A JARDINEIRA
Era a década de 1940. O mundo estava em plena segunda guerra mundial e havia racionamento de alguns alimentos e de gasolina, cuja prioridade era o esforço de guerra. Não vivi esse período, pois não era nascida, mas conto o que me foi relatado por familiares.
Naquele tempo o país tinha poucos automóveis e as pessoas eram estimuladas a deixá-los na garagem e a usar o transporte público. Em São Paulo, eram os bondes e trens. A família de meu marido, que vivia em São Paulo, mas tinha fazenda de café em Bragança Paulista, tomava o trem na Estação da Luz e ia até Campo Limpo, onde fazia baldeação para outro trem e descia na estação de Bragança.
Como sua Fazenda do Agudo ficava no interior do município, o transporte disponível era a jardineira, um veículo de motor a gasolina, aberto nas laterais e com bancos compridos onde se acomodavam as pessoas para essa viagem relativamente curta.
A jardineira saía da frente da Igreja do Rosário, no centro da cidade, e ia sacolejando pela estrada ruim, parando muitas vezes para embarque e desembarque de passageiros. Vez ou outra, alguém pedia ao condutor para parar. Havia encomendado uma manta de toucinho ou uma garrafa de pinga e desejava parar na "venda" ou numa fazenda à beira da estrada para apanhar a encomenda.
Outras vezes, com o mau tempo, o veículo parava para a colocação de correntes nas rodas traseiras e, para aliviar o peso, todos tinham que descer. Era só passageiro molhado e enlameado.
Havia duas jardineiras em Bragança, esta que passava pelo Agudo e cujo ponto final era a Pedra Bela, e outra que se dirigia a São José de Toledo, em Minas.
Além de passageiros, a jardineira levava e trazia encomendas. No transcorrer da viagem, os passageiros apresentavam junto à passagem o salvoconduto, pois vivia-se a ditadura Vargas.
Tia Zica morava na Fazenda do Agudo e, de certa feita, mandou pelo condutor da jardineira o recado para que sua irmã que estava em Bragança, lhe enviasse uma "coadeira", pois não tinha como tirar a nata do leite para o café. O motorista entendeu mal e disse à irmã de Tia Zica que esta desejava uma "cadeira" e, então, providenciaram-se 3 cadeiras que a jardineira entregou no sítio, para desapontamento de Tia Zica e risadas dos demais.
Naquela época, o filho de Tia Zica, o Lineu, estudava medicina na USP, e como a maioria dos jovens, era contestador. Defendia, veladamente, o comunismo. A família o advertia que poderia se meter em encrenca grossa se o fizesse às claras (pois era época de guerra e ditadura no Brasil). Lineu não era fanático, digamos que pertencia à "esquerda festiva". Seus irmãos e primos passaram, então, a chamá-lo de "Camarada Lineu", em tom de galhofa. Apelido que perdurou até quando vim a conhecê-lo, já idoso, na década de 1980.
Era a década de 1940. O mundo estava em plena segunda guerra mundial e havia racionamento de alguns alimentos e de gasolina, cuja prioridade era o esforço de guerra. Não vivi esse período, pois não era nascida, mas conto o que me foi relatado por familiares.
Naquele tempo o país tinha poucos automóveis e as pessoas eram estimuladas a deixá-los na garagem e a usar o transporte público. Em São Paulo, eram os bondes e trens. A família de meu marido, que vivia em São Paulo, mas tinha fazenda de café em Bragança Paulista, tomava o trem na Estação da Luz e ia até Campo Limpo, onde fazia baldeação para outro trem e descia na estação de Bragança.
Como sua Fazenda do Agudo ficava no interior do município, o transporte disponível era a jardineira, um veículo de motor a gasolina, aberto nas laterais e com bancos compridos onde se acomodavam as pessoas para essa viagem relativamente curta.
A jardineira saía da frente da Igreja do Rosário, no centro da cidade, e ia sacolejando pela estrada ruim, parando muitas vezes para embarque e desembarque de passageiros. Vez ou outra, alguém pedia ao condutor para parar. Havia encomendado uma manta de toucinho ou uma garrafa de pinga e desejava parar na "venda" ou numa fazenda à beira da estrada para apanhar a encomenda.
Outras vezes, com o mau tempo, o veículo parava para a colocação de correntes nas rodas traseiras e, para aliviar o peso, todos tinham que descer. Era só passageiro molhado e enlameado.
Havia duas jardineiras em Bragança, esta que passava pelo Agudo e cujo ponto final era a Pedra Bela, e outra que se dirigia a São José de Toledo, em Minas.
Além de passageiros, a jardineira levava e trazia encomendas. No transcorrer da viagem, os passageiros apresentavam junto à passagem o salvoconduto, pois vivia-se a ditadura Vargas.
Tia Zica morava na Fazenda do Agudo e, de certa feita, mandou pelo condutor da jardineira o recado para que sua irmã que estava em Bragança, lhe enviasse uma "coadeira", pois não tinha como tirar a nata do leite para o café. O motorista entendeu mal e disse à irmã de Tia Zica que esta desejava uma "cadeira" e, então, providenciaram-se 3 cadeiras que a jardineira entregou no sítio, para desapontamento de Tia Zica e risadas dos demais.
Naquela época, o filho de Tia Zica, o Lineu, estudava medicina na USP, e como a maioria dos jovens, era contestador. Defendia, veladamente, o comunismo. A família o advertia que poderia se meter em encrenca grossa se o fizesse às claras (pois era época de guerra e ditadura no Brasil). Lineu não era fanático, digamos que pertencia à "esquerda festiva". Seus irmãos e primos passaram, então, a chamá-lo de "Camarada Lineu", em tom de galhofa. Apelido que perdurou até quando vim a conhecê-lo, já idoso, na década de 1980.