NO SILÊNCIO DAS PALAVRAS

Se não lhe permitissem a fala, Sócrates não seria Sócrates. Platão não embalaria seus ideais a partir de Sócrates e, quem sabe, não haveria nem Aristóteles. Assim é, uma vez que não há nada sem as vozes, nada exceto o silêncio. Também não digo que ele não seja válido na dimensão de um pensamento, pois há muito que se ouvir por lá, basta ficar atento. Contudo, sem os compositores, as notas, os músicos e os instrumentos, não haveria maneira de se executar uma sinfonia, por exemplo. É preciso ouvir, ouvir e ouvir. Para depois compor, recompor-se e fazer-se organizar nos sons, nas vozes, nos tons e nas melodias que há tempos estão falando dentro de cada um de nós e precisam ser completadas, como a música também precisa ser.

A leitura de grandes autores da literatura – tais como os musicistas espirituosos (penso) o faziam quanto ouviam e inspiravam-se ao deixar entoar seus gênios anteriores e interiores – é o que nos faz caminhar em direção à completude e autenticação da obra como existente. Sim, ela só existe se lhe emprestarmos os olhos e a voz. Sem nós, ouvintes e leitores, certamente, não poderia haver música, nem texto, nem ideia velha ou nova, nem ao menos filosofia, haveria. O que restaria seria apenas um vazio enorme que o tempo e a inércia se encarregariam de levar para fora do mundo. Para o triste deserto sem cor, sem música e calado, até a extinção.

Minha fala aqui parece um tanto alegórica. Sim, este foi o meio que encontrei – pelo menos para este fim – tudo para tentar o leitor a ser mais do que um leitor, ser um ouvinte. Digo isso, compartilhando algumas de minhas impressões, para pedir ao amigo que leia em voz alta a ponto de ouvir-se e de ouvir os autores, nem que seja na voz interior do próprio silêncio. Sabem, ao andar pelos corredores de uma biblioteca, sinto-me – acreditem – semelhante ao um esquizofrênico por conta disso, eles me falam, pois dei-lhes ouvidos.

Mas para não me delongar mais, termino esse meu texto de inquietudes, com um pedido, um favor ao amigo que não me abandonou nas linhas e chegou até aqui: peço para que tirem os tampões dos ouvidos, leiam, ouçam as canções, afinem-se e, se assim desejarem, entoem novas melodias que certamente deverão ser ouvidas por outros Ulysses. As sereias chamam...

Dilso Santos
Enviado por Dilso Santos em 21/02/2015
Código do texto: T5144494
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