Uma crônica sobre a crônica
Deu-me vontade de escrever uma crônica. A crônica é assim mesmo. Quem me lê sabe exatamente a que estou me referindo. A gente vai procurando, procurando e .... de repente, aparece um tema na ponta da língua. É só passar para o papel, ou melhor, para o computador. Na verdade, não precisamos estar à procura de um tema; eles estão em toda parte. A vida nos fornece uma série infindável de temas e assuntos para se escrever a respeito.
É como a poesia, o conto e, talvez, o romance. A única diferença é que, não sendo ficção, a crônica já vem pronta em nossa cabeça. Já sabemos direitinho sobre o que queremos falar. O conto ou o romance, não. Temos apenas a ideia do assunto, do tema, mas a forma vai se desenvolvendo à medida que as palavras vão fluindo para as pontas dos dedos.
Não é necessária a inspiração para se escrever uma crônica. É preciso, sim, indignação, revolta, incompreensão, observação do que se passa a nossa volta. Penso que, como escritores, sem que queiramos, ficamos ligados o tempo todo no que ocorre no mundo. Quando iniciei a escritura de crônicas, tornei-me mais observador; muito mais do que já era antes.
Sempre fui apaixonado pela ficção.
Os textos de ficção vão se formando em nossa mente, na alma mesmo, à medida que os dias, as semanas e até os meses vão passando. Não existe um tempo definido para amadurecer um texto de ficção. É até bom que o deixemos de molho para que seja moldado e, descendo para o teclado, faça surgir uma obra que valha a pena ser lida; vale o tempo, mesmo que seja longa.
Não cansa o leitor porque quem a escreveu sabe o timing exato que fará mexer com a sensibilidade de quem está lendo. Ele foi maturado, pensado e repensado; tudo isso sem esforço, naturalmente. O esforço vem no ato de escrevê-lo, moldá-lo na fôrma e na forma que vai agradar.
Com a crônica é diferente. Tenho sentido isto. Li, de uma cronista, aqui no blog, que escrever crônicas pode se tornar um caso crônico. E tenho percebido que é isso mesmo. Não consigo deixar mais de levar para o teclado um texto de crônica. Quem disse que a crônica é um gênero menor da literatura acho que o fez equivocado. Grandes mestres da literatura fizeram fama e dinheiro graças à crônica.
O próprio Carlos Drumond de Andrade foi um excelente cronista. E isto, nem de longe anuviou sua inspiração para a poesia, gênero em que se destacou. Quem gosta da vida, do movimento, quem quer opinar, mudar o mundo,(por que não?) Não deve deixar de praticar esse gênero literário. Considero-me um ficcionista, mas, tenho na crônica, a ferramenta para me auxiliar a ser um formador de opinião. Disse outro escritor, cujo nome não me ocorre agora quando lhe perguntaram o que vem a ser a crônica, que crônica é aquilo que o leitor quiser chamar de crônica. Ele que me desculpe, mas, com todo o respeito, não concordo com isto.
Escrever por escrever, fatos que pouco vão interessar o leitor e chamar isto de crônica é fugir de ser um bom cronista. É preciso esmiuçar, opinar, criticar e, sobretudo, informar sem ser didático; penso que esta é a função da crônica.
Então, extravase seus sentimentos criando e recriando crônicas que falem da vida, de um modo que acrescente. Opine, escreva sobre o que vier a sua cabeça; fale desta cadeira que está aí a sua frente; explique como se faz o leite condensado ou como o nosso país pode sair da crise. Mas, sobretudo, informe, divertindo e opine, aceitando opiniões alheias.
Penso que assim deve se portar um bom cronista. Mas quando a ideia vier, transcreva-a imediatamente para a sua tela. Não a deixe maturar como o texto de ficção. Ela tem que ser instantânea para que não perca a magia de impactar. A vida é dinâmica e dinâmico precisa ser o cronista.