529.000+374= 0

O que faz com que 529.374 alunos de um país recebam nota zero em uma redação nacional? O que está acontecendo com a educação nesse país? Quem são os responsáveis por esse fiasco? O que fazer para sair dessa situação deplorável? Como? Quem deve se envolver na educação de um povo?

Segundo informações extraídas da Agência Brasil, no ano de 2014, no Brasil, entre os estudantes que receberam nota zero na redação do Exame Nacional do Ensino Médio, “7.824 escreveram menos de sete linhas; 4.444 não atenderam ao tipo textual solicitado; 3.362 tiraram zero por parte desconectada; 955 feriram os direitos humanos”. Até o último aspecto ocorreu.

Esses dados mostram que esses estudantes não têm a capacidade de argumentação; de dissertar; não sabem elaborar um texto; não conseguem se expressar coerentemente; não têm conteúdo; são vazios, superficiais; não sabem pensar. Eles não leem. Quem não lê não argumenta, não escreve. Só escreve quem lê. Eles não sabem escrever de acordo com a norma-padrão. Nem sabem o que é isso.

O Facebook é um péssimo mestre. Esse site é um ambiente em que os jovens mostram que não sabem escrever. A escrita é banalizada. No lugar de “é”, os jovens escrevem “eh”. Por quê? Qual é a finalidade? Transgredir? Inovar? Renovar? Qual é a economia de letra nesse caso? Qual é a vantagem? Qual é a importância do acréscimo do “h”? Numa redação, o aluno que escreve assim se esquece de que não está no Facebook. Qual é a importância de “nóis”? Qual é a economia de letra nessa escrita? É muito mais simples e fácil escrever “nós”. Por que não escrevem? Veja que a palavra (pronome) “nós” ocupa menos espaço do que “nóis”. E é o correto. Mas o correto não é desejado. O correto é chato; é obsoleto.

Muitos jovens e adultos só conhecem o Facebook, o Twitter, o Whatsapp e o Instagram. Nada mais! Ainda dizem por aí que usam a internet. Lamentável! Há professores que confessam ficarem as vinte e quatro horas do dia com o celular ligado à internet. Eles têm até orgulho de fazerem essa confissão. Pensam que isso seja indício de evolução. Com esse hábito avançado, esses professores não conseguirão se preparar para ajudarem a preparar seres humanos, profissionais e cidadãos para a vida nesta sociedade. Seus alunos vão seguir o exemplo de seus professores, de seus “mestres”. Se um jovem fica vinte e quatro horas por dia com o celular ligado à internet, quando é que ele vai estudar? O dia só tem vinte e quatro horas. O dia se tornou muito curto para os jovens de hoje e para os professores desses jovens.

No Facebook, quase todos os jovens e adultos estão mostrando que não conseguem escrever nem uma linha sem que haja um erro. Estão mostrando que não sabem organizar o pensamento, a ordem do que desejam dizer; não conseguem escrever com sentido. A maioria dos professores não sabe nem usar um vocativo, assunto da 7ª série. Se os melhores professores não sabem, seus alunos não saberão. Não é só no Facebook; isso acontece em todos os sites nos quais as pessoas deixam sua bela escrita, seus belos comentários. Há poucos dias, eu vi, no Facebook, alguém se chamando de otário. Diante dos elogios de homens às belas fotos de uma bela mulher, o esposo disse: “Mas ela tem dono otário”. Se os jovens soubessem usar o vocativo, isso não aconteceria. Você concorda, José? O WORD discorda de mim: ele recusou a vírgula depois da palavra “concorda” e antes de “José”. O WORD, também, não sabe o que é vocativo. Não confie nele! Ou confie! A escolha é sua.

3.362 mostraram que não sabem organizar o pensamento, as ideias, o raciocínio. Na verdade, nem ideias eles têm. 955 não sabem o que são direitos humanos; vão contra esses direitos. Não sabem, coitados, respeitar a vida, a educação, o trabalho, a saúde, a moradia, a liberdade etc. Esses são direitos humanos. 955 indivíduos, porém, mostraram que não sabem o que é isso; tudo isso foi desrespeitado.

A prova de redação do Exame Nacional do Ensino Médio apresentou textos norteadores (“motivadores”) aos alunos. O assunto era desconhecido dos estudantes até então. Os textos, porém, serviam para torná-lo conhecido, para ajudarem o indivíduo na reflexão. Todavia, mais de 500 mil estudantes receberam nota zero na prova escrita.

Esses estudantes não sabem o que é concordância verbal, nem concordância nominal, nem regência. Em certa cidade do Brasil, os estudantes escutam isto: “Já chegou muitas novidades”. Uma sociedade DESSAS não educa seu povo. Na hora de uma redação, o estudante vai escrever de acordo com o que ele ouve, escuta ou vive.

O primeiro artigo da LDB afirma: “A educação abrange os processos formativos que se desenvolvem na vida familiar, na convivência humana, no trabalho, nas instituições de ensino e pesquisa, nos movimentos sociais e organizações da sociedade civil e nas manifestações culturais”. Sendo assim, a responsabilidade pela educação não é só da escola; não é só dos professores. A educação acontece (ou deve acontecer) em todos esses ambientes sociais mencionados. Sendo assim, eu não falei nenhuma bobagem ao mencionar um exemplo de uma cidade do Brasil. Essa sociedade não educa. Ela prejudica. Segundo o Behaviorismo, o homem é influenciado pelo meio em que vive.

O mundo no qual vivemos é favorável e, ao mesmo tempo, desfavorável a uma boa educação. Por quê? Favorável: vivemos numa época em que as informações nos chegam por todos os lados. Temos livros, rádio, televisão, jornais, revistas, internet, celular etc. Tudo isso acrescenta; tudo isso colabora. No entanto, temos o ponto desfavorável: vivemos numa sociedade que prega a lei do menor esforço. Os alunos copiam e colam seus trabalhos da internet; professor que faz pós-graduação paga alguém para fazer seu trabalho de conclusão de curso; professor vai à aula de pós-graduação somente para marcar sua presença; depois, ele volta para casa. Eu vi isso num curso de pós-graduação que eu estava fazendo. No entanto, devido à falta de critérios; devido à falta de qualidade; devido à falta de ordem, de respeito, eu não aguentei e desisti do curso. Eu não quis perder o meu tempo com aquela palhaçada. Eu não tive e não tenho paciência para isso. Eu não tive saco para isso. Ou para aquilo? Eu não aguentei.

O professor indica um trabalho de pesquisa aos alunos. Aqueles que não têm internet em casa vão a uma lan house; dizem ao funcionário da lan house qual é o assunto da pesquisa; o funcionário busca no Google; encontra na Wikipédia o que procura; copia, cola, imprime e entrega aos alunos. Estes pagam a “pesquisa” e levam essa cópia ao professor. O aluno nem lê o que é comprado na lan house; não diz nada sobre o assunto; não escreve nada; não seleciona o conteúdo; não tira o que não faz parte da proposta de pesquisa; o aluno nem sabe o que é proposta de pesquisa; nem justifica o texto no tão necessário WORD. O aluno não faz trabalho, não pesquisa, não sabe o que é pesquisar; compra um texto extraído da internet. Assim se obtém uma nota. Os alunos são aprovados. É assim que acontece.

Quando eu comecei a trabalhar como professor, eu recebi um trabalho desses de um aluno. Inexperiente, rasguei esse trabalho na frente de toda a turma. Peguei pesado! Pensei que fosse um desrespeito ao professor. Depois, eu percebi que isso era o hábito, era e é a prática de todos os alunos da cidade onde eu moro, com exceções – será que existem exceções? Eu tive que me adaptar; eu tive de aceitar essa realidade deplorável. De acordo com a minha formação, com os meus conhecimentos, aquilo era um absurdo. Depois, eu passei a aceitar o que eu considerava um absurdo. Eu até me arrependi, porque aquele aluno estava apenas fazendo o que todos faziam e fazem. Ele era apenas um representante de muitos estudantes da sociedade na qual vivemos. Eu não sabia disso. Eu estava chegando de uma experiência de trabalhos: pesquisas, estudo, e não de cópia. Ainda me lembro de um texto muito importante no curso de Filosofia: “Pesquisar não é copiar”. Eu tenho esse texto em casa, assim como tenho em casa todo o material de estudo desde a 5ª série. Voltando ao assunto: Eu fiquei muito mais arrependido porque o estudante era e é um bom sujeito, um bom rapaz. Ele até se tornou meu amigo. É um dos melhores seres humanos que eu conheço.

Há poucos meses, eu disse à diretora da escola na qual trabalho, que é uma ótima pessoa e ótima profissional, isto: eu tenho que ser mais compreensivo com os alunos; eu não posso exigir muito deles; eles não podem oferecer muita coisa. Eu disse isso após escutar uma mãe de um aluno problemático. Após escutar essa mãe nos primeiros dez segundos de fala, eu já reconheci uma realidade dos nossos jovens: famílias desestruturadas. Eu reconheci a necessidade de não ser exigente; reconheci a necessidade de ser um “psicólogo” para alguns, ou muitos alunos. Os professores precisam se preparar também para isso.

Hoje, a educação é um caos. Está na hora de começarmos a agir. Como? Quem deve participar, agir? O artigo primeiro da LDB nos diz onde acontece (ou deve acontecer) a educação. Todos devem estar envolvidos no ato de educar e de ser educado. Além disso, é importante criarmos uma cultura de pessoas apaixonadas pelo conhecimento, pela leitura, pela pesquisa, pelo debate saudável, com coerência, com lógica. É importante amar o conhecimento. Educar-se não pode ser algo visto apenas como uma obrigação; deve ser um prazer. Estudar, ler, pesquisar, dialogar, escrever, debater são atos que merecem ser realizados com alegria, satisfação, e não apenas por obrigação, por dever.

Oxalá esta sociedade na qual vivemos consiga amar o conhecimento! Se não houver amor e empenho de todos os brasileiros, não haverá uma educação de verdade neste país.

Domingos Ivan Barbosa
Enviado por Domingos Ivan Barbosa em 14/01/2015
Reeditado em 14/01/2015
Código do texto: T5101308
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