A escrita autocontemplativa, a meu ver, nunca foi uma escrita ególatra; podemos aprender com os dilemas e pensamentos dos outros. Textos autocontemplativos cansam porque no fundo temos olhos só para nós e não queremos saber muito do outro, então deixo o alertar, não tenho ideia do que escreverei, mas pode ser uma escrita longa, sua chance de parar de ler é agora, mas se parar aqui, aconselho que contemple-se e verbalize da forma que achar que deve. É libertador!

Meus passos não são silenciosos, sempre, mesmo que não queira faço barulho, no entanto minha observação é silenciosa; eu estou a todo tempo racionalizando as pessoas ao meu redor; sempre estou buscando um entendimento do mundo, pode parecer modo de um intelectual estudando o comportamento humano, por vezes deixo que pensem assim, mas na verdade é apenas receio de quem viveu muitos reveses.

Eu não posso precisar quando a certeza de um próximo “golpe” aderiu-se em meu DNA. Tantos foram os golpes que nomear um é trivial. Sempre estou a alardear que não me importo com os resultados de meu trabalho e empenho, que o importante é o fazer: Quem eu quero enganar?

Quero enganar minha natureza exigente e que não aceita a derrota, e minha concepção de derrota não é ser propriamente derrotado; minha natureza (algo difícil para mim de aceitar) entende como derrota a vitória que ninguém vê. Vitória, para essa natureza que reprimi, é o impacto que pode causar a outros o meu labor, talvez eu considere vitória uma derrota assistida por todos.

Essa natureza de artista, cujo palco só é completo se tiver platéia, me torna emocional e instintiva, aciona o límbico de meu cérebro e se eu der vazão para ela torno-me um devorador; e é de onde nascem os meus reveses e as minhas quedas... Para muitos esse espírito voraz e perseguidor da lenda é um defeito, mas eu aprendi que defeitos são qualidades superestimadas, ou, totalmente ignoradas, defeitos são os extremos de uma qualidade; quem muito odeia tem uma disposição incomum para amar e assim por diante...

Eu preferi ignorar minhas qualidades que podem me levar onde eu quiser ir, simplesmente por não conseguir entender o conceito da vitória, por medo da derrota eu me isolei do mundo e me acomodei em um estado gélido, e somente consigo outro estado de espírito trabalhando a poesia, então a minha escrita é um mundo paralelo, pois na realidade eu bani os sonhos, pois nem sempre realizá-los é o que idealizamos como realização, mas até o mais racional dos seres precisa idealizar, pois nossa mente concretiza o que queremos para o futuro.

E então percebo que um dos meus broqueis é o desejo de ter tudo e todos sob meu controle, tudo tem de ser como eu quero, e por saber que isso é impossível simplesmente deixei de querer. Medo é uma palavra chave na minha vida.

Medo é um instinto que nos mantém vivos, muito nos valeu no tempo das cavernas, e hoje deve ser manifestado como a cautela racional que nos protege de nós mesmos, pois somos humanos e tendenciosos a fantasiar.

Devemos sim sonhar e idealizar o impossível, mas não podemos desconsiderar a realidade, disso eu sei e bem usei, eu abdiquei de certas aptidões que poderiam ser desenvolvidas, mas que me tirariam do prumo do que realmente quero e do que realmente sonho, mas o que faço com esse sonho?

É um labor suado, de dias e dias de dedicação cujos resultados para mim nada importam, na verdade importam sim! Vou me exemplificar a mim mesmo em um comportamento mais observável meu: A culpa de não querer viver novos relacionamentos é dos relacionamentos que falharam?

Não, simplesmente eu a mim me basto e o circulo que escolhi me é suficiente, pessoas ferem e são traiçoeiras e eu quero distância delas, porque perdi a gana em conquistar corações. Essa constatação se aplica a tudo em minha vida, mas não é lamentável, pois hoje posso ver melhor que ontem e certamente amanhã verei ainda melhor que hoje, e quanto mais corre o tempo, mais e mais, não só os meus, mas nossos olhos se tornam tão potentes quanto os da águia.

O medo não deve ser banido, precisamos dele para não ser suicidas na vida, mas ele deve ser vencido, deve tornar-se uma arma a nosso favor e não um muro que nos fecha passagem... Lembrei-me de uma visão que tive há quase sete anos, na verdade fará sete anos no dia 27 de abril, pois tive a visão no meu aniversário de 23 anos: Eu via uma rua longa e arborizada, a pavimentação era de pedrinhas redondas, como chovia, o chão estava escorregadiço; o lugar era muito frio e eu não estava agasalhada o suficiente, o que não me impedia de caminhar feliz naquele lugar melancólico, mas em determinado momento do percurso eu não pude prosseguir, pois a minha frente um muro enorme se estendia perdendo-se de vista indo além das nuvens e eu fiquei procurando ao menos uma fenda, mas ele era intransponível; foi quando percebi que existia a frente do muro um livro; um guarda-chuva e um revolver, meu primeiro instinto foi o de pegar o revolver, mas algo me fez recuar, chovia e havia um guarda-chuva e um muro que me bloqueava, e o que eu fiz? Uma escolha lógica, porem imediatista: O livro não parecia que me ajudaria a transpor aquela barreira, o revolver era uma arma impotente, mais coerente ao meu entendimento foi pegar o guarda-chuva e dar meia volta, se o muro estava ali é porque não deveria passar por ele, no entanto quando me virei outro muro me bloqueava a volta; a trama complicou-se... Voltei desta visão sem respostas e nunca procurei respostas para ela, mas hoje existe uma clareza para pensar:

Eu percebi que cada objeto representava uma característica minha, e que tudo ali era referente à minha percepção da vida e como me comportava diante o mundo.

Eu não entro em tempestades de capa e guarda-chuva... Quando chove, eu me molho, essa característica é o medo burilado que me falta, a medida de cautela que não tenho para trilhar meus caminhos e por isso me via desprotegida na chuva e no frio.

O guarda-chuva estava entre minhas características mais latentes, minha violência e minha inteligência (o livro e a arma); eu julguei o livro pela capa e, como ovelha (que não sou), tomei do guarda-chuva, no momento era o mais obvio para minha intelectualidade, mas, oras! Eu já havia abdicado do guarda-chuva para seguir por um caminho que não tem volta (a vida) e pouco me importei se chovia ou não, então por que o guarda-chuva me valeria se eu já estava molhada?

Quanta incoerência; a incoerência do impetuoso que sem medidas e sabedoria se joga no empenho de subir uma montanha, investe todos seus recursos na subida, para logo conquistar o topo e... Ter que pular do topo simplesmente por não ter visto como subiu e se ver sem recursos, logo assim, descer parece impossível.

Então o guarda-chuva é o meu estado passivo de acomodação, a violência é um extinto, portanto, pode ser feito dele uma qualidade se a sabedoria, não a inteligência, contrapuser.

Eu não posso simplesmente já molhada me proteger da chuva e voltar pra trás, mesmo porque, somente relembrando essa visão eu percebi que o guarda-chuva protegia livro e arma.

O que compreendi é que: Não podemos sair abandonando pedaços de nossa natureza; maquiando traços de nossa personalidade, que nada se consegue se você buscar enquadrar-se em uma moldura pequena demais ou grande demais para seu tamanho. Hoje, por muitas razões, eu decidi por encarar o dilema do muro, em marcha lenta ainda, mas cada dia mais obedecendo à lei dos pórticos do templo de Delfos: Conheça-te a ti mesmo.

Eu não posso querer que me tratem como gato se eu sou um leão enjaulado pela dor dos espinhos em minhas patas e os fragmentos de ossos ferindo minha gengiva, pois quando leão sou de todo impeto, de todo sangue...Sou instinto e lógica de caçador; vaidade e vontades de rei; fúria, e por temer esse caldo grosso e vermelho é que me acovardei de mim mesmo.

Mas...

Hoje eu me aproximo desse leão, ele é raivoso e nada romântico; ele me derruba com suas patas e quando o faz sente ainda mais dor, ele ruge enquanto canto e faço poemas para acalmá-lo; ele quer me devorar enquanto danço em sua frente para que se afeiçoe por mim; com muito jeito e ajuda de amigos consegui tirar fragmentos de ossos de seus dentes, alguns espinhos de suas patas; mas ainda há muito a ser feito e mesmo depois de lhe curar as chagas ficarei no encargo de domá-lo. Por vezes percebo-me apaixonada por esse leão e olho por horas em seus olhos tal como narciso a margem do rio que o matou...

Às vezes ele me olha com o desprezo dos olhos flamejantes de um rei e mostra-se poderoso no intuito de humilhar-me, outras vezes faminto e tenebroso...Porem há momentos onde ele me olha cheio de dor e tenta miar, contudo, embora felino, sabe que miar não é de sua natureza, ai percebo que ele não ruge para não me agredir... Sente pena. 

É, tenho me aproximado cada vez mais...Conhecido esse leão cada vez mais... Hoje me mostro ao leão como flor de caule frágil resistindo aos ventos vorazes do tempo, uma flor que quis nascer entre as relvas para que ninguém lhe conheça cor e perfume, os extremos de minha natureza se contemplam.

Sou pequeno instante da sobriedade do leão; sobriedade que adoeceu e tornou-se covardia, por isso apequenou-se e entre relvas dorme como flor campestre. Já dancei demais, cantei e poetei o suficiente, usei-me do vento para que o leão sentisse meu perfume.

Hoje o leão reconhece-me como parte sua e eu me preparo para a coragem de conceber sua natureza existindo em mim, para que eu possa domá-lo e encontrar o equilíbrio, não pelo chicote, e sim me valendo do extremo do amor, pois ele pede amor (com)paixão.
Noah Aaron Thoreserc
Enviado por Noah Aaron Thoreserc em 10/01/2015
Reeditado em 10/01/2015
Código do texto: T5096903
Classificação de conteúdo: seguro