SELFIE PERFEITO

“Vivemos em plena cultura da aparência: o contrato de casamento importa mais que o amor, o funeral mais que o morto, as roupas mais do que o corpo e a missa mais do que Deus.” (Eduardo Galeano)

Festas de fim de ano, verão, férias e carnaval... tempo de postagens acirradas nas redes sociais sobre roteiros bacanas de viagens, bebidas exóticas, corpos sarados, rodas de samba e axé. Tempo de observar amigos e seguidores na perfeita alegria, trocando de status e fazendo atualizações a todo o momento. Azar de quem está trabalhando no verão.

Alguém – talvez tão contrariado quanto eu – postou dia desses numa rede social: “desconfio de quem posta fotos de viagem a cada cinco minutos esteja de fato aproveitando o melhor do lugar”. Reflexão para um dia inteiro e depois partilha com os amigos. Por que tem sem tornado tão urgente mostrar o que estamos fazendo aos seguidores? Quantas curtidas e comentários valem um selfie num show internacional ou num velório de uma celebridade e quantos valem numa poesia de Drummond?

Conversas de menos e cliques demais. Menos olho no olho e mais curtidas no perfil. No virtual, debates ferrenhos sobre a política nacional, o preço da gasolina e os reality shows. Solidários na morte na Indonésia e incapazes de cuidar da dor do vizinho. Escravos da tecnologia da auto-promoção enquanto os mais próximos anseiam por uma palavra amiga, um momento único. Toda semana inseridos em grupos de WatsApp – sem nosso consentimento, diga-se de passagem – e cada vez menos inseridos na vida das pessoas. Popularidade na rede e isolamento social na família e com os amigos.

Entretemos as crianças com os iPads, os adolescentes com os aplicativos e até os adultos com os jogos on-line. Não queremos o incômodo dos gritos pela casa, dos pequenos correndo e dos meninos assistindo futebol. Vivemos o controle de tudo, numa ordem aparentemente estabelecida: todos juntos, embora em cômodos separados.

As mensagens podem esperar. Assim como as curtidas e os comentários no último post da amiga. O virtual jamais vai substituir o encontro com o outro e como ele nos faz sentir quando olhamos na mesma direção.