Sorte? Acaso? Milagre? Deus?

Não sei explicar o que houve comigo naquela manhã... mas eu saí vivo daquele carro. (esses são os óculos que estavam em meu rosto na hora do acidente.)

Desde criança eu sempre me imaginei morrendo num acidente de carro. Não sei se foi toda minha paixão por fórmula 1, que me mostrou cedo o seu lado de morte, ou por todas as músicas dos Beatles que falam em morte em acidente de carro. Mas sei que não era minha hora. Não dessa vez.

Naquela manhã eu saí com pressa pra ir a Pinhal. Meu pai já me esperava lá com o churrasco no fogo. No quilômetro 50 da RS-040 eu lembrei duma coisa que o Felipe disse indo pra Buenos Aires: “No carro da tua mãe dava pra ir a 180 por essa estrada”. Como eu estava numa reta e não havia ninguém indo nem vindo resolvi acelerar um pouco mais. Estava bem rápido. Numa cena de início de filme trágico, um pássaro entra pelo vidro do carro, o do meu lado (estava com os dois vidros abertos), e cai, se debatendo, em meu colo. No susto, tentei tirá-lo. Quando me dei por conta, o carro estava com as rodas da direita no acostamento. Ao tentar voltar, o carro saiu derrapando pela pista em alta velocidade. O pneu furou e a barra de direção quebrou. Pra onde eu virava o carro não ia, eu não conseguia por de volta na pista. Saí na pista contrária, fui no outro acostamento, voltei, desesperado... não havia mais o que fazer. O carro girou de traseira e foi saindo na direção das árvores, pelo meu lado. Quando vi que eu ia saindo pra uma colisão muito forte devida minha velocidade, eu fiz o que eu pude, ou seja, gritei, pedindo pra não morrer naquela hora. Ninguém ia me ouvir mesmo... Eu tinha certeza que ia morrer, só pensei que não queria morrer naquela hora. Só o que lembro.

O carro saiu da pista e bateu numa ribanceira. Capotou duas vezes e foi parar, em pé, longe da estrada, completamente destruído. Eu só torcia pro carro parar de capotar e o mundo parar de girar, enquanto os vidros estoravam na minha cara e o teto ia amassando. Muito barulho. Muito impacto. Senti que era como sonhar, agora o esforço pra lembrar é só vontade de esquecer. Quando tudo parou eu não acreditava que eu estava inteiro. Desci do carro e um pessoal que estava ao redor veio me socorrer. Tinha muita sujeira em meus olhos, meu corpo estava coberto de barro. Quem viu o acidente não acreditava que eu estava vivo. Quem viu o carro também não. Minhas coisas se espalharam pelo que sobrou da parte interna do carro. Havia muita areia e plantas lá dentro. Achei minha chave pendurada no vidro e minha carteira na ribanceira. Chamaram a univias pra mim e eu liguei pros meus pais. Eu só tinha alguns cortes no braço esquerdo.

A ambulância veio e limpou meus olhos. O pessoal da univias disse que raramente viu uma capotagem não terminar em óbito. Disseram que minha sorte foi que eu saí da pista no único ponto que não havia árvores (bater numa árvore naquela velocidade seria realmente o fim) e que minha primeira capotagem foi no lodo da ribanceira. Isso sem contar o fato da sorte de não haver ninguém no sentido contrário, pois eu rodei nas duas pistas, e o cinto ter me segurado ao banco o tempo todo, enquanto eu me segurava na direção pedindo somente pra que o carro parasse de girar.

É.. dessa vez eu escapei. Quando falam que não se deve passar de 80 parece bobagem, na hora o cara acha que se garante, que não vai acontecer nada. É, isso até entrar um pássaro no seu carro, ou algo menos incomum. Muitos me dizem que foi deus. Um aviso. Mas foi deus que pos o pássaro ali também? Eu sigo incrédulo, porém, sempre que eu lembro do acidente e do estado do carro eu não entendo como eu saí vivo. Nunca vou entender.

...

Mas eu escapei... assim como o Grêmio. Foi o sábado dos improváveis. Parabéns pela garra, mas eu volto a secar e odiar vocês na primeira divisão ano que vem. Nunca se esqueçam, foi só a série B, não vão achando que estão com um grande time. Mas foi bonito.

A vida segue. Ou melhor, a vida começou de novo. Será que muitos iriam chorar por mim no fim-de-semana? Muitos estariam na praia, sem nem se preocupar com nada. Muitos se preocuparam comigo, ao ponto de querer ir pra Pinhal. É hora de repensar, muita coisa está errada na minha vida, mas se eu consigo escapar dum acidente assim é possível reverter qualquer coisa.

E praqueles que não me querem mais por aí, pelo jeito eu não morro tão fácil. I´ll gonna live forever...

E se um dia eu realmente morrer num acidente de carro e numa quarta-feira, lembrem-se que alguma coisa estava escrita em algum lugar do tempo, e não caberá a nós mudarmos nada... mais nada importa agora...

- Obrigado por estar vivo...

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Publicado em 28/11/2005

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Fábio Grehs
Enviado por Fábio Grehs em 06/06/2007
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