As Caixinhas dos Americanos

Lembro-me como se fosse ontem, das “caixinhas dos americanos”. Era sempre perto das férias do Natal que os americanos distribuíam pelas escolas da ilha, que traziam muito alegria às crianças desse tempo. Nunca sabíamos o dia certo, de repente estávamos a estudar e lá apareciam uns grandes carros azuis carregados com caixinhas que para nós eram verdadeiramente mágicas. Quando umas senhoras vestidas de branco entravam na sala de aula acompanhadas por militares que traziam caixotes cheios dessas caixinhas, era como se fosse uma coisa irreal e nunca mais dávamos tarefa a nada. As caixinhas eram abertas de qualquer maneira, todos queriam que os outros é que abrissem as suas primeiras e até quase sempre íamos logo para casa, para as abrirmos diante dos nossos pais. Lá dentro podia vir um saquinho com berlindes, umas piorrinhas, um caderno de apontamentos, uma borracha, uma caixinha de lápis de cor a cera, entre outras coisas, mas fosse o que fosse que nos saísse tinha um valor incalculável para todos e a alegria era geral. Levávamos dias a falar do que tínhamos tido. No tempo das “caixinhas dos americanos” havia pouca coisa, agora parece que há demais. Seria bom que houvesse maior equilíbrio, pois por aquilo que se vê já nada tem graça. As crianças, hoje em dia, tem de tudo a toda a hora e quando chega um dia especial não há imaginação que chegue para comprar alguma coisa que lhes agrade e ai de alguém que se atreva a dar uma coisa que seja diferente daquilo que se queria, fica-se logo marcado. Como se costuma dizer, – O que é demais é como o que é de menos! – Essas caixinhas que aquelas senhoras vestidas de branco distribuíam pelas crianças das escolas da Ilha Terceira, eram oferecidas pelo programa “People to People” criado na América para crianças com poucos recursos. Tenho a certeza que nenhuma das crianças de hoje ia querer alguma das coisas que vinha nas “caixinha dos americanos” e penso que isto não é bom sinal. Penso, que a iniciativa do programa “People to People” foi importantíssima por vários motivos: - ensinou-nos que, há muitos anos atrás, já havia solidariedade e que também havia alguém que, embora longe, muito longe, estava atento, lembrando-se assim que na Ilha Terceira, havia crianças que talvez não tivessem o mínimo a que todos tem direito e é por isso que, passados tantos anos, ainda há muita gente que se recorda com saudade das “caixinhas dos americanos”.