Minha presidência
Fui presidente sim. E aos dez anos. Só não boto na biografia porque não me lembro mais do nome que demos ao Clube de Leitura. Tampouco me recorda se foi eleição limpa, de bico de pena, consenso, ou sugestão da professora Aparecida Fornero. O mandato era curto, seis meses. Ou já era o segundo semestre daquele terceiro ano primário e dali pra frente tudo - bem antes do Roberto Carlos - iria ser diferente.
Tou mais inclinado a ficar na sugestão da mestra. Afinal, éramos todos novatos nesse negócio de eleição - ainda que já se pudesse constatar alguma tendência à prematura ereção. Da biblioteca, é bom que se esclareça, pois carecia a mesma tanto de obras quanto do lugar para botá-las. Teríamos lá uma dúzia de livros didáticos, e quem sabe alguma revista de instrução, mal acomodados num arremedo de estante-armário. E me cabia presidir tudo aquilo. Honra em arrobas, ou a quilo?
Agora, por quê eu? Minhas recordações retroativas (e pleonásticas) não são conclusivas. Terei ainda a oportunidade de rever e reaver com os colegas de bancos escolares essas lembranças tão luminares?
O que me vem, contudo, são flashes, nada além. O Péricles, irmão de Dona Aparecida, se escolhido, ficaria muito ostensivo, ainda que fosse bom aluno. As meninas já eram, na média, bem mais adiantandas, mais bem comportadas, mais perfumadas e mais fadas do que os meninos, mas ficava sem graça ter uma presidenta, não pela falta de escolha.
Carecia buscar um primeiro presidente, que vestisse calças - ainda que as minhas fossem curtas, e sem ter a ver o u com as alças, as minhas notas eram boas. E vai ver que eu tinha a cara presidenciável. E boa leitura. Pelo menos foi o que fiz no discurso de abertura, escrito pela mana La Toya, uma jóia.