria um ato insensato, talvez chegasse a um desentendimento com o
tal Ministro, mas deixar de tomar uma atitude daria uma demonstração
de fraqueza, imprópria à sua índole e passado. Mais trânqüilo, escutan-
do Iracema, ainda ladina, aguardaria os acontecimentos. Ela deveria vir
até ele dar satisfação e explicar as razões que a levaram adotar aquela
iniciativa. Resolveu ausentar-se, rumando para Encarnação onde esta-
va sua mulher e a filha. Razoável medida, poderia ver a fazenda deixa-
da com um administrador, que correspondia sua confiança. Inclusive o
estado das plantações de algodão e café, fora o gado de alta linhagem
adquirido ou presenteado quando fora Secretário de Agricultura.
Para perplexidade de Nico, o encaminhamento de pedidos minícipes
foi inexpressivo, havia uma curiosidade maior que o esperava, todos
queriam saber como era Brasília, se tudo publicado nos jornais era de
verdade ou apenas de papelão para serem fotografados.O povo parecia
não acreditar, estava convencido de ser uma ilusão política do Presi-
dente Juscelino, nessa ótica sobrelevava a pureza de ser humano.
O Senador Assunção fez uma preleção generalizada a expressivo
grupo, do que na verdade vira, elogiando a realização, não deixando de
criticar as dificuldades existentes e a falta de uma estrutura capaz de propiciar o pleno funcionamento da cidade moderna. Concluiu que a au- sencia do contexto de uma metrópole evidenciava-se, impedindo a formação de uma sociedade empírica, derivada pela diversidade dos operários que provinham de diferentes regiões, com diferentes costu-
tumes. E, o trabalho deles dia e noite também impossibilitava o surgi-
mento dessa sociedade.
Aos poucos foram surgindo às reivindicações, a principál como es-
perava, decorria do traçado da estrada de ferro, motivo de galhofa dos
turistas quando visitavam Encarnação. O Prefeito Municipal deixara de ser seu figadal inimigo polítco, não deixando porém de cobrar a execu-
ção do pedido que fizera quando da campanha e até aquele momento não realizado. Depois os produtores de leite, classe que Nico pertencia,
reclamavam a formação da cooperativa de laticínio, que dependia mais
do Estado, exatamente da Secretaria de que fora titular, do que da esfera federal. As estradas vicinais, que permitiriam maior entrosamen-
to com os municípios próximos. Finalmente, os pedidos de cargos nos serviços públicos, mesmo que fosse em Brasília.
Inegavelmente Nico conseguira iludir durante a campanha vários
eleitores, conquitara com suas palavras indistintamente à periferia da
sua cidade e a inteligência perpicaz dos velhos políticos da localidade,
que agora cobravam. Como conseguira enganar tanta gente ao mesmo tempo? Presentemente estava numa posição de relevo, teria de satisfazer as promessas, ainda que nem todas.
A golfada da fumaça do charuto não mais arrepiava os circunstan-
tes, que dela se refugiavam ou mantinham distância, nem tão pouco o
desviar dos olhos de Nico impedia que as pessoas o enfrentassem. Ele
não tinha como fugir aos pedidos, os enfrentou, não com cartões de apresentação, tão comuns em outras épocas, mas sim assinando ato formal pelo qual assegurava que atenderia todos os pedidos e as solici-
tações seriam encaminhadas politicamente às autoridades competen-
tes
Na fazenda encontrou uma grande melhoria e em franco desenvol-
vimento, o lucro que tivera sobressaia nos diferentes aspectos,o admi-
nistrador que ficara à frente estava por merecer uma melhor participa-
ção nos resultados. A ida para o Senado e já agora para Brasília, nesse
particular fora benéfica.
Conversou demoradamente e em diferentes momentos com sua mu-
lher, Aurora, e a filha Joana, expondo que a ida das duas para o Distri-
to Federal seria salutar, porque mudariam de ares e a Capital prospera- ria rapidamente, além do mais contaria com o apoio ambas na sua per-
manência. Forçosamente teriam, a princípio, que irem para o hotel, que
guardava excelentes acomodações e o convívio com as mulheres dos
parlamentares tornar-se-ia instantâneo. De nada valeram as podera-
ções,mãe e filha estavam irredutíveis,preferiam permanecer em Encar-
nação e vez por outra iriam ao Rio para a casa em Botafogo.
Retornou ao Rio de Janeiro, providenciou o que prometera em seu
município, resolveu definitivamente a situação de Adelaide, que não se
adaptar no Superior Tribunal Militar e, por isso mesmo, retornara ao an-
tigo Senado. O Senador fimara que ela deveria estar em Brasília dentro
de dois meses, porque era imprescindível que ficasse à frente de seu gabinete.
Escolheu o "Eletra" da Varig porque o avião sairia do Aeroporto
Santos Dumont mais perto do Senado, na Cinelândia. Chegando à no-
va Capital deparou-se com o problema de sempre, falta de transporte
para o Brasília Palace Hotel, conseguindo de imediato a condução de
um deputado do norte, que estava chegando e se dirigia ao mesmo ho-
tel.Na conversa ele lhe comunicou que o Hotel Nacional já estava pron-
to, faltava apenas ser firmado o contrato com o Congresso para que os
congressistas que quisessem mudarem. Obediente à sua filosofia de vida achou ótimo. Quando o avição sobrevoava Brasília, teve uma sensação diferente, era noite e as luzes queiluminavam a cidade transparecia verdadeiro oásis naquele "deserto verde", sentia-se protegido,compenetrou-se que a esplendorosa Capital,sitiada nos con-
fins do interior do País,progrediria com o povoamento do agreste.Criou
alma nova e conversando com o deputado dentro do carro, trocaram
idéias e fez transparecer seus pensamentos, recebendo em troca o apoio do parlamentar nordestino, que lhe transmitiu a confiança de seu
povo na interiorização o Brasil.
No hotel recebeu mais uma notícia alvissareira, todos os senadores
receberiam no decorrer da semana automóveis com os respectivos mo-
toristas. Os veículos se encontravam na concessionária, fazendo revi-
são, porque vieram pela estrada, de São Paulo, eram idênticos, na cor
preta.
Aguardava apenas a chegada de Adelaide, mas mesmo sem ela não
deixava de dar andamento nos processos a sí distribuidos na Comissão
de Finanças.Não se sentia tão assediado como no Rio,poucos o procu-
ravam, quase sempre os próprios deputados, interessados recursos pa-
ra seus Estados de origem,vez por outra aparecia um Prefeito ou Ve-
reador, que antes de comentar os motivos de suas presenças, falavam
do temor da viagem que sentiram no avião. Hospedavam-se na Cidade
Livre e faziam-se entender que o retorno a aquela cidade não era fácil,
pela falta de condução, o Senador desconversava porque ainda não
dispunha de carro, sugeria que fossem para o estacionamento de veí-
culos, pois alí sempre apareciam carros,jamais os convidou para jantar.
Dois grandes acontecimentos ocorreram naquela semana, a chega-
da de Adelaide, que ficou hospedada provisoriamente no Brasília Palace
Hotel e a entrega do veículo Ford a ele destinado com o motorista.Tu-
do parecia se encaminhar satisfatoriamente, daí para frente poderia
exercer os encargos normais de Senador, dificultado apenas pela au-
sencia da estrutura principal e de apoio,que permaneciam no Rio de Ja-
neiro. Dispondo de condução, o Senador Assunção aproveitou para me-
lhor conhecer as obras que estavam em construção e as cidades chamadas satélites,bem assim Luziânia,que achou pitoresca e guardava
semelhança com Encarnação.
O Hotel Nacional já estava pronto, os móveis completos e selecio-
nava diversas pessoas para serem seus serviçais. Os turistas sempre se hospedavam no novo hotel, conduzidos pelas empresas de turismo.
Apesar das ótimas acomodações no Brasília Palace Hotel,onde fica-
ra durante vários meses, não via a hora de transferir-se, por todos os
motivos, proximidade, luxuoso bar, salão de refeições bem instalado e
uma boite chamada Tendinha. Apenas não sabia como resolveria a situação de Adelaide, que convivia com ele dia e noite, gerando a inconveniência das bisbilhotices e alcoviteiros. Mas, precisava ter maior
liberdade, se sentia amarrado, identico como quando estava com sua
mulher Aurora.
Enfim mudou-se para o Hotel Nacional, com sua influência conse-
guiu um apartamento de frente, que dava para o trânsito de entrada dos veículos. Dalí poderia desfrutar de todo movimento do hotel.Voltou
a lembrar em chamar sua mulher e a filha, refletiu da inconveniência da
presença das duas.
Alguns apartamentos construidos pelo governo estavam prontos,
seriam destinados ao pessoal do executivo que ainda se encontrava no Rio; movimentou-se e conseguiu um para Adelaide, pois o Senado
não poderia arcar com as despesas de hospedagens de pessoal subal-
terno naquelas condições de hotel.
Com a mudança para o Hotel Nacional sua rotina habitual mudou
completamente, só avistava Adelaide no trabalho, ela afastara-se do
Senador, preferia ficar no apartamento ou visitar colegas e amigas do
Senado.
Por outro lado, o Senador Assunção passou a conviver mais com
os parlamentares, fazia as refeições geralmente no restaurante do ho-
tel e a noite, ou se recolhia cedo no apartamento, ou ia a boite Tendi-
nha. Alí quase sempre a freqüência se restringia às mesmas pessoas,di-
ficilmente se encontrava um turista ou vizitante da cidade, que vinham
à Brasília tratar de negócios ou fazer articulação política. Outra forma de evitar os dias fastidiosos consistia em circular por fora do hotel ad-mirando as vitrines das lojas alí localizadas. Isso tudo causava imensa
solidão, o que propiciou enamorar-se da camareira, nordestina atraen-
te, morena de olhos amendoados azuis, possuidora de esbelto corpo,
pernambucana de origem holandesa, Eudilesa tinha vivência, escolada, passara por diversos serviços, principalmente em hoteis do norte e nor-
deste. Falava muito pouco, preferia ouvir, só depois é que se manifestava,mas não fugia aos galanteios do Senador.Tinha em um re-
cepcionista do hotel sua verdadeira paixão, todos os empregados sabiam dessa afeição. Certa noite o Senador Nicomedes telefonou à recepção solicitando que a camareira viesse ao seu apartamento, trazendo novas toalhas de banho e de rosto para substituir as então usadas. Edileusa desconfiou do pedido, pois trocara todas aquelas peças, logo após o banho matinal, por isso mesmo previnira-se levando
consigo uma "peixeira". Ao chegar, tentou entregar o pedido na porta,
porém Assunção a fez entrar, sob o pretexto de que o banheiro estava
molhado e precisava ser enxuto. Nico não se conteve em incontido ânimo, agarrou-a pelo corpo, tentando beijá-la, com destreza lançou-a
sobre a cama, subjugando com sua força, tentava desnudá-la. De ime-
diato, a rapariga sacou da faca que trazia e investiu sobre ele,que pro-
curava se defender como podia. Os gritos foram ouvidos até na pista
que dava acesso aos veículos, formou-se uma aglomeração na parte térrea do hotel, todos curiosos em saber o que se passava. E, a cama-
reira gritava "eu te mato", tu não me amedrontas, nem como Senador e
muito menos pela força. Nico lembrou-se dos velhos tempos em Encar-
nação, tomou a iniciativa de contornar a situação, nada adiantava, Edileusa se mostrva intransigente. Evitando maior desmoralização pro-
pos-lhe dar uma gratificação, ela revidou: só se for cem mil cruzeiros;
detrás da cortina da janela que dava para via de trânsito, dizia mais se tu não deres, saio porta afora gritando por socorro, anunciando que o Senador querias me pegar à força. Nico propôs uma redução,que
para ele seria razoável, vou dar-lhe 10 mil cruzeiros para não mais aqui
aparecer. Ela achou pouco, renovou a ameaça dizendo que pediria socorro ao recepcionista, seu namorado oficial. Um valor de permeio,
prometeu Nico, 30 mil cruzeiros, solucionaria o impasse, embora o es- cândalo tivesse grave repercussão, verdadeiro trauma ao astuto e imprudente político.
No dia seguinte todo Congresso só comentava o aconteimento,que
se espalhou por toda Brasília. Adelaide começou a trabalhar cedo, mes-
mo sabendo do ocorrido evitou comentar, conhecia bem Nico de sua
terra natal, não foi o primeiro e acreditava não ser o último inconveni-
ente procedimento.
O Senador procurou ofusvar o sucedido fato e quando um ou outro
colega mais íntimo comentava, dissimulava, fazendo crer que se trata-
va de uma nordestina doente mental, capaz de ousadias maiores.
A VINGANÇA DE FRANCISQUINHO.
As sessões no Senado Federal transcorriam monótonas com um nú-
mero insignificantes de Senadores, presidida geralmente pelo primeiro
secretário, em face da ausência constante do Presidente e Vice-Presi-
dente, que se não permaneciam no Rio de Janeiro, diligenciando o remanescente mudança, aguardavam em seus Estados a definição do
deslocamento definitivo da Câmara alta do País.
O Senador Assunção permanecia quase sempre em seu improvisa- do gabinete, abatido com os útimos acontecimentos no hotel, recorda-
va-se da luta que tivera com o "Homem Macaco". Na sala contígua, es-
paçosa, permanecia Adelaide, sua secretária, e mais três funcionários e um contino. Na outra ao lado ficavam duas datilografas e uma aten-
dente, recentemente contratadas, via recambolesca seleção que fora feita. O som não havia sido instalado e nem se retransmitiam os acon-
tecimentos no plenário, local em que pouco Assunção comparecia. Res-
tava para eleexaminar os projetos da Comissão de Finanças, de que era membro e repetidamente relator.
Tomou conhecimento, através de comunicação telefônica feita por
Iracema, que Francisquinho estava em Brasília, diga-se a propósito, Dr.
Francisco Sampaio de Souza, emérito engenheiro calculista,requestado pelo seu valor profissional. O Dr.Francisco gozava de grande prestígio, não só graças aos méritos pelo dinamismo que impunha na execução dos serviços a sí afetos. A companhia construtora que o contratara,se
via desfalcada quase sempre dos seus trabalhos, em face das constan-
tes solicitações para analisar projetos de cálculos ou mesmo execuções
decorrentes. Ele não tinha tempo para atender a todos, cumulava pro-
jetar, calcular, avaliar, conferir execuções e apresentar aos desenhis-
tas os esboços e plantas arquitetônicas.Sabia que o Professor PI esta-
va na Capital, mas a falta de tempo lhe impedia de ir ao seu encontro.
Como sempre fora o principal sentimento de vindita, aquilo lhe ator-
mentava como uma dor pungente. Desde Encarnação, jurou represália pelo ato desrespeitoso que o professor cometera em sua casa,abusan-
do de sua mãe. O castigo estava próximo a acontecer, Francisquinho
não poderia ´perder a oportunidade de submeter Nico, agora Senador da República, a violento constrangimento. que por certo chegaria a via
de fatos, surrando S. Excelência à frente de quem estivesse presente.
Num dia livre dos grandes afazeres foi ao encontro do Senador, presumindo encontra-lo no Brasília Palace Hotel, sendo informado que ele se mudara para o novo Hotel Nacional. Não conseguia controlar os
nervos, o coração acelerado obstruia seu raciocínio, só havia um pen-
samento, enfim chegara o dia da vingança. Estava na hora do almoço,
o que facilitaria encontrar o Professor PI ou Nico para a maioria dos ha-
bitantes de sua Encarnação. Dirigiu-se rápido para o Hotel Nacional; poucos eram os empregados e hospedes no salão de entrada, foi à re-
cepção e aí perguntou pelo Senador Nicomedes Campos de Assunção,
sendo informado que estava no restaurante com outros parlamentares
e uma comitiva que chegra de sua terra, inclusive um padre.
Não levaram em consideração aos seus trajes, próprios de enge-
nheiro de obras, muito comum à época. O "Maitre" do restaurante foi ao seu encontro dispondo-se a indicar uma das mesas do salão, nem
notou o descontrole emocional vivido pelo engenheiro, que correu os
olhos nas mesas e localizou Nico. Francisquinho não perdeu tempo par-
tiu em direção ao Senador e de imediato gritou: "LEVANTA DAÍ SEU CRÁPULA PARA APANHAR EM PÉ"! Surpreso os circunstantes deixaram de reagir, apenas diziam o senhor está falando com um Senador. A res-
posta de Francisco não demorou, esse sujeito é um canalha, desregado, não é homem, e sim um imbecil, desrespeitador, um cimino-
so, em seguida deu-lhe dois bofetões na cara e violento soco nos lá-
bios e narinas, que começaram a sangrar. Nico tentou puxar de um re-
volver que trazia na cartucheira presa ao cinto, levou violento ponta-pé de Franquinho, que treinara jiu-jitsu, jogando-lhe ao chão, sem po- der mais apanhar a arma. Acorreram ao local os garçons e outros em-
pregados da portaria e o recepcionista, namorado da camareira, que a-
cirrava os ânimos, dizendo em altos brados este moço fez o que eu de-
veria ter feito dias atrás. Não havia polícia, nem segurança no local, a-
contecimento como aquele nunca imaginaram que ocorreria em Brasília.
Terminava de forma melancólica a carreira do venturoso PROFESSOR PI,de trsite memória, pela impudência, violência e autoritarismo, que marcaram toda sua vida. Fora sempre, inadvertidamente, escolhido,
mercê da bondade do povo que acreditava nas suas bravatas e golpes, para representá-lo em diferentes conjunturas.
(REGISTRADO NA FUNDAÇÃO DA BIBLIOTECA NACIONAL-Nº 410.106)
DO LIVRO 765 - FOLHA 266.