No Centro da Cidade

Sábado a tarde no centro da cidade, 15 horas, 33 graus . O semáforo para pedestres demora muito, mas acabou de fechar, as pessoas são impacientes. O transito intenso, muita fumaça, tanto faz carro de passeio, ônibus, caminhão, moto, a fumaça dos escapamentos se misturam em uma grande nuvem de poluição. Nuvem invisível aos olhos, mas que os fazem arder, o nariz sente, a pele coça. O semáforo não abre. O motoqueiro quase caiu, o ciclista ficou no chão, o pedestre avançou o sinal, o carro freia de uma vez, mas para a bicicleta não houve tempo. A multidão se alvoraça, comentários, culpa do motorista, não a culpa é do ciclista. Os bombeiros se aproximam, já se houve as sirenes. O semáforo fica verde, a multidão avança, os bombeiros retiram o acidentado para desengarrafar o transito, ele esta bem, apenas escoriações, só perdeu a bicicleta. Semáforo vermelho novamente, a multidão se aglomera.

33.5 graus marca o termômetro. Na praça o vendedor de sorvetes anuncia seus vários sabores, uma criança pede a mãe um sorvete, ela responde que seja rápido pois o ônibus já esta pra chegar na parada. Uns chamam de parada de ônibus, outros chamam de abrigo. Abrigo mesmo de nada, apenas uma estrutura de metal com um pequeno telhado, onde o sol alcança as pessoas pelas laterais, e quando chove acontece o mesmo, todos se molham. O sorveteiro continua a vender seus sorvetes de qualidade duvidosa, mas o sabor agrada e refresca o calor. Um casal discute, suas palavras altas se perdem entre os barulhos dos carros que passam de um lado e de outro. Pessoas nos bancos, olhares perdidos, olhares atentos, olhares a espreita.

O ônibus chega, parada cheia, não cabe mais ninguém, pessoas ficam do lado de fora, correm para pegar o transporte, muito cheio esta o ônibus não da pra embarcar a todos, reclamações, palavrões. A solução, esperar o próximo. Um mais vazio se aproxima mas o motorista não para, mais palavrões e reclamações. Uma só parada para vários destinos, gente correndo de um canto a outro, ônibus parando, gente descendo, subindo, ônibus com pressa, gente com pressa, gritando, ônibus de vagar. Todos descem, o ônibus quebrou, mais gente na parada com um ônibus atrapalhando os outros que vierem.

O sorveteiro reclama, alguém sai sem pagar, ninguém lhe da atenção, outros riem dizendo que se tivessem a chance fariam o mesmo. O casal encerra a discussão no momento em que um grupo começa uma pregação, caixas de som a todo volume convidando as pessoas a prestarem atenção nas palavras do orador. O pregador tem a solução, sua vida pode mudar, preste atenção. O barulho só aumenta. De uma árvore um pássaro tenta entoar uma canção, um garoto lhe atira uma pedra, a ave se retira, alguém repreende o garoto que sai correndo do dono do carro o qual a pedra caiu em cima. Nem amassou, mas o carro é novinho grita o dono pedindo ajuda para pegar o garoto que muito corre.

O semáforo verde outra vez, a multidão avança, um cadeirante pede ajuda para atravessar a rua, ninguém escuta, ninguém tem tempo. Um mendigo chega para ajudar, o semáforo fica vermelho, o mendigo vai embora e o cadeirante não consegue atravessar.

Sirenes a soar, viaturas interrompem o transito para a passagem de Bombeiros e Ambulâncias em alta velocidade, algum acidente a frente é os comentários, cada qual querendo ter certeza do que seria, quantos teriam morrido e outras coisas. Um motorista reclama que esta perdendo muito tempo, tem um compromisso e já está atrasado. O transito é liberado, mas é a vez dos pedestres, o motorista que reclama quase atropela duas pessoas e se vai resmungando. Boa viagem!

O mendigo volta e resolve ajudar o cadeirante a fazer à travessia, empurra a cadeira correndo se não o sinal fecha antes que consigam chegar ao outro lado. Um agradecimento do cadeirante, o mendigo resmunga, reclama e xinga, queria uma moeda. Não ajuda mais. Da parada de ônibus ouve-se a pregação na praça, o pregador agora tem um pequeno grupo a lhe ouvir. Ouvir o barulho de sua voz misturada com as músicas dos ambulantes, os gritos do sorveteiro e as reclamações dos passageiros a espera do ônibus que nunca vem substituir o que quebrou.

Um barulho, dois carros bateram, um erro do motorista ao fazer o retorno e o encontro dos dois veículos, os motoristas descem, começam uma discussão, um guarda intervem para que retirem os carros da pista para não prejudicar ainda mais o transito. Não houve nada apenas arranhões, mas quem vai pagar? eis a questão.

16 horas, 32 graus, movimento maior, alguns comércios encerraram suas atividades, mais pessoas nas paradas e a quantidade de ônibus é a mesma. Mais carros na rua, mais pessoas com pressa de ir para casa ou de chegar a algum lugar. Multidão maior a espera do sinal verde, alguns sem paciência se arriscam a correrem entre os carros. Quase atropelada foi aquela mulher que correndo segurava uma criança pelas mãos. Os ambulantes aumentam o volume de suas musicas para chamarem a atenção de mais fregueses. O pregador termina sua pregação com alguns cumprimentos e reclamações, consciência tranquila, missão cumprida.

O ônibus é rebocado, mais espaço para as pessoas correrem atras dos outros que vão parando, gente subindo, descendo, xingando, chegando, indo. Alguém pega um táxi, não podia mais esperar, sentiu-se mal comenta alguns. O sorveteiro anuncia os últimos sorvetes. O garoto da pedra volta a praça, o dono do carro já se foi, também os pássaros se foram.

O multidão se aglomera, o sinal não abre, os carros não param, mais e mais gente, pressa e mais pressa. Um freada de repente, um grito, alguém avançou o sinal, não deu tempo do motorista frear, foi muito rápido, o cadeirante estava só.

Fim de tarde.