O Gari

Zizito era aquele tipo raro de gari que tinha verdadeiro orgulho do seu ofício, pois diferente de muitos políticos que andam lá pelas bandas de Brasília, ele nunca varrera nenhuma sujeira pra debaixo do tapete.

De fato, com Zizito as ruas estavam sempre limpinhas e uma de suas principais atividades consistia em limpar toda aquela sujeira que os candidatos porcalhões faziam em véspera de eleição.

Indignado, o gari vira mais de uma vez, um idoso ou outros, escorregarem naqueles santinhos cobrindo o chão.

Zizito definitivamente não gostava dos políticos e costuma dizer para os colegas e até para sua namorada Marliete _ uma lavadeira de coxas grossas, peitos opulentos e língua afiada _ assim: “político quando põe olho-grande pra cima do dinheiro do povo, não tem cofre forte que guarde”.

Certo dia, o seu Tico do boteco abriu os olhos do varredor de rua:

_ Escuta, Zizito, eu sei que tu não gosta de política, mas bem que tu podia entrar pro nosso partido e se candidatar a vereador.

_ Ei, mas não é que a cachaça derreteu os seus miolos de vez, Tico!

_ Presta atenção, ó homem! _ redarguiu o outro _ Tu é membro ativo da comunidade e bastante popular aqui no moro. Se tu ganha, eu vou ser seu assessor. Que tal?

_ Não sei.

_ Ollha, Zizito, as coisas só vão começar a mudar de verdade nesse país, no dia em que a gente começar a colocar gente honesta na política.

Algo incrédulo a princípio, o varredor de rua acabou aderindo ao projeto, sendo eleito como um dos candidatos mais votados do Rio de Janeiro, graças ao slogan nada original, da vassourinha do gari limpando a corrupção da Câmara.

O candidato fora econômico com sua distribuição de santinhos; não queria ver a cidade maravilhosa enxovalhada de papéis.

Zizito deu lugar ao vereador Zelão Egídio. O homem agora calça sapatos finos, trajado de terno e gravata, só anda de carrão importado pra baixo e pra cima.

Na tentativa de romper de vez com o seu passado, o ex-varredor de rua dispensou a ignorante lavadeira de língua afiada para casar-se com uma moça bem-educada, vinda de família abastada. Contudo, não se esquecera do trato de fazer do Tico do boteco, seu mais bem-pago assessor.

Enquanto muitos desconhecidos aplaudiram a ascensão do gari, os antigos amigos lá do morro lamentam a morte do velho Zizito.