O vendeiro

Expedito era a antítese do próprio nome. Calmo. Lento. Devagar nas iniciativas. Durante muito tempo foi o nosso vendeiro. Tinha lá sua birosca, que nos atendia precariamente. Tudo muito simples, limpinho e preparado para receber os fregueses, a quem o bom negro atendia com um sorriso amigo. Dormia em cômodo contíguo ao estabelecimento e de manhã se demorava tratando desajeitadamente dos passarinhos alojados em gaiolas, atropelando-se em uma atividade tão simples. Depois ia ao atendimento à clientela. Asseio não faltava. Com o pegador, ele escolhia sempre o melhor pãozinho para o freguês, mas, na hora do embrulho, costumava se descuidar e tocar o pão com as mãos. Uma lástima! Havia produtos que eram de vitrina, e ele confidenciava que não tinha interesse em vendê-los. Eram apenas para fazer vista. Sabíamos que era casado, que tinha filhos, mas a família não morava com ele. Certa manhã correu a notícia de que Expedito morrera. Fora encontrado morto no seu quartinho. Vieram dois jovens médicos atestar a morte. Auscultaram, auscultaram, entreolharam-se e, com uma calma que mais parecia homenagem, depois de longa análise, com o homem já frio, declararam o que todo mundo já sabia. Creio que Expedito foi para o céu.