Sinais de ecdise
Começo a escrever algo que soará meio machista mas logo se transformará em uma crítica feminista demais até, é que vivemos em tempos de extremismos, radicalismos, fobias, ismos, e perdido entre tantas reivindicações e partidos prefiro falar de algo que atinge a todos, independente de qualquer decisão arbitrária dessas. O mundo animal já nos oferece alguns exemplos do que é mudança para Deus, para alguns é mudar de pele, outros é mudar de carapaça, e para nós, o que é mudar?
Confesso que ainda sou adepto aos versos de Cazuza pois eu acredito e quero viver no mundo em que todos possam ser metamorfoses ambulantes, é disso que esse mundo precisa, menos segregação e adjetivos, mais silêncio e atitude. Mas voltando ao foco, não tenho capacidade para definir o que é mudar, mas sei que um dos sinais, pelo menos para os homens, é ficar careca, sim, e tem vários motivos para se pensar nisso. Estar careca pode significar abdicar da vaidade que é ter uma cabeleira e um penteado, ou ainda ficar careca é estar vulnerável como Sansão um dia já foi...
Pensando assim, para os homens existem alguns momentos típicos de mudança, a aprovação no vestibular, sim, até porque só pode significar isso, pois depois de ralar para conseguir o tão sonhado nome no listão para depois ficar mais feio... Só pode ser crescimento, mudança. E a velhice, ah a velhice e todos os seus charmes, os chapéus-coco, as boinas e todos os acessórios para tentar esconder a calvice... Mas por quê? Defendo que fiquemos carecas com orgulho, a idade é coisa para se respeitar e honrar e não para enfeitar ou desviar com cores e modelos. Ainda penso no lado da doença, acredito que a humanidade tenha um grande mal para enfrentar, esse tem nome e se chama câncer.
Tive a experiência de conviver com algumas pessoas que tinham a doença... Dói demais, é coisa que não se explica... A sensação é de total impotência, o mal é tanto que poucos são os virtuosos que podem dizer que venceram a doença, mas esses não saem impunes, homens, mulheres, crianças, todos perdem os cabelos, mudam. Ainda não entendo completamente se ficar careca é sinal de mudança como a família do adoentado toda não fica careca de vez... Ainda não compreendo. Sobram arestas para aparar, “e aqueles que vencem o câncer sem perder os cabelos?”, e eu digo que esses não precisaram mudar, simplesmente podiam sair o mesmo sadio. A crença na mudança que tenho em mim é tão certa que penso em raspar a cabeça quando beijar, rezar, falar “eu te amo”, casar, ter filhos... Enfim, se Heráclito estiver certo uma sociedade que se preze deve ser careca.
Até agora estou no ponto machista, mas e as mulheres, elas não mudam? Prefiro crer que a vaidade é uma virtude que toda mulher preza e somente aquelas que são suficientemente desapegadas perdem os cabelos nas mudanças, mas é que elas mudam tanto... Ser mulher exige uma certa adaptabilidade a situações extremas, uma sujeição a certos ditames, uma altivez muda que nos faz achar que ela não muda. Mudar para uma mulher é como trocar de roupa, e aí não posso esquecer de Clarice falando da mulher: “Todas as manhãs ela acorda, deixa os sonhos na cama e põe a roupa de viver”, é isso, homens carecas e mulheres multicoloridas, como deve ser.
Essa era de calamidades em que se vive não se permite mais ver trevos de 4 folhas, imaginar carneirinhos em nuvens, muito menos cale-se onde se lê cálice... Vivemos presos a certos paradigmas da expressão, é preciso mudar, você que é mulher, por favor, vista-se logo e muito e colorido e sempre, você homem não tenha pena da vulnerabilidade da careca, pense no prazer de sentir a pele de sua cabeça mais perto... Afinal, o que o mundo precisa é de mudança, pois, parafraseando Veríssimo digo que num mundo estático é preciso que troquemos de roupa como sinal de que acreditamos no poder das cores.
Gabriel Amorim 10/01/2015