CHAVES, O CÍNICO
Por Dilso José dos Santos
Há pouco, na casa de meus pais, peguei-os rindo como nunca. Faceiravam-se para um episódio do seriado Chaves. Humor bonito e que, ao contrário dos de hoje, não apela para fazer rir. Gostando ou não, precisamos admitir, o programa é bom – meus pais que o digam!
Não foi à toa que o personagem-menino foi criado. O ator Roberto Bolaños (mais conhecido pelos personagens: Chaves e Chapolin) não era nenhum tolo, ele pensava antes de fazer funcionar alguns de seus projetos. Inclusive o chamavam de ‘Chasperito’, apelido carinhoso que fazia alusão a Shakespeare, tendo em vista sua grande produção enquanto escritor, dramaturgo, compositor, ator e produtor de televisão. Digo isso para que saibam que o Chaves era um cínico (do grego, Kynikos que quer dizer: igual a um cão). Inspirado no maior de todos os filósofos Cínicos, o Diógenes, Bolaños pôde vislumbrar sua obra ganhando vida na televisão.
Diógenes, assim como o menino do seriado, vivia em um barril. Não usava roupas, apenas uma túnica para tapar um pouco o corpo. Ele vivia uma vida de ‘cinismo’, pois sua doutrina filosófica pedia isso: viver como um cão, porque a felicidade, segundo ele, não estaria em bens materiais. Sua fé era tão grande nisso, que um dia, Alexandre, o Grande, impressionado com tamanha sabedoria perguntou: “Diga o que queres que eu mandarei trazer!” “Não quero nada, além de que tu dês um passo para o lado, pois está tapando o Sol!” – respondeu enfático. A luz lhe bastava.
Confesso que é inspirador saber que um personagem tão querido de nossa infância e da casa de meus pais, também é baseado em elementos sólidos que permeiam e encantam a filosofia. Sabendo disso, pensem duas vezes antes de chamar uma pessoa de cínico, que para nós tem o significado de “aquele que não se preocupa com os outros”. Tanto Chaves, quando Diógenes são eternos por isso. O primeiro por nos fazer rir; o segundo por nos dar uma lição. Sim, na moda está quem se veste por dentro. Não falo isso de graça. Uso quando alguém me questiona sobre as roupas pobres que visto. Uso de cinismo, uma vez que minha roupa é como a de um cão, peluda e cheia de ouvidos. Os filósofos é que sabem ouvir. Não se deixam apanhar pelas armadilhas dos olhos.
Assim, – contente – encerro mais uma reflexão. Verdade esta que me enche de vontade de povoar mais ouvidos cheios de olhos que, por ventura, lerão estas linhas alinhadas pela leitura que fiz há algum tempo de uma obra de Donaldo Schuller, um grande pesquisador de tudo o que é grego, sobretudo da filosofia. E lá vem o Chaves...