ARROP
Existe um vocábulo mágico no dicionário de baianês que serve para quase tudo. Polivante ao extremo, exprime emoções e sentimentos que a depender da entonação e do volume sonoro, adquire significados diversos em diferentes situações. É substantivo, adjetivo, interjeição, vocativo e tudo mais que o baiano desejar. Ele se presta a uma exclamação de êxtase, a uma explosão de raiva ou de revolta, à expressão de um sentimento de culpa e até mesmo de admiração e carinho. Diz que de dez palavras pronunciadas pelo baiano uma pelo menos é essa. Mas sempre tem exceções. O meu falecido sogro, cidadão austero e de uma correção exemplar, jamais pronunciava essa palavra. Quando premido pela necessidade de narrar algum acontecimento em que o protagonista fazia uso da mesma, ele, com muito pudor, tinha o cuidado de pronunciá-la ou escrevê-la de traz para frente (arrop), como o fiz no título dessa crônica. Refiro-me ao vocábulo porra.
No Aurelio, ele é definido como um brasileirismo chulo que exprime enfado, impaciência e desagrado. Entretanto, no baianês, porra é muito mais que isso, como veremos nos exemplos a seguir:
Satisfação: foi uma festa da porra!
Apresentação: é um prazer da porra...
Quantidade: teve gente pra porra.
Intensidade: hoje tô cuma fome da porra; trabalhei feito a porra.
Admiração: poorra! (pronunciado lentamente).
Sentimento de culpa: porra, olha só o que eu fiz...
Raiva: que porra! (pronunciado forte e, de preferência, de punhos cerrados).
Grande distância: isso fica lá na casa da porra.
Vocativo: sinha porra, pra que você fez isso? Venha cá, seo porra!
Complementos: fui de camiseta, tênis, boné e a porra toda.
Revolta: hoje estou virado numa porra!
Palavrão direcional: vate pra porra!
Coisa bem feita: uma jogada da porra.
Beleza: tá bonito pra porra.
Feiura: feia que nem a porra.
Sacana: fulano é um porra mesmo; o porra do chefe...
Ato de bater: pica a porra nesse cara.
Inexpressivo: é um porrinha mesmo.
Prostituta: filho de uma porra.
Amor: BORA BAEÊA MINHA PORRRAAAA!!! (essa tirei da comunidade do Esporte Clube Bahia no Orkut).
Negativa: não vou nem com a porra.
Existe também o derivativo "porreta" e "porretinha" para qualificar algo muito bom: o chefe é um cara porreta. A reforma ficou porretinha.
Como baiano que se preza, registro agora o meu testemunho. Se dizem que o baiano fala uma "porra" a cada dez palavras eu digo que não é bem assim... Pode até ser muito mais. Ano passado, em Salvador, eu e a companheira caminhávamos pela praia de Piatã, aquela onde a moçada gosta de jogar um baba (pelada para os demais). De repente ouvimos a explosão altissonante de um peladeiro. Ele reclamava agitado, de punhos cerrados, contra outro parceiro de sua equipe por prender demais a bola, querendo fazer toda a jogada sozinho: POOOORRRRA! SOLTA A PORRA DESSA BOLA SEU FILHO DE UMA PORRA!
Arrop, agora digo eu. Preciso dizer mais?
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As oportunas sugestões dos leitores, em seus comentários, têm ensejado o enriquecimento do texto. Registro e agradeço as colaborações de Brene Luiz e Alípio Correa Filho.
Existe um vocábulo mágico no dicionário de baianês que serve para quase tudo. Polivante ao extremo, exprime emoções e sentimentos que a depender da entonação e do volume sonoro, adquire significados diversos em diferentes situações. É substantivo, adjetivo, interjeição, vocativo e tudo mais que o baiano desejar. Ele se presta a uma exclamação de êxtase, a uma explosão de raiva ou de revolta, à expressão de um sentimento de culpa e até mesmo de admiração e carinho. Diz que de dez palavras pronunciadas pelo baiano uma pelo menos é essa. Mas sempre tem exceções. O meu falecido sogro, cidadão austero e de uma correção exemplar, jamais pronunciava essa palavra. Quando premido pela necessidade de narrar algum acontecimento em que o protagonista fazia uso da mesma, ele, com muito pudor, tinha o cuidado de pronunciá-la ou escrevê-la de traz para frente (arrop), como o fiz no título dessa crônica. Refiro-me ao vocábulo porra.
No Aurelio, ele é definido como um brasileirismo chulo que exprime enfado, impaciência e desagrado. Entretanto, no baianês, porra é muito mais que isso, como veremos nos exemplos a seguir:
Satisfação: foi uma festa da porra!
Apresentação: é um prazer da porra...
Quantidade: teve gente pra porra.
Intensidade: hoje tô cuma fome da porra; trabalhei feito a porra.
Admiração: poorra! (pronunciado lentamente).
Sentimento de culpa: porra, olha só o que eu fiz...
Raiva: que porra! (pronunciado forte e, de preferência, de punhos cerrados).
Grande distância: isso fica lá na casa da porra.
Vocativo: sinha porra, pra que você fez isso? Venha cá, seo porra!
Complementos: fui de camiseta, tênis, boné e a porra toda.
Revolta: hoje estou virado numa porra!
Palavrão direcional: vate pra porra!
Coisa bem feita: uma jogada da porra.
Beleza: tá bonito pra porra.
Feiura: feia que nem a porra.
Sacana: fulano é um porra mesmo; o porra do chefe...
Ato de bater: pica a porra nesse cara.
Inexpressivo: é um porrinha mesmo.
Prostituta: filho de uma porra.
Amor: BORA BAEÊA MINHA PORRRAAAA!!! (essa tirei da comunidade do Esporte Clube Bahia no Orkut).
Negativa: não vou nem com a porra.
Existe também o derivativo "porreta" e "porretinha" para qualificar algo muito bom: o chefe é um cara porreta. A reforma ficou porretinha.
Como baiano que se preza, registro agora o meu testemunho. Se dizem que o baiano fala uma "porra" a cada dez palavras eu digo que não é bem assim... Pode até ser muito mais. Ano passado, em Salvador, eu e a companheira caminhávamos pela praia de Piatã, aquela onde a moçada gosta de jogar um baba (pelada para os demais). De repente ouvimos a explosão altissonante de um peladeiro. Ele reclamava agitado, de punhos cerrados, contra outro parceiro de sua equipe por prender demais a bola, querendo fazer toda a jogada sozinho: POOOORRRRA! SOLTA A PORRA DESSA BOLA SEU FILHO DE UMA PORRA!
Arrop, agora digo eu. Preciso dizer mais?
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As oportunas sugestões dos leitores, em seus comentários, têm ensejado o enriquecimento do texto. Registro e agradeço as colaborações de Brene Luiz e Alípio Correa Filho.