LEITURA É MAGIA E ENCANTAMENTO

A alegria se inaugura no coração dos escreventes que têm o privilégio de ter olhos leitores perspicazes pousados nos seus escritos. Há uma teia que une autor e leitor. Uma antahkarana mágica de palavras que os envolve e traz uma brisa, um sopro a segredar que a vida ainda vale a pena.

Poetas, escritores, leitores, todos se alimentam desses trigais da palavra que se balançam pelas campinas da literatura. E ondulam almas e corações. Ora tristeza, ora solidão. Ora encontro, ora desencontro. Mas sempre magia. Descoberta. E encanto.

Há um momento em que a palavra nos alumbra e nos preenche. É o momento singular da fruição sagrada. O momento solitário da leitura. E, ao mesmo tempo, solidário com o autor, com as personagens, com as situações descritas. É o momento de conhecer ideias novas, pensamentos divergentes ou similares ao nosso. É a hora de se identificar e de se perceber o quão iguais ou o quão diferentes e singulares todos nós somos. É a vez de fruir emoções e de se encantar com o belo. E também se aventurar.

Na leitura, viajamos para lugares nunca visitados. Países longínquos, para a terra dos sonhos proibidos. Visitamos cenários nunca dantes imaginados, como as Cidades Invisíveis, de Calvino; a Shambhala, dos Budas; a Shangri-La, de James Hilton; a Pasárgada, de Bandeira; a Avalon, de Marion Zimmer Bradley; a Terra Média, de Tolkien; a Lilipute, de Jonathan Swift; a Utopia, de Thomas More; Nárnia, de C.S.Lewis; Bruzundangas, de Lima Barreto; a Macondo, de García Marquez; a Terra de Oz, de L. Frank Baum; Gotham City, Bedrock , Bangalla, Patópolis e a Mata do Fundão, do mundo dos quadrinhos. Ir junto com Alice ao país dos espelhos, de Lewis Carroll, e a tantas outras terras mágicas que instigam a nossa imaginação.

Então, ler é conhecer mundos próximos e mundos distantes. É dialogar com os autores. Imaginar-se na pele das personagens que nos encantam. Beijar com os lábios da imaginação aquele mocinho ou aquela mocinha que tanto amamos. Engravidar-se de emoções profundas que fazem nascer sentimentos paradoxais, contraditórios, alegres, tristes, felizes, infelizes. Sentir-se de muitos jeitos, mas nunca indiferentes.

Ler é trilhar veredas de grandes sertões. Irrigar com lágrimas tantas vidas secas. Sentir-se um grande rei ou um pequeno príncipe, ser bruxa ou fada, princesa ou rainha de reinos encantados. É roubar o sorriso das estrelas e distribuir ternuras aos quatro ventos. É encontrar o paraíso perdido, a Atlântida, a ilha misteriosa do tesouro. Sentir na face o vento dos morros uivantes. É ser um argonauta e viajar pelos sete mares, explorar a Terra do Nunca, e dar a volta ao mundo em poucas páginas de distância.

Ser letrado é uma magia. Escrever a própria história e inventar novos mundos é um privilégio. É como o gesto de afagar cada palavra que vai se emendando uma à outra e depois a mais outra, num cordão mágico a mapear as veredas. Como o fio de Ariadne nos dizendo que há, sim, uma trilha que pode seguir sempre em frente. E que não se precisa ter medo de olhar para trás. Que a volta será sempre por cima, nas trilhas da emoção. Pelos caminhos de poemas, crônicas, ensaios, contos, novelas ou romances. E tantos outros escritos que desfilam na passarela dos diversos gêneros. Um haicai, um poetrix, uma trova, um soneto ou um rondel. Cada gênero a ser fruído como favo de mel.

Escrever é magia. Ler é encanto. Reler é o paraíso. Sejamos o pássaro de voo longo, asas compridas e fortes para elevar os sonhos para além do horizonte da mesmice. Sejamos cúmplices do momento breve que se esvai no voo leve da palavra. No instante mágico do verso que tem a medida exata das emoções e dos mais secretos sentimentos. Deixemo-nos ser arrastados no caudal de uma prosa cadenciada, que nos leva pelos caminhos da aventura a nos lançar desafios a cada nova página de um livro. Não um livro qualquer. Mas aquele livro que nos escolheu para ser lido. Ou para nos ler. Porque os livros também conhecem um bom leitor. Eles se alegram com aqueles que os cheiram, que os tocam com cuidado, aqueles que os acariciam. Pois os livros sabem que um bom leitor sente o perfume de cada palavra, o seu peso e a sua cor. Ele sabe escutar e dialogar com o silêncio eloquente que emerge de cada página folheada.

Ali, juntos. O autor, o livro, o leitor. Em casa, numa escola, numa biblioteca ou sob uma árvore. Não importa o lugar. Há uma tríade que compartilha o momento mágico da leitura. Quando as personagens ganham vida, os cenários se desenham na imaginação do leitor, a história vai se desenrolando pouco a pouco. É quando o poema, em silêncio, descortina o véu da beleza e da emoção. E, de mansinho, vem fazer morada dentro de cada um. No leitor, a obra se completa. E se inaugura uma cumplicidade a se estender para além dos olhos. Porque a boa leitura se faz com a alma. Mas também com o coração.

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(dedico a Bernard Gontier, pois a ideia dessa crônica nasceu de um comentário que fiz a um texto de sua autoria sobre uma outra cronista, Lysit...)

José de Castro
Enviado por José de Castro em 12/02/2015
Reeditado em 12/02/2015
Código do texto: T5134358
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