OS CANTEIROS DE CIMENTO
Eles me chocam.
Deus! Onde as petúnias e bocas de leão floriram hoje o vazio me fere.
As cabras moram em minha lembrança.
Posso vê-las, claro! E ouvir o balir.
Os ranchos estão vazios. Meus castelos de sabugos desmoronaram.
Meus sonhos todos...
O cheiro da terra, do capim recém-cortado.
Aquelas flores noturnas.
A menina vivendo intensamente tudo.
Os bambuais, a água cantando nos riachos.
As amoreiras a se balançar, as jabuticabeiras...
A mana de avental sempre impecável e o meu todo sujo de terra. Terra, terra...
O meu cabelo desfeito, as fitas escorregando, os cachos pelas costas.
Os primos...
As festas de aniversário. Guaraná caçulinha e cocadas. As minhas preferidas eram cocadas em fita.
Meu pai, e as explicações sobre a natureza; sobre plantio, colheita.
Mamãe, tão meiga! Sempre a cantarolar e a trabalhar.
A terra está lá como sempre esteve.
Tudo mudou, mas as lembranças ficaram em cada canto.
As tempestades de hoje me recordam um tempo que eu corria a me esconder debaixo da mesa.
Os trovões, os raios...
As manhãs eram especiais. No tempo em que as jabuticabeiras floriam e os cafezais...
Meus olhos se recusam a olhar o cimento cobrindo o jardim das minhas lembranças.
Melhor não olhar, melhor ignorar.
A terra é a mesma, o tempo é outro.
A menina ficou morando nela. A menina guarda dentro de si um reino encantado. Um mundo de pureza inteiramente intacto. Tudo está guardado.