Então... Chargearemos!

     - Não entendeu ainda?

     - Então, eu desenho!

     Pare, olhe, escute e pense bem antes de pedir para alguém desenhar o que não ficou claro! - Chargear pode custar vidas!?!
 
     Seria apenas usual e irônica a mania de mandar “desenhar”, nas prosas entre amigos aqui no Sul do Brasil, quando alguém demora para entender algo, não fosse o dramático atentado terrorista ao Charlie Hebdo, em Paris, na França, vitimando consagrados chargistas, bombardeando em cheio o coração da imprensa mundial, que chora não só os talentos incinerados ou enterrados de seus pares, mas a mordaça, tão estupidamente colocada na boca de todos nós, autores.

     Escrevendo, pintando, cantando ou desenhando, bem-humoradamente, vamos contrapondo uma dura realidade, muitas vezes com doses, também excessivas, que sem querer... Querendo muito, limpamos devagar e com álcool a ferida do radicalismo, alimentando a fome dos resistentes às novas acepções de democratização das relações pessoais e sociais ou, conscientizamos de vez, prazerosamente, libertando a humanidade das grades do senso comum, “pegando leve”, apostando no “...água mole em mente dura, tanto refresca até que cura”, desculpem-me os convencionais, atualizei o dito popular, melhor não bater nem furar nada a essas alturas dos ânimos.

     Se havia algum “talvez” sobre o poderio emanado da charge; forma carregada de humor para girar os ferrolhos da realidade, agora fica escancarada “covardemente” essa força imensurável da criticidade e do poder de transformação social do desenho satirizado, tanto para o bem... mal-entendido, quanto para o mal... bem-entendido, dependendo muito das crenças, convicções e hábitos do receptor e/ou do grau de aspereza ou leveza da linguagem do emissor no processo de degradação ou civilização da humanidade.

     Charge é mais ou menos assim... quase nenhuma escrita, alguns rabiscos, muitas vezes riscos desajeitados em preto-e-branco, sem o amparo da luz e da sombra; artifícios dos artistas para avivar a obra, deixando-se ficar, intencionalmente, no campo da aparente inocência, para impactar o leitor “ligado” nas cirandas diárias do mundo.

     O que me incomoda os ossos e a alma é saber a dose certa de humor para rechear nossa necessidade imperiosa de “jogar” para fora tudo que nos alegra demais ou nos entristece demais... “nos tira o sono reparador” demais... o qual bem merecemos... sabendo da nossa responsabilidade sobre influenciar ou não uma pessoa ou uma multidão! No caso, de um lado os terroristas e mais o que vier... Do outro, de imediato, os mais de cinco milhões de leitores da estupenda nova tiragem da Revista Charlie Herdo, com charges, conteúdos promovendo a tolerância, a inclusão, a fraternidade? Ou será outro estopim para detonar mais uma crise na busca da liberdade de expressão e opção seja do que for... Também merecidas? Desencadearia uma guerra fria, morna ou chegou agora, com a tortura física e psicológica do povo, no ápice da fervura?!    

     E como fica a liberdade de manifestação pacífica para melhorar as relações e as condições humanas, sem ser surpreendido pelo terror a qualquer preço?    

     Vamos amargar até ver no que vai dar os próximos capítulos da vida ou da morte real de inocentes... por intransigências... ofensas... humilhações...?! Ou buscaremos no diálogo com toda a sociedade civil, o remédio amargo, principalmente para os intolerantes, de fazer o exercício da empatia, da alteridade, colocando-nos no lugar dos diferentes, respeitando a diversidade que embeleza toda a forma de vida existente no ecossistema universal?

     É possível redesenhar dias melhores com o traçado do amor sem fronteiras, a começar por uma educação libertadora de preconceitos para todas as crianças, todos os jovens e em todos os Continentes.