A primeira comunhão.

A data do embarque para a América se aproximava, e a minha mãe queria muito que eu fizesse a primeira comunhão ainda na Espanha, eu só tinha sete anos, embora soubesse ler e escrever com alguma desenvoltura.

O meu único irmão , pouco mais velho, já a havia feito , e como era costume na pequena ilha, vestido de marinheiro, pois "San Fernando" sempre fora uma base da marinha mercante, e todos seríamos marinheiros em algum momento da vida, assim como o meu pai, meus tios, e nossos avôs.

Não via a hora de pôr a roupa branca de marujo, e fazia as aulas de catecismo com esmero e muita alegria, pois para mim tudo tinha que ter um toque de descontração, pois assim entendia a vida, para diversão dos meus avós, quando me perguntavam o que havia aprendido naquele dia;

_ Pedro cortou a orelha do soldado romano, e depois a colou ! Acho que com uma cola especial para orelhas...! E eles riam...!

Quando narrei Adão e Eva no paraiso, eles quase rolaram no chão de tanto rir, apesar de eu achar tudo muito normal...mas pelo visto , nem tanto ! Pois contava a história como a imaginava, inventando um roteiro , como faço até hoje !

Um dia me acharam apto, apesar da pouca idade, mas bem falante e havia respondido corretamente as perguntas da Bíblia, sem estudar nada, pois era quase impossível me fazer estudar. Fiquei radiante, o domingo seguinte me receberia na penúltima missa, antes da consagração.

Naquela manhã, fui até a igreja do colégio marista de "San Juan", e estavamos todos reunidos para a última confissão antes da comunhão, que aconteceria na manhã seguinte, e na lateral ao salão principal , debaixo de uma das cúpulas, entre colunas,vi o confissionário, e os alunos indo, um a um para lá, de cabeça baixa, com as palmas das mãos juntas em respeito, e depois voltando até frente ao altar mor, ajoelhando-se em penitência. O meu momento chegara, e fui até o padre, que nem via, mas sabia estar lá, e me ajoelhei com o coração aos pulos... Acho que ele já estava cansado de tantos meninos, e repetiu a mesma ladainha rápida , repetitiva, num tom de sacerdote exausto, com discurso massacrante de quem não tem a paciência que a profissão exige, ainda mais para pequenos, como nós. E disparou ...

_ Você pecou ? Você desobedeceu sua mãe ? Seu pai ? Roubou ? Matou ? brigou ? Mentiu ? Difamou ? ...E foi assim, enquanto eu tinha que responder tudo a 300 km por hora," sim" ou "não" ! Mal tinha tempo de pensar...e fui disparando, sim e não, sem já perceber as perguntas...pois não dava nerm tempo, o "cara " era um relâmpago ! Sai arrasado, me achando um esquartejador !

Quando cheguei a casa, falei para a minha mãe ; - Acho que estou frito, nem poderei fazer a primeira comunhão amanhã ...

- Por que ? - O padre me perguntou se eu matei , roubei, e outras coisa mais...e eu respondi tudo errado, acho que ele pensa que sou um assassino !

E ela, com a sua sabedoria de mãe, me perguntou; - Qual foi a penitência Pepito ? _ Dois Padre nosso, e uma Ave Maria !

- Então, meu filho, ele entendeu tudo certo, fique tranquilo !

A foto de marinheiro está na caixa de relíquias, e sempre que a vejo, me lembro bem daquele dia !

Aragón Guerrero
Enviado por Aragón Guerrero em 08/02/2015
Reeditado em 09/02/2015
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