EU SOU A VÍRGULA.

EU SOU A VÍRGULA.

Crônica

Por Honorato Ribeiro.

Muita gente quer me usar de forma errada, mas eu sou muito exigente. Sabe por que sou exigente? É porque eu tenho uma porção de amigos inseparáveis, sem mim não podem viver, nem mesmo eu posso viver sem eles. Sabem que os são? Vou lhes dizer quem são eles: o vocativo, o aposto, toda oração intercalada, ou explicativa, todas as conjunções adversativas, os advérbios, as orações subordinas, orações coordenadas assindéticas, separar orações reduzidas de gerúndio ou de particípio, indicar zeugma, separar também orações ligadas pela aditiva “e”, com sujeitos distintos, ou antes de conjunção ocorrer pausa. Estão vendo como sou complicada! É e serei muito exigente, pois mudo o sentido de qualquer texto ou frase se não me colocar no lugar certo eu viro uma fera e tomo seu diploma, seu “canudo de papel” e ainda o chamo de analfabeto com canudo na mão, por não ter competência de ser um escritor ou um jornalista. A minha família é grande e somos uma família unida com muito amor. Portanto, deva, ao escrever uma frase qualquer, não se esqueça de me colocar no meu devido lugar. Agora, prestem atenção no que vou lhes dizer. Eu tenho vários inimigos. Não me dou com eles de jeito nenhum. Sabem quem os são? Vou lhes dizer: não posso ficar entre o sujeito da oração e o verbo, não posso separar complementos verbais, nominais, nem orações na voz passiva. Bem, eu já disse quem sou eu e meus amigos. Agora é só escrever procurando onde eu devo ser colocada, mas se não souber onde me colocar e também juntos os meus amigos, podem gerar um enorme quebra cabeça e a confusão ou caos para o leitor saber analisar com precisão. Meu lugar é um trono: “sem reinado e sem coroa”, mas sou muito importante.

Outro dia eu ia passado numa avenida e li um anúncio bem assim: “Meus senhores hoje haverá um grande evento um grande cantor vai dar um show gratuito não percam hoje às 20h”.

Fiquei revoltada ao perceber que eu não estava ali naquele anuncio. Procurei quem havia feito aquele letreiro. Não apareceu ninguém para me dizer quem teria escrito aquele letreiro e não me respeitou o meu direito de está ali, naquele anúncio. Chorei, lamentei, fiquei melancólica e me deu uma dor de cabeça enorme, que não tive apetite para jantar. Não tive apetite mesmo. A fome desapareceu. Deitei-me para descansar e ter um sono saudável, quem disse que dormir! O sono me fugiu e eu disse a mim mesma: Onde estão as escolas e os professores que, no lugar da merenda escolar, deram aos alunos, sabem o que? Eu, a pobre vírgula. Mandaram os alunos me comer crua como se eu fosse cenoura apodrecida. É assim que me tratam? Poderiam saber que sem mim não são ninguém! Eu sou uma cidadã que vim lá da Grécia enviada por Sócrates e seus cretinos. Por isso é que tenho saudade do “Águia de Haia”, daquela cabeçorra baiana do bom baiano que fora; e do jovem “do Navio Negreiro”. Eles sim, que me puseram, no meu devido lugar de honra, como uma eterna rainha que sou. Que saudade que tenho do ilustre religioso respeitado, o “Vieira”! Ele soubera dizer nos seus sermões o quanto sou importante, para que ele enviasse aos ouvintes e fiéis o sermão dos peixes. Mas não posso deixar nunca de lembrar-me do autodidata da: Memórias Póstumas de Brás Cubas! O fundador da Academia de Letras. Ele sim, que foi e o é eternamente meu amigo inesquecível! Vou deixar de lado e dizer para quem não quer me reconhecer quanto sou importante para a nossa literatura brasileira.

Um grande abraço da amiga que lhes ama muito: A VÍRGULA.

hagaribeiro.

Zé de Patrício
Enviado por Zé de Patrício em 12/01/2015
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