Sobre a nossa (natural) variação de maturidade

Tenho quase vinte e três, apesar de ainda sentir que tenho vinte. Dezoito, talvez. Não fosse o fato de eu estar na segunda metade da faculdade de engenharia, poderia sugerir que as vezes tenho dez. Faço birra quando algo me incomoda e não costumo ser muito tolerante. Quando estou com medo, me sinto com cinco. Coleciono bichinhos de pelúcia, amo os filmes do Walt Disney e tenho varias peças de roupa do Mickey. Todas as noites durmo vestida de piu-piu, num revival de emoções da imortal pré-escola, época mais feliz da minha vida.

Quando estou carente e deito no colo da minha mãe, me sinto com dois.

Quando vou ao supermercado sozinha fazer compras para a casa, me sinto com trinta. Decidir entre o sabão que limpa melhor e o que tem o perfume melhor é realmente uma tarefa árdua.

Quando ganhava um elogio do chefe, me sentia com quarenta e poucos, vinte de experiência, bem sucedida e realizada profissionalmente. Até o momento em que eu me sentia perdida. Parecia que tinha dezoito recém feitos, há poucos dias no mundo corporativo como uma estagiaria bobinha, inexperiente e ávida por mostrar um talento ainda bruto.

Quando converso com minha mãe, me sinto com cinquenta. Conversamos como duas mulheres adultas, muito além de uma esperada relação maternal e confortável.

Quando o barulho está alto, me sinto com sessenta - ranzinza e infeliz. Quando saio da esteira, ofegante, sedentária e com dores no tornozelo, me sinto com setenta e poucos.

Quando deixo de amar, me sinto no leito de morte.

É uma instigante luta diária conviver com essa variação de idades, esses conflitos internos, essa inconstância de maturidade. Tenho amigos de dezessete e de quarenta. Muitas vezes aconselho os de quarenta e sou aconselhada pelos de dezessete. E são nesses momentos que percebo que eu sou várias, que todos somos vários. Somos a menina que sonha em ser grande, rebocando a cara com o batom ingenuamente roubado da mãe. Somos a cumplicidade entre dois amigos que se entreolham e riem com a mão na boca durante o discurso chato de fim de ano do dono da empresa. Somos o cara de meia idade bem sucedido que chega em casa, deixa o paletó em cima da cadeira e coloca seu pijama do Batman, pronto pra dormir e descansar as suas inseguranças juvenis.

Jenifer Severo
Enviado por Jenifer Severo em 19/01/2015
Código do texto: T5106580
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