O Beijo
Esta noite eu e Lenora nos beijamos. Em sonho. Quase quarenta anos desde a última vez que nos vimos. Difícil acreditar, mas nunca havíamos nos beijado na vida real.
Lenora sempre foi meu grande amor não resolvido. Nossa sintonia era total. No frescor de nossa juventude falávamos de literatura, política, gente, sexo e tudo mais. Jamais tivemos um relacionamento que incluísse beijos, abraços, muito menos sexo. Ela tinha seus namorados e eu as minhas. Demonstrávamos ciúme apenas quando um abandonava o outro e se envolvia em outra roda de conversa. Estranho, mas verdade.
Muitas vezes, muitas mesmo, caminhamos de mãos dadas, na chuva. Dizíamos que era para lavar o corpo e a alma. Ela observava o mundo com uma lente própria. Como alguém pode ser sábia aos dezoito anos? Ela era.
Um dia disse conhecer um lugar mágico, mas que as pessoas não notavam. Fomos até os fundos do Museu de Arte Moderna (MAM) que se abre para o mar. Sentamos na mureta e ela disse: “ de frente para o mar e de costas para o mundo”. Sempre que pude voltei lá na esperança de, talvez, encontrá-la. Isso nunca aconteceu.
Fizemos vestibular e ela entrou na Faculdade de Psicologia. Pensava em ajudar pessoas. Eu pensava em fazer pesquisas na área de Biologia. Começava o nosso descaminho.
Encontrei-a determinada vez, por acaso, e disse-lhe da proximidade de meu casamento. Ela disse que não iria. Nem queria saber quando e onde. Fiquei sem saber o que responder. Beijou-me o rosto e sumiu, exceto de minha mente.
Com certeza, Lenora ficou nas esquinas de minhas memórias. Lembrei-me de quando passeávamos pelo centro da cidade e encontrávamos o poeta de rua, Gilson. Ele escrevia com giz. Dizia que a poesia era fugaz. Ela anotou algumas delas e ilustrou com desenhos surreais. Presenteou-me com alguns. Eu idiota que sou, os perdi.
Conhecemos também, o “profeta” Gentileza. Não gostamos dele. Dizíamos que ele era o “Antônio Conselheiro do asfalto”. Na verdade era um homem que dizia ter sofrido uma epifania levando-o abandonar tudo e se dedicar a Deus e obras edificantes, isso aconteceu após o incêndio do circo em Niterói em 1961. Tornou-se um fanático religioso.
Passamos um único carnaval juntos. Ela com uma fantasia improvisada de havaiana e eu apenas de bermuda e chinelos. Nunca mais deixei de reviver aquilo. Foi mágico. Cantamos, pulamos, suamos, seguindo um bloco de rua. Foi maravilhoso. O carnaval passou a ser de nós dois. Para sempre.
Hoje depois de tanto tempo, filhos, neto em breve, achei que havia resolvido esta paixão. Engano total e absoluto. Agora, não só lembro-me de sua imagem e perfume, como também senti o seu gosto.
Esta noite eu e Lenora nos beijamos. Em sonho. Quase quarenta anos desde a última vez que nos vimos. Difícil acreditar, mas nunca havíamos nos beijado na vida real.
Lenora sempre foi meu grande amor não resolvido. Nossa sintonia era total. No frescor de nossa juventude falávamos de literatura, política, gente, sexo e tudo mais. Jamais tivemos um relacionamento que incluísse beijos, abraços, muito menos sexo. Ela tinha seus namorados e eu as minhas. Demonstrávamos ciúme apenas quando um abandonava o outro e se envolvia em outra roda de conversa. Estranho, mas verdade.
Muitas vezes, muitas mesmo, caminhamos de mãos dadas, na chuva. Dizíamos que era para lavar o corpo e a alma. Ela observava o mundo com uma lente própria. Como alguém pode ser sábia aos dezoito anos? Ela era.
Um dia disse conhecer um lugar mágico, mas que as pessoas não notavam. Fomos até os fundos do Museu de Arte Moderna (MAM) que se abre para o mar. Sentamos na mureta e ela disse: “ de frente para o mar e de costas para o mundo”. Sempre que pude voltei lá na esperança de, talvez, encontrá-la. Isso nunca aconteceu.
Fizemos vestibular e ela entrou na Faculdade de Psicologia. Pensava em ajudar pessoas. Eu pensava em fazer pesquisas na área de Biologia. Começava o nosso descaminho.
Encontrei-a determinada vez, por acaso, e disse-lhe da proximidade de meu casamento. Ela disse que não iria. Nem queria saber quando e onde. Fiquei sem saber o que responder. Beijou-me o rosto e sumiu, exceto de minha mente.
Com certeza, Lenora ficou nas esquinas de minhas memórias. Lembrei-me de quando passeávamos pelo centro da cidade e encontrávamos o poeta de rua, Gilson. Ele escrevia com giz. Dizia que a poesia era fugaz. Ela anotou algumas delas e ilustrou com desenhos surreais. Presenteou-me com alguns. Eu idiota que sou, os perdi.
Conhecemos também, o “profeta” Gentileza. Não gostamos dele. Dizíamos que ele era o “Antônio Conselheiro do asfalto”. Na verdade era um homem que dizia ter sofrido uma epifania levando-o abandonar tudo e se dedicar a Deus e obras edificantes, isso aconteceu após o incêndio do circo em Niterói em 1961. Tornou-se um fanático religioso.
Passamos um único carnaval juntos. Ela com uma fantasia improvisada de havaiana e eu apenas de bermuda e chinelos. Nunca mais deixei de reviver aquilo. Foi mágico. Cantamos, pulamos, suamos, seguindo um bloco de rua. Foi maravilhoso. O carnaval passou a ser de nós dois. Para sempre.
Hoje depois de tanto tempo, filhos, neto em breve, achei que havia resolvido esta paixão. Engano total e absoluto. Agora, não só lembro-me de sua imagem e perfume, como também senti o seu gosto.